Condenação de ex-policial que matou George Floyd restabelece noção de justiça nos EUA
O veredicto do júri que declarou o ex-policial americano Derek Chauvin culpado de três acusações na morte de George Floyd foi recebido com satisfação e alívio nos Estados Unidos e no mundo. A condenação é interpretada como um sinal de uma possível mudança no tratamento das discriminações e da violência policial. Políticos americanos, líderes mundiais, artistas, atletas, ativistas do movimento negro, militantes de direitos humanos, a família e a imprensa reagiram à decisão, por unanimidade, dos 12 jurados do caso, anunciada na noite de terça-feira (20).
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Derek Chauvin, ex-policial branco de 45 anos, que pressionou seu joelho no pescoço de George Floyd durante mais de 9 minutos até provocar a morte do pai de família negro, foi declarado culpado das acusações de homicídio doloso, homicídio culposo e assassinato de terceiro grau, após três semanas de julgamento. O ex-agente deixou o tribunal algemado e foi levado para a penitenciária de Minneapolis, no norte dos Estados Unidos.
O juiz Peter Cahill divulgará a sentença em até oito semanas. Caso ele aceite circunstâncias agravantes, a pena de prisão poderá ser superior a 40 anos de detenção.
Segundo o jornal The New York Times, o veredicto, que poderá enviar Chauvin à prisão por várias décadas, representa uma rara repreensão à violência policial nos Estados Unidos, após inúmeros casos em que agentes ficaram sem acusações ou condenações depois de matar homens, mulheres e crianças negras no país.
O diário USA Today diz às famílias afro-americanas que temem pela morte dos filhos diariamente, num banal controle de polícia, que daqui para a frente a condenação de Chauvin atuará como um freio à conduta policial violenta, apesar de ter sido necessária uma "montanha" de evidências para condenar um agente conhecido por sua brutalidade.
Na França, o jornal Libération fala em uma "guinada histórica". Le Monde chama a atenção para a rapidez do veredicto, concluído em menos de 11 horas. "O centro de Minneapolis poderá, enfim, se desfazer das barricadas erguidas há um ano para cobrar justiça pela morte do afro-americano", observa o jornal.
Explosão de alegria e lágrimas
Cerca de 200 pessoas que aguardavam o pronunciamento dos 12 jurados perto da Corte explodiram de alegria ao ouvir o anúncio do veredicto por alto-falantes. Muitos choraram e se abraçaram. Com os punhos no ar, alguns gritaram: "Poder negro! Poder negro!".
A rua em frente ao tribunal estava fechada ao tráfego e, nos arredores, vários veículos buzinaram em apoio à multidão. O Palácio de Justiça foi cercado por blindados e barreiras de proteção, devido à repercussão do caso, que gerou os maiores protestos contra o racismo e a violência policial de uma geração.
A celebração, no entanto, transferiu-se rapidamente para o sul da cidade, onde Floyd foi morto, em maio do ano passado. Naquela esquina, mais de mil pessoas se reuniram para comemorar a decisão do júri, dançando ao ritmo de uma banda que alegrava a cena.
Biden denuncia racismo sistêmico
O presidente americano, Joe Biden, que telefonou à família de Floyd, pediu união à população. "O racismo sistêmico é uma mancha na alma da nossa nação. Ninguém deve estar acima da lei. O veredicto de hoje envia essa mensagem, mas não é suficiente. Não podemos parar por aqui."
Today, a jury in Minnesota found former Minneapolis Police Officer Derek Chauvin guilty of murdering George Floyd.
— President Biden (@POTUS) April 20, 2021
The verdict is a step forward.
And while nothing can ever bring George Floyd back, this can be a giant step forward on the march towards justice in America.
A vice-presidente Kamala Harris também se manifestou. "Este é um dia de justiça nos Estados Unidos. A História irá olhar para este momento", tuitou.
Today’s verdict brings us a step closer to making equal justice under law a reality. But the verdict will not heal pain that has existed for generations. It will not take away the pain felt by the Floyd family. That’s why we must recommit to fight for equal justice.
— Vice President Kamala Harris (@VP) April 21, 2021
Rodney Floyd, irmão de George, falou emocionado à TV americana. "Tenho lágrimas de alegria. Muito emocionado porque nenhuma família na História chegou tão longe. Conseguimos que ele [Derek Chauvin] fosse considerado culpado de todas as acusações. Isso é para todos os que passaram por esta situação", disse.
O advogado da família Floyd, Ben Crump, considerou a decisão um marco histórico no tratamento desse tipo de caso.
"CULPADO! A Justiça conquistada com dor finalmente chegou para a família de George Floyd. Esse veredito é um ponto de inflexão na História e envia uma mensagem clara sobre a necessidade de que as forças de ordem prestem contas", afirmou o advogado no Twitter.
Reações de políticos
"Que uma família tivesse que perder um filho, um irmão e um pai; que uma adolescente tivesse que filmar e divulgar um assassinato; que milhões, em todo o país, tivessem que se organizar e protestar apenas para que Floyd fosse visto e valorizado não é justiça. E esse veredicto não substitui uma mudança de política", reagiu Alexandria Ocasio-Cortez, congressista democrata.
"O veredicto de hoje é um passo importante para a Justiça em Minnesota. O julgamento terminou, mas nosso trabalho apenas começou", declarou Tim Walz, governador do estado.
Na Europa, o primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, foi um dos primeiros a se manifestar. "Estava consternado com a morte de Floyd e recebo com satisfação esse veredicto. Meus pensamentos esta noite estão com a família e os amigos de George Floyd", disse o premiê.
Academia, ativistas, atletas comemoram veredicto
"É possível que Chauvin nunca volte a ver a luz da liberdade. Isso seria justo, mas não suficiente. O SISTEMA que lhe permitiu assassinar George Floyd deve ser mudado. Se não tivesse sido pela câmera do celular de uma testemunha, o assassinato cometido por Chauvin teria ficado impune!", tuitou Laurence Tribe, professor de Direito na Universidade de Harvard.
"A evidência frente aos nossos olhos finalmente coincidiu com a responsabilidade diante dos olhos da Justiça", destacou Stacy Abrams, ativista e democrata.
"Apesar de o veredicto de hoje representar um passo à frente na luta para que a polícia preste contas e ajude a curar uma comunidade de luto, os sistemas que permitiram a um policial assassinar o sr. Floyd permanecem totalmente intactos", declarou a União Americana de Liberdades Civis.
O fundador e CEO do Facebook, Mark Zuckerberg, também reagiu. "Neste momento, penso em George Floyd, sua família e naqueles que o conheceram. Espero que esse veredicto lhes traga um pouco de conforto, tanto a eles quanto a todos os que não podem evitar ver a si próprios nessa história. Nós nos solidarizamos com vocês, sabendo que isso é parte de uma luta maior contra o racismo e a injustiça", escreveu nas redes sociais.
Ligas, times e grandes nomes do esporte nos Estados Unidos festejaram a condenação, mas advertiram que "ainda há muito trabalho a ser feito". A NBA, a competição mais ativa nos protestos contra o assassinato cometido em maio de 2020, emitiu um comunicado poucos minutos depois que o veredicto foi lido em Minneapolis.
"O assassinato de George Floyd foi um ponto de virada na forma como vemos [as questões de] raça e justiça em nosso país, e estamos felizes que a justiça foi feita", disse a liga de basquete em um texto conjunto com sua associação de jogadores. "Mas também reconhecemos que ainda há muito trabalho a ser feito" e "redobraremos nossos esforços para defender mudanças significativas nas áreas de justiça criminal e policial", enfatizou.
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