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Ex-guerrilheiro esquerdista e empresário populista vão ao 2° turno na Colômbia; veja as chances de cada um

Pela primeira vez na história da Colômbia, o país não terá uma opção tradicional de direita no segundo turno da eleição presidencial. O esquerdista Gustavo Petro venceu o primeiro turno, mas a festa foi feita pelo segundo colocado, Rodolfo Hernández, que aparece com mais chances de vitória dentro de três semanas, em 19 de junho. Pela primeira vez, o país terá uma vice-presidente negra.

Fotomontagem dos candidatos colombianos Gustavo Petro (à esquerda) e Rodolfo Hernandez falando para a mídia em Bogotá.
Fotomontagem dos candidatos colombianos Gustavo Petro (à esquerda) e Rodolfo Hernandez falando para a mídia em Bogotá. REUTERS - LUISA GONZALEZ
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Márcio Resende, correspondente da RFI em Buenos Aires

Gustavo Petro, ex-guerrilheiro e ex-prefeito de Bogotá, ganhou o primeiro turno da eleição presidencial realizada neste domingo (29) com 40,3% dos votos, mas o resultado inesperado da votação foi a classificação do empresário da construção e ex-prefeito de Bucaramanga Rodolfo Hernández para o segundo turno, com 28,1% dos votos.

"Sem dúvida, é a surpresa desta eleição. Todo mundo via a clássica disputa polarizada entre a esquerda e a direita até o surgimento desse 'outsider' político que, embora tenha sido prefeito, não tem vínculos com partidos políticos e está em linha com os que questionam a política tradicional, é capaz de se comunicar com os jovens através das redes sociais e não tem a resistência que a esquerda representa para muitos", diz à RFI a analista política Paola Montilla, da Universidade Externado da Colômbia.

Petro, aliado do ex-presidente Lula, mas também do chavismo na Venezuela, ficou a 10 pontos de ganhar a eleição no primeiro turno. Para derrotá-lo, Hernández precisa mais do que o dobro: 22 pontos. Mesmo assim, vários analistas políticos concordam que será mais fácil para o candidato antissistema conseguir o que lhe falta.

"Neste segundo turno, a maior preocupação estará do lado da campanha de Gustavo Petro, que tem menos espaço para crescer. O grande ganhador é Rodolfo Hernández, que pode ficar com os votos de Federico Gutiérrez e com boa parte de Sergio Fajardo. O potencial de crescimento de Hernández é muito maior", acredita o cientista político Gabriel Cifuentes.

O candidato da direita, Federico Gutiérrez, obteve 23,9% dos votos no primeiro turno, enquanto o candidato do centro, Sergio Fajardo, ficou com 4,2%.

"Rodolfo Hernández tem uma margem de votos mais elevada do que Gustavo Petro, que tem menos possibilidades de crescer. Hernández capta votos de todos os demais candidatos derrotados. Cresceu muito nas últimas semanas no eleitorado independente", avalia Martín Orozco, gerente da consultora de opinião pública Invamer.

Discursos invertidos

Essa tendência foi refletida na prática desde a noite de domingo, quando a apuração dos votos já indicava um resultado irreversível.

Fiel ao seu estilo antissistema e pitoresco, Hernández falou como um presidente eleito. Ele não foi até a sede do seu comitê de campanha, onde os seus eleitores o aguardavam. Falou da cozinha de casa e, pela primeira vez, leu um discurso.

"Não sou ingênuo quanto às resistências que haverá para um governo decidido a acabar com a 'politicaria' (termo pejorativo que associa 'política' e 'porcaria') e a corrupção. Aos que votaram em mim, quero dizer-lhes que não falharei e que não descansarei nem um minuto no cumprimento do meu compromisso (contra a corrupção)", disse.

O candidato derrotado de direita pediu aos seus eleitores que votem em Hernández no segundo turno. Gutiérrez considera que "a esquerda de Gustavo Petro representa um risco para a democracia".

"Não queremos perder o país. Não vamos colocar em risco o futuro da Colômbia. Por isso, votaremos em Rodolfo no próximo 19 de junho. Gustavo Petro, por tudo o que disse e por tudo o que fez, não é bom para a Colômbia. Seria um perigo para a democracia. Convido todos a cuidarmos do país e a votarmos em Rodolfo, entendendo que, entre as duas alternativas, essa é a forma mais sensata de cuidar da democracia e de cuidar das liberdades", afirmou Gutiérrez.

Ciente da dificuldade para conseguir apoios das demais forças políticas, o ganhador, Petro, fez um discurso que parecia de quem ficou em segundo lugar. Falou aos eleitores que votaram em "outras opções", e disse ser o representante da verdadeira mudança no país. Petro atacou o discurso contra a corrupção de Hernández e a sua estratégia de fazer campanha nas redes sociais.

"Que tipo de mudança queremos? Suicidarmo-nos ou avançarmos? Não há justiça social se há corrupção, mas a corrupção não pode ser combatida com frases de Tik Tok. Seguiremos pelo caminho das frases vazias, enquanto se encobre o caminho de manter as coisas como estão? E adiaremos por mais quatro anos a mudança verdadeira na Colômbia?", questionou Petro.

Na avaliação do cientista político Cifuentes, o esquerdista terá de mudar a sua narrativa porque fez uma campanha contra a direita tradicional e agora está num cenário sem cartografia ideológica clara. "O oponente Hernández tem um discurso que evidentemente gerou paixões em milhões de colombianos: a luta contra a corrupção", afirma. "Petro terá de reconfigurar o seu discurso", aponta o especialista.

Vice-presidente negra

Pelo menos num ponto existe uma certeza na Colômbia: a próxima vice-presidente será mulher e negra. Essa é outra característica inédita das chapas dos dois candidatos que se enfrentarão durante as próximas três semanas, até 19 de junho.

A vice de Gustavo Petro, Francia Márquez, é uma destacada ativista ambiental. A vice de Rodolfo Hernández, Marelen Castillo, é química, bióloga e engenheira de produção.

"A busca de um país mais igualitário é algo que, até alguns anos atrás, não estava na agenda pública da Colômbia, porque estávamos muito concentrados no conflito interno com a guerrilha", destaca Paola Montilla. O acordo de paz com as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia, em 2016, abriu a agenda política do país, observa a analista da Universidade Externado da Colômbia.

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