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Linha Direta

Alemanha vai desligar últimas centrais nucleares em meio a controvérsias

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A Alemanha dá adeus definitivo à era nuclear. As três últimas usinas atômicas em atividade no país vão ser desligadas neste sábado (15), dando fim aos mais de 60 anos de história dessa modalidade de energia no país europeu. Mas o abandono dos reatores continua motivo de discussão entre os alemães. Muitos consideram a medida um erro em meio à crise energética provocada pela guerra na Ucrânia.

Vapor é emitido de câmara de resfriamento de usina nuclear Isar 2, em Essenbach, Alemanha (5/4/23).  A central será desligada neste sábado (15).
Vapor é emitido de câmara de resfriamento de usina nuclear Isar 2, em Essenbach, Alemanha (5/4/23). A central será desligada neste sábado (15). © Armin Weigel / AP
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Marcio Damasceno, correspondente da RFI em Berlim

Muitos alemães se perguntam por que a Alemanha abre mão da energia nuclear exatamente num momento em que o mundo busca alternativas ao combustível fóssil e atravessa uma crise devido à guerra. O plano de fechar as usinas atômicas do governo alemão foi, na verdade, adiado. O cronograma original previa o desligamento dos últimos reatores para o final do ano passado. Mas a invasão russa na Ucrânia levou Berlim a prorrogar esse prazo, deixando que as usinas funcionassem pelo menos durante o inverno, época mais crítica em relação à energia na Europa pelo consumo ligado ao aquecimento. Havia o temor que o corte do fornecimento do gás russo à Alemanha fosse provocar uma emergência energética no país.

Reivindicação ambientalista

O fim da energia nuclear é uma velha reivindicação dos ambientalistas alemães, que veem na energia nuclear um perigo. Isso devido principalmente ao risco de acidentes radiativos como o de Chernobyl, ocorrido na então União Soviética em 1986, e de Fukushima, que aconteceu no Japão em 2011.

Aliás, foi exatamente após o acidente de Fukushima que o governo da então chanceler Angela Merkel determinou o fim das usinas atômicas alemãs. A medida retomou um processo já iniciado em 2002 na gestão de Gerhard Schröder, que liderou um governo de coalizão entre social-democratas e verdes.

Além do perigo de acidente ou mesmo de ataques terroristas apontado por ambientalistas, há também o problema do lixo atômico. Os resíduos radioativos são extremamente tóxicos e têm que ser isolados por dezenas e até centenas de anos. A Alemanha ainda não encontrou um destino para esse material, que atualmente ainda é estocado em depósitos provisórios subterrâneos.

Nesta sexta-feira (14/04), a mídia alemã relata que um grupo de 20 cientistas enviou uma carta aberta ao chanceler Olaf Scholz, exigindo que as usinas nucleares na Alemanha continuem funcionando. Entre os signatários estão os ganhadores do Prêmio Nobel de Física Klaus von Klitzing, do Instituto Max Planck, e Stephen Chu, ex-ministro da Energia dos EUA no governo de Barack Obama.

Críticas da indústria e de políticos

Mas esse blecaute atômico vem sendo alvo de críticas do setor industrial e de até dentro do próprio governo alemão.

Até o último momento, empresariado e oposição conservadora criticam a medida. Eles argumentam que a Alemanha está renunciando a um tipo de energia relativamente livre de emissões de gases de efeito estufa, que pode servir para superar a atual crise energética decorrente aos cortes do fornecimento de combustíveis fósseis da Rússia. A indústria alemã também critica esse fim das usinas atômicas em face dos altos preços da energia atuais, que, segundo os empresários, enfraqueceriam a Alemanha como nação exportadora de produtos industrializados. 

Além disso, alguns especialistas dizem que o abandono dos reatores é ruim para o meio ambiente porque seria compensado pela geração elétrica em usinas de carvão e gás, grandes emissoras de gases de efeito estufa.

Já o Partido Liberal, que está na atual coalizão de governo alemão, com verdes e social-democratas, pede que pelo menos essas três últimas usinas não sejam demolidas imediatamente após a desativação. A ideia é que elas sejam deixadas algum tempo como reserva, para serem reativadas em caso de emergência energética. Mas a lei não prevê esse tipo de medida, e especialistas afirmam que a essa altura, essa proposta não é mais possível de ser implementada.

Maioria dos alemães é contra

O desligamento também não agrada parte da população. Embora a energia nuclear seja impopular no país, a maioria dos alemães esse opõe ao desligamento dos reatores. De acordo com uma pesquisa do instituto Infratest Dimap divulgada nesta sexta-feira, 59% consideram a medida um erro, contra 34% que concordam. O principal motivo são os atuais preços da energia.

Há 12 anos, pouco depois de Fukushima, a tendência era praticamente oposta. Em 2011, 54% eram a favor e 43% eram contra o fim da energia atômica na Alemanha.

Segurança energética

Uma questão é se a Alemanha pode mesmo se dar ao luxo de fechar usinas neste momento sem afetar sua segurança energética. O governo diz que sim, que até 2030 o país terá cerca de 80% de seu consumo gerado por fontes renováveis. Além disso, aponta que a energia atômica é atualmente responsável por apenas cerca de 4% do consumo alemão – em 2004, essa parcela era de 32,1%, mas desde então a produção elétrica por via nuclear vem sendo paulatinamente reduzida.

O governo alemão argumenta ainda que os estoques de gás estão cheios para o próximo inverno e que já estão sendo construídos novos terminais para gás natural liquefeito. Já os críticos apontam que a crise energética ainda não foi totalmente superada e que isso tudo pode não ser suficiente no caso de novos gargalos no fornecimento.

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