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Ditadura consolidou imaginário do populismo no Brasil, diz historiadora da UFF

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Quais as origens do populismo dentro do imaginário político-social brasileiro? A quem ele se endereça enquanto conceito dentro da luta política ou ator do debate no Brasil? A historiadora Angela de Castro Gomes, da Universidade Federal Fluminense, elucida e desmitifica algumas questões sobre o tema nessa conversa com a RFI. Ela profere a palestra de fechamento do Congresso de latino-americanistas europeus em Paris sob o título "O populismo no Brasil: desafios de um debate historiográfico".

A historiadora brasileira Angela de Castro Gomes.
A historiadora brasileira Angela de Castro Gomes. © Divulgação
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Para ouvir a entrevista na íntegra, basta clicar no botão PLAY acima

Segundo a historiadora, “o populismo é, sobretudo hoje, este imaginário que acabou sendo construído em torno dessa palavra e desses personagens que são chamados de populistas, amplamente usados através do tempo e do espaço". "São muitos os populismos e muitos os populistas”, define Angela de Castro Gomes.

“Uma coisa que os marca de uma forma geral é exatamente essa questão de serem lideranças autoritárias, que podem ser tanto de direita quanto de esquerda, a despeito de sabermos que direita e esquerda hoje são formas muito limitadas de a gente entender posições políticas”, destaca. “São lideranças capazes de mobilizar no sentido pejorativo a população. Fazendo isso, estão, de alguma maneira, usando a população para os seus interesses e fins, e portanto, manipulando essa população”, afirma a pesquisadora da UFF.

“O populismo se consolida através do tempo, e aqui me refiro especialmente ao Brasil, nesse sentido negativo. Entendo que o populismo é muito mais uma categoria de acusação da luta política, que é usada para desqualificar aqueles que são definidos, em determinado momento, como os inimigos da ocasião”, determina Gomes. “Chamar alguém de populista significa desacreditá-lo, desqualificá-lo como uma liderança que atua em nome de seus benefícios e de seus interesses escusos, onde cabe uma acusação por falta de ética, de corrupção, e, no entanto, para eles, populistas sempre são os ‘outros’, nunca eles mesmos”, ilustra.

Uma historiografia do populismo brasileiro

“A raiz do que a gente pode considerar como populismo no Brasil tem a ver com um certo momento do tempo, que não é o da Primeira República e do Coronelismo”, especifica Gomes. “A raiz dessa nomenclatura e desse vocabulário, que se apresenta como boa, benevolente, paternal, sendo que é na verdade exatamente o contrário, esse vocabulário e essa ideia começam a aparecer nos anos 1950 no Brasil, quando essa acusação começa a circular”, diz.

“Essa determinação vai nomear, por exemplo, nomes como Adhemar de Barros, Jânio Quadros, mas igualmente [Getúlio] Vargas, que seria o primeiro grande populista da história brasileira, e também Jango [João Goulart]. Mas essa expressão vai se consagrar muito mais após 1964. A circulação do termo e a consolidação desse sentido acusatório vem, não por acaso, nos anos da Ditadura militar e civil, como uma forma até de desqualificar toda a experiência da República no pós-1946”, aponta a especialista.

“É interessante observar que essa experiência republicana da história do Brasil, que vai de 1946 até 1964, foi durante muito tempo chamada de ‘República Populista’, ou seja, uma experiência ruim, fracassada, numa tentativa da Ditadura de desabonar esse período republicano”, avalia.

A extrema direita, um novo populismo brasileiro?

“Sou uma crítica do uso da palavra populismo como uma categoria política. Penso que é importante entender essa palavra realmente como uma categoria de acusação da luta política”, avisa a historiadora. “Hoje essa terminologia está sendo usada para qualificar uma extrema direita internacional, desde Trump, mas também na França, na Hungria, e, evidentemente, o presidente Jair Bolsonaro vem na esteira dessa extrema direita”, pontua.

“Isso é uma característica deste momento, mas, por exemplo, no caso da América Latina de meados do século XX, a gente tinha tanto líderes populistas identificados à direita, como Jânio Quadros, mas também a esquerda de João Goulart. No momento atual, temos líderes populistas de extrema direita”, afirma.

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