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Rendez-vous cultural

"Paradigmes", novo álbum do grupo La Femme: uma viagem caótica-psicodélica a décadas passadas

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A banda de rock francesa La Femme volta à cena cultural neste ano, com o recente lançamento de seu terceiro álbum, "Paradigmes". O trabalho, cheio de referências artísticas e baseado em nostálgicas experiências de viagens em um mundo pré-pandemia, deixa clara a evolução dos músicos, mas sem perder a conexão com a dinâmica caótica-psicodélica do grupo. 

Capa do "Paradigmes", terceiro álbum do grupo de rock francês La Femme.
Capa do "Paradigmes", terceiro álbum do grupo de rock francês La Femme. © Divulgação
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Por Daniella Franco, da RFI

Nem a pandemia de Covid-19, nem a chegada dos dois líderes do La Femme – Marlon Magnée e Sasha Got – à teórica maturidade dos 30 anos interferiu na originalidade de uma das principais bandas francesas do momento. Formado em 2010 por esses dois amigos de infância originários de Biarritz, no sudoeste da França, La Femme soube amadurecer nestes pouco mais de dez anos de carreira, mas manteve a "incoerente coerência", uma característica típica do grupo aclamada pela crítica francesa.

"Paradigmes" traz 15 faixas alucinógenas que misturam pop, electro, punk, funk, jazz, synth, com referências musicais dos anos 1930 aos anos 2000. La Femme apresenta essa miscelânea de estilos e influências ousadas – que faz todo o sentido quando criada e interpretada pela dupla, que não hesita em apostar no inimaginável.

“Acho que é mais instintivo do que intelectual. Escutamos tanto grupos famosos quanto desconhecidos, canções mais alternativas e músicas que fizeram muito sucesso, enfim, coisas que nos marcam, que nos tocam. A gente assimila tudo isso e depois transferimos para o nosso trabalho da nossa maneira”, explica o guitarrista e cantor Sasha Got.

Miscelânea de gêneros

O carnaval retrô de La Femme vai do jazz dos anos 1930 ao funk dos anos 1970, transita pelo punk rock dos anos 1980 ao rap dos anos 2000. Tudo isso regado a muito electro e, por que não, um pouco de dance music também. A essa miscelânea de gêneros, o grupo adiciona letras cantadas em francês, inglês e espanhol.

“Nossa base é realmente todo o tipo de música das décadas passadas. Essa é, aliás, a vantagem de estarmos vivendo hoje: poder formar um ponto de vista isento sobre a produção musical do século precedente. Essa é nossa fonte de inspiração e nosso terreno de produção", reitera Sasha Got.

Fontes de inspiração que não vêm somente da música, mas também das artes plásticas. O quadro "Origem do Mundo", de Gustave Courbet, é a capa do primeiro EP do La Femme. A capa do segundo disco, assinada pelo cartunista italiano Tanino Liberatore, é inspirada na obra de René Magritte. O novo álbum traz muitas referências a "Pé na Estrada", de Jack Kerouac, de quem os integrantes do grupo são fãs. Na faixa “Disconnexion”, Sasha Got interpreta o filósofo francês Michel Foucault.

Já o terreno de produção do grupo é ilimitado e sem fronteiras. Para o novo álbum, o universo psicodélico de La Femme se estendeu para além da França, com faixas gravadas na Espanha, outras nos Estados Unidos, algumas em estúdio e outras na própria casa dos músicos. Não por causa da pandemia, mas porque a banda tem especificidades perfeccionistas que fazem com que uma faixa às vezes demore anos para ser finalizada e as longas produções acompanham muitas vezes os músicos durante turnês.

“É um mistério como a gente leva tanto tempo para produzir as faixas. Por isso decidimos dividir esse trabalho entre nós dois, utilizando vários computadores e programas nos quais nós mesmos nos gravamos. É verdade que essa é a magia da nossa geração. Desde os anos 2000, temos a sorte de contar com ferramentas para nós mesmos fazermos as gravações, sendo que antes isso era feito em estúdio. É legal porque podemos gravar e também viajar para fazer shows durante a produção de um álbum", diz o tecladista e cantor Marlon Magnée.

Viagens em um mundo pré-pandemia

A temática das viagens, o vagar pelo mundo e a nostalgia das experiências vividas estão muito presentes no álbum Paradigmes. Sasha e Marlon chegaram a classificar esse novo trabalho, em entrevista ao jornal Libération, como "um disco para os mochileiros". Esse sentimento é bem traduzido na faixa Foreigner, (estrangeiro, em português), com letras em inglês e sarcasticamente cantada com um forte sotaque francês.

Na canção Nouvelle Orléans, a banda também trata dos traslados pelo mundo para o encontro com si mesmo. A faixa é interpretada por Clémence Quélennec, a cantora cuja voz na faixa Sur la Planche tornou o grupo conhecido em toda a França, em 2010, e impulsionou a carreira internacional de La Femme. A vocalista deixou a banda recentemente para investir em um projeto solo, a exemplo de Clara Luciani – um dos novos nomes da chanson française – após o lançamento do primeiro álbum do La Femme, “Psycho Tropical Berlin”, em 2013.

Para Olivier Lamm, repórter da editoria de cultura do jornal Libération, mesmo que não tenha sido proposital, o álbum "Paradigmes" é uma forma de levar o público a transcender enquanto as viagens ainda estão impedidas pela pandemia de Covid-19.

"Eu recebi esse disco no final do segundo lockdown na França e pensei que esse trabalho nos convidava a colocar o pé na estrada de maneira imaginária. Mas, na verdade, não. Sasha e Marlon me explicaram que o álbum foi finalizado antes do primeiro lockdown na França. Ou seja, esse acúmulo de experiências que a banda nos propõe – pelas letras, pelos estilos musicais – foi inspirado em viagens reais deles. E a gente percebe isso ao escutar 'Paradigmes', que é um trabalho inundado pelas experiências do grupo em viagens pelo mundo."

Mas nem só de passeios e nostalgia é feito "Paradigmes". A vibração punk rock anos 1980 do início da carreira do La Femme segue presente em algumas faixas, como Foutre le bordel (algo como "fazer muita bagunça", em português). Na letra da canção, Sasha e Marlon descrevem o clima de uma festa louca em um apartamento – com bêbados cantando alto, pessoas brigando, vizinhos que reclamam do barulho – uma "ambiance" que lembra um pouco os shows ao vivo do La Femme.

A banda, aliás, se prepara para colocar novamente o pé na estrada e já anunciou várias datas de shows para o segundo semestre deste ano na França, na expectativa da reabertura das salas de espetáculo. Até lá, o álbum “Paradigmes” pode ser ouvido em todas as plataformas musicais e no YouTube.

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