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O Mundo Agora

O acordo entre União Europeia e Mercosul vai sair do papel?

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Depois de mais de 20 anos de complicadas negociações o acordo entre a União Europeia e o Mercosul chegou ao papel, isto é, chegou a uma redação acordada entre os encarregados de viabilizá-lo. Entretanto a questão que se coloca agora é a de se ele sairá do papel, isto é, se será implementado depois de sua aprovação pelos poderes legislativos de todos os países envolvidos.

Depois de mais de 20 anos de complicadas negociações o acordo entre a União Europeia e o Mercosul chegou ao papel
Depois de mais de 20 anos de complicadas negociações o acordo entre a União Europeia e o Mercosul chegou ao papel © Fotomontagem com fotos da AP/Olivier Matthys/Eraldo Peres
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Flávio Aguiar, analista político

Há novas expectativas positivas a respeito, mas também há grandes resistências e problemas a resolver. Ao mesmo tempo em que a redação do acordo chegava a termo, ele próprio empacava em ponto morto, sobretudo devido à política do governo anterior do Brasil, totalmente avessa à proteção do meio-ambiente.

A situação melhorou com o compromisso do novo governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de proteger os biomas e o meio ambiente do país de um modo geral, retomando uma liderança internacional que o Brasil já teve no passado.

Isto ficou claro durante a visita, na semana passada, do chanceler alemão Olaf Scholz ao Brasil. A mídia alemã deu grande destaque à diferença de posição entre os dois governos no que se refere ao fornecimento de armamentos ao governo da Ucrânia, em guerra com a Rússia. Esta mídia, cujo apoio ao governo de Kiev é amplo, geral e irrestrito, viu com grande desagrado a negativa do presidente Lula quanto a entregar a munição que fabrica para os tanques Leopard 2 que a Alemanha se comprometeu a enviar para o governo ucraniano.

Mas o fato é que o encontro entre os dois governantes abordou e se pôs de acordo quanto a uma enorme série de iniciativas de cooperação, entre elas a de retomar o caminho para a efetivação do acordo entre a União Europeia e o Mercosul, tema que o chanceler alemão já abordara com o presidente Alberto Fernandez na sua passagem prévia por Buenos Aires. Esta retomada tem o apoio também de Frans Timmermans, vice-presidente da Comissão Europeia para Questões do Meio-Ambiente e de Josep Borrel, vice-presidente para Relações Internacionais e de Segurança.

Mas é do lado europeu que partem as principais resistências quanto à implementação do acordo, sobretudo da parte do setor agrícola francês. Logo depois da visita de Scholz à América do Sul, o ministro francês da Agricultura, Marc Ferneau, declarou que se a França admite a possibilidade do acordo, ela não o ratificaria “no seu estado atual”, numa referência a questões ambientais e também ao que considera a busca de “um acordo comercial justo”.

A questão é controversa, ou como dizia um colega meu de universidade, é “uma faca de muitos gumes”, cortando para vários lados.

Temas controversos

A União Europeia está endurecendo seus critérios quanto ao uso de agrotóxicos para produtos importados. Alguns desses produtos proibidos ou de uso bastante restrito, como os chamados “neonicotinoides”, são utilizados no Brasil, em que o governo anterior desenvolveu uma política de franca liberação no uso de agrotóxicos. Porém não se pode esquecer que muitos desses produtos proibidos na Europa são fabricados… na própria Europa e exportados para dezenas de países pelo mundo afora, inclusive para o Brasil!

O acordo não se refere apenas ao comércio, embora este aspecto seja o mais destacado em suas repercussões. Várias tarifas sobre importação e exportação seriam gradualmente eliminadas, beneficiando no Mercosul a exportação de produtos agrícolas, carne bovina e de frango, açúcar, arroz, milho, óleos vegetais e outros, e na União Europeia a exportação de veículos, maquinário, produtos químicos e farmacêuticos.

Do lado brasileiro há preocupações também por parte de associações ambientalistas e dos povos originários, alegando que a sociedade civil não foi devidamente ouvida quanto aos termos do acordo, cujo conteúdo é largamente desconhecido.

Como se vê, o caminho para a implementação desse acordo será longo e labiríntico. Entretanto há um aspecto paradoxal que deve ser ressaltado. Não vamos cometer a loucura de dizer que há guerras que vem para o bem, mas sem dúvida a já mencionada guerra entre a Rússia e a Ucrânia é um dos fatores que está ajudando a retomada do caminho para a implementação do acordo.

O conflito, cujo fim está longe de aparecer no horizonte, provocou uma carestia de energia e de produtos agrícolas e de insumos necessários para o setor em toda a Europa, forçando os países do continente a buscar novos mercados onde se abastecer.

A Ucrânia vai levar muito tempo para se recuperar da devastação a que está submetida, e as relações da União Europeia com a Rússia estão seriamente abaladas e assim permanecerão por muito tempo. Também por isto os olhos europeus voltaram a se fixar na produção do Mercosul.

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