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Linha Direta

Líbano: pressão das ruas resulta na demissão de três ministros em 24 horas

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A ministra libanesa da Justiça, Marie-Claude Najm, apresentou seu pedido de demissão nesta segunda-feira (10) e se tornou o terceiro membro do gabinete a tomar essa decisão após a revolta popular com as explosões no porto de Beirute. A população promete continuar nas ruas até a queda de todo o governo. 

Manifestantes prometem continuar os protestos até que governo do Líbano deixe o poder.
Manifestantes prometem continuar os protestos até que governo do Líbano deixe o poder. JOSEPH EID / AFP
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Tariq Saleh, correspondente da RFI em Beirute

"A ministra apresentou sua renúncia", afirmou uma fonte do ministério da Justiça. No domingo (9), a ministra da Informação, Manal Abdel Samad, e o ministro do Meio Ambiente e do Desenvolvimento Administrativo, Damianos Kattar, abandonaram o governo do primeiro-ministro Hassan Diab.

Beirute é palco de protestos antigoverno desde a semana passada. Mais de 700 pessoas ficaram feridas após intensos confrontos entre manifestantes e a polícia. Uma nova manifestação está prevista para ser realizada nesta segunda-feira diante do palácio presidencial Baabda, na capital libanesa. 

A população responsabiliza o governo pelas explosões no porto de Beirute na última terça-feira (4), onde morreram 159 pessoas e 6 mil ficaram feridas. A tragédia agrava ainda mais a profunda crise econômica no país, onde a classe política é acusada de corrupção e se perpetua no poder há décadas. 

Tragédia foi a gota d'água para a população

O Líbano já vivia dias terríveis, com falta de soluções para os enormes problemas que o país atravessa. Libaneses a cada dia se sentem mais frustrados em ver seus governantes falharem ao realizar reformas exigidas pelo Fundo Monetário Internacional como condição para um pacote de ajuda financeira. 

A tragédia no porto de Beirute foi a gota d’água para uma população cansada de corrupção de seus governantes. Nas ruas, a ira dos cidadãos é visível. E agora a pressão recai sobre o primeiro-ministro e seu gabinete para que renunciem. O governo espera agora uma ajuda financeira internacional direcionada para reconstrução e para aliviar a pressão vinda das ruas.

Desde outubro do ano passado, as manifestações até então eram geralmente pacíficas. As pessoas tentavam mostrar suas frustações com a classe política usando métodos como bloquear ruas e avenidas, gritar em frente de casas de políticos e acampar em áreas próximas à sede do governo e parlamento.

Agora, pela primeira vez, manifestantes não fizeram questão de serem pacíficos. No sábado (8), houve uma clara intenção de tomar o parlamento e de usar violência contra as forças de segurança. 

Até então, o exército libanês era geralmente visto como uma instituição de respeito, acima da corrupção de políticos. Mas alguns libaneses agora veem os militares como um "forças do regime", termo utilizado por muitos nas ruas, com a função é defender a classe política dominante. 

O sentimento geral é de que os governantes pouco se importam com o sofrimento da população. A explosão só agravou esse sentimento. Muitos libaneses querem a renúncia não apenas do primeiro-ministro e seu gabinete, mas também do presidente do país, Michel Aoun, e de todos no parlamento. 

A população também acusa os políticos de sentir pouca ou nenhuma empatia pelas vítimas da explosão da semana passada. Libaneses prometem ainda mais violência pois falam que não há mais nada a perder.

Possibilidade de queda do governo

Há manobras de partidos políticos opositores no parlamento para forçar a queda do governo através da renúncia em massa de parlamentares, o que levaria a novas eleições.  

O presidente do país, Michel Aoun, e o grupo Hezbollah, base de sustentação do atual governo, tentam evitar sua dissolução. Três ministros já renunciaram e acredita-se que outros seguirão o mesmo caminho. 

O próprio primeiro-ministro Hassan Diab acena com eleições antecipadas e a permanência do atual governo até o novo pleito. O problema é que os libaneses não aceitam que o atual gabinete permaneça e rejeitam todos os partidos políticos no parlamento, acusando-os de serem parte de um sistema político visto como falido e sectário.

O que se sabe é que a situação do governo é insustentável, tanto de forma política quanto de forma moral.

Conferência para doações internacionais

Uma iniciativa internacional, liderada pelo presidente francês, Emmanuel Macron, obteve no domingo (9) a promessa de uma ajuda humanitária de mais de € 250 milhões ao Líbano. 

O governo vê essa ação humanitária de líderes mundiais como uma oportunidade para ganhar canais diplomáticos e sair de seu isolamento. Algo que os libaneses temem, já que isso poderia minar suas exigências para que os governantes sejam boicotados pela comunidade internacional.

A população também teme que a ajuda seja utilizada pelo governo para ganhar mais tempo e aliviar a tensão política. Alguns falam que o dinheiro pode parar nas mãos de líderes corruptos para distribui-lo entre seus partidários.

Por isso, os libaneses pedem uma ampla fiscalização internacional para a distribuição da ajuda, garantindo assim que ela chegaria aos que realmente precisam, como as famílias desabrigadas pela explosão e as centenas de feridos que se encontram em hospitais.

Onda de solidariedade 

Poucas horas após as explosões, milhares de jovens libaneses organizaram grupos de voluntários para entrar em casas destruídas e limpar vidros estilhaçados e escombros. Eles também criaram uma rede de entrega de alimentos para a população.

Jornalistas internacionais que cobrem a tragédia comentaram que jamais haviam visto tamanha solidariedade. Enquanto o governo era criticado por não fazer nenhum esforço humanitário, jovens de ensino médio e universitários eram visto como mais eficientes que os próprios políticos.

A visita imediata de Emmanuel Macron só causou ainda mais constrangimento ao presidente Michel Aoun e ao primeiro-ministro Hassan Diab. Nos dias após a tragédia, nenhuma alta autoridade do país foi aos bairros afetados. A população ironiza que um presidente estrangeiro teve mais sensibilidade e empatia que qualquer político libanês.

 

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