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Para cientistas e ongs, neutralidade de carbono poderia dissimular inação

O jornal Libération desta sexta-feira (5) analisa as promessas de neutralidade carbono feitas na COP26, em Glasgow. Durante os primeiros dias da Conferência do Clima, muitos os países e empresas prometeram alcançar esse objetivo, inclusive o Brasil. Mas para cientistas e ongs, a ideia pode "dissimular a inação" de países e grandes emissores.

No jornal Libération pesquisadores e ongs denunciam a distorção do conceito de neutralidade de carbono por países e empresas na COP26.
No jornal Libération pesquisadores e ongs denunciam a distorção do conceito de neutralidade de carbono por países e empresas na COP26. © Fotomontagem RFI/ Adriana de Freitas
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O conceito é simples de entender através da equação: emissões de gases do efeito estufa causadas pelas atividades humanas, menos gases absorvidos naturalmente pela  vegetação, solo ou oceano, ou de maneira artificial, por tecnologias de captação de CO2. O resultado deve ser zero.

Segundo o acordo de Paris, assinado em 2015, para limitar o aumento da temperatura média do globo em relação ao período pré-industrial bem abaixo dos 2°C ou atingir o almejado 1,5°C, é preciso conseguir um equilíbrio entre as emissões e sua absorção.

Mas nenhuma repartição clara entre redução e captação de gases foi definida pelo documento, o que leva grandes emissores como a Arabia Saudita, Emirados Arabes, Rússia e China a declararem que buscam a neutralidade de carbono.

No final de outubro, o Programa das Nações Unidas para o meio ambiente calculou que, ao todo, 49 países se comprometaram a tornar oficial o objetivo zero de emissões líquidas, o que representa mais da metade das emissões mundiais de gases do efeito estufa atuais.

Plantar árvores

Empresas multinacionais que não são as mais ecologicamente corretas, como os grupos petrolíferos Total Energies, Shell e BP, e também companhias aéreas como Air France e Delta, mostram objetivos ambiciosos nesse sentido.

Mas cada vez mais ONGs e acadêmicos denunciam a distorção do conceito. Para chegar à neutralidade carbono, existe um princípio fundamental: as emissões devem ser evitadas e a compensação residual deve ser usada como um último recurso.

O problema, segundo Libération, é que várias empresas, como os grupos petrolíferos, passam diretamente para a segunda fase do processo, porque ela demanda menos esforços financeiros e humanos das empresas, que continuam a poluir.

O jornal explica que as empresas doam dinheiro a projetos de redução de emissões, principalmente para plantar árvores e conservar florestas. 

"Esse mecanismo permite às multinacionais obter os famosos créditos de carbono, que podem ser gerados sem limite. Eles são comprados e vendidos no mercado da compensação de carbono voluntária. Os créditos recebem um selo de organismos de certificação como Verra, Gold Standard ou Plan Vivo". Esses processos de validação não são completamente aceitos, diz Libération, devido à dificuldade de avaliá-los.

Eles não levam em conta, por exemplo, que uma árvore leva anos para alcançar a maturidade e absorver eficazmente gás carbônico. As tecnologias de absorvição de CO2, além de não existirem em grande escala, gastam muita energia e são caras.

Armadilha perigosa

De acordo com cientistas do IPCC, a ideia de neutralidade de carbono pode ser uma "armadilha perigosa". Uma ideia genial, em teoria, mas que na prática reduz o sentimento de urgência e a necessidade de limitar as emissões imediatamente.

Já ONGs ambientais como Amigos da terra e Greenpeace, chamam a neutralidade carbono de grande fraude e de cortina de fumaça que permite dissimular a inação.

Apesar dos apelos de cientistas, as emissões globais não diminuíram e até aumentaram. De acordo com um estudo do Global Carbon Project publicado nesta quinta-feira (4) e citado pelo jornal, as emissões mundiais de CO2 estão novamente próximas aos níveis recordes de antes da pandemia de Covid-19.

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