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Brasil-Mundo

Exposição de Gleeson Paulino em Londres mostra como a fotografia o libertou de traumas

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Uma poética trajetória de autoconhecimento e reconciliação com o Brasil. É assim que se deve olhar para as 24 imagens da série “Batismo" escolhidas pelo fotógrafo Gleeson Paulino para a exposição em cartaz na Embaixada do Brasil em Londres até o dia 15 de fevereiro. Elas contam a viagem que este profissional autodidata fez por suas raízes, depois de abandonar o país por seis anos. Ele fugia de uma vida quase asfixiante em uma comunidade ultrarreligiosa no interior do Mato Grosso do Sul.

Cada imagem escolhida para a exibição em Londres tem conexão com algo íntimo da história pessoal do fotógrafo.
Cada imagem escolhida para a exibição em Londres tem conexão com algo íntimo da história pessoal do fotógrafo. © Vivian Oswald
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Vivian Oswald, correspondente da RFI em Londres

"A fotografia nunca foi uma coisa consciente. Sempre foi introduzida como uma forma de escapismo, de me desconectar da realidade, de meus medos e traumas, era um lugar que me permitia enxergar e criar um outro universo", conta.

Nascido na pequena cidade de Eldorado, aos 17 anos o brasileiro partiu para Viena, na Áustria, onde faria um curso de violino. Era para ser um período de seis meses apenas. O suficiente para dominar o instrumento que tocaria na igreja e para aprender alemão. Mas a perspectiva de um mundo novo e livre das restrições religiosas encantou Gleeson. De lá, partiu para Londres, onde ficou. Na capital britânica, ele trabalhou como cuidador de um cachorro, empregou-se em pubs, até finalmente trabalhar em um estúdio fotográfico. Foi nesse período que começou a aprender o ofício que seria não apenas ferramenta de uma carreira bem-sucedida – ele ganhou vários prêmios –, mas também uma espécie de redenção.

"A desconexão foi com o que eu fui introduzido ali, porque eu nem conhecia o Brasil de fato. Vivia nesse lugar muito encapsulado, muito rígido. Desde criança, nunca tive liberdade de me expressar. Sempre fui introduzido a céu-inferno, eu tinha muito medo de morrer, tinha muitos traumas. Na adolescência, sentia que precisava sair dali, porque não me encaixava nos padrões. Eu não tinha liberdade nenhuma de expressão e não tinha voz. Na adolescência, aos 17 anos, quando você está se conhecendo – nunca foi declarado –, mas eu sabia que era gay. Então, eu sabia que eu precisava sair daquele ambiente, porque eu estava muito mal”, diz.

As 24 imagens em emposição em Londres revelam uma poética trajetória de autoconhecimento e reconciliação de Gleeson Paulino com o Brasil.
As 24 imagens em emposição em Londres revelam uma poética trajetória de autoconhecimento e reconciliação de Gleeson Paulino com o Brasil. © Vivian Oswald

Gleeson não esconde a emoção ao contar a sua trajetória e lembra o que já havia dito no livro "Batismo", que é o catálogo da exposição: "É preciso se perder para poder se encontrar".

A fotografia foi, na verdade, uma espécie de "terapia de cura" para o brasileiro. A partir dela, via o mundo onde se colocava ao abrigo de perigos. Ele também sofreu bullying e abuso sexual quando era criança.

Retorno às origens

Depois de um longo período em Londres, onde ainda se sentia um imigrante, Gleeson quis voltar às origens. Foi um renascimento, seu segundo batismo. Daí a escolha para o título da coleção. "Foi praticamente uma imersão espiritual”, afirma.

Logo que chegou à Amazônia, ele recebeu a notícia do falecimento do avô, que tinha descendência indígena. "Fiquei nessa dúvida, se eu voltava, ou não, e decidi ficar ali, porque não queria ter essa imagem dele. Para mim, foi um despertar, sabe? E essa foto da modelo entrando na água, que parece que ela está indo para outra dimensão, me causou uma paz e me conectou de alguma forma. Cada imagem tem uma história muito pessoal, muito íntima de conexão”, destaca.

Da Amazônia, ele seguiu em uma longa viagem por outros estados do Brasil. A partir de São Paulo, Gleeson continua viajando pelo mundo. Hoje é fotógrafo de moda e publicidade, com trabalhos para marcas como Natura, Apple, Nike, Missoni, João Pimenta, The Woolmark Company, Schutz, Melissa, Thom Browne, além de capas e editoriais para grandes revistas internacionais. Em 2021, foi eleito pela revista I-D Vice um dos principais fotógrafos brasileiros.

A fotografia foi, na verdade, uma espécie de "terapia de cura" para Gleeson.
A fotografia foi, na verdade, uma espécie de "terapia de cura" para Gleeson. © Vivian Oswald

A produção artística de Gleeson teve suas primeiras exibições públicas em 2019, quando o fotógrafo foi convidado a expor na SP-Foto pela Lamb London Gallery e no Salon des Beaux Arts, em Paris. A série "Batismo", apresentada em sua primeira exposição individual, em 2022 em São Paulo, rendeu a Gleeson prêmios na Itália (Cortona on the Move Award), Eslovênia (Kranj Photo Festival) e Holanda (LensCulture 2022, como escolha dos críticos), além de duas medalhas de ouro no Salon des Beaux Arts de Paris 2022.

“Batismo” vai para Tóquio em setembro deste ano. Mas, deve fazer escala antes em Nova York e Roma.

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