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O Mundo Agora

Novas tecnologias trazem desafios e riscos para a política

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Bem-vindos ao novo mundo da política-internet. Correios eletrônicos, redes sociais, blogs e hackers estão dominando eleições, parlamentos, o trabalho dos Executivos e, às vezes, até ações judiciárias. A eleição presidencial americana é hoje o maior campo de provas desse poder da conectividade digital. O anúncio da abertura de um inquérito pelo FBI de mais outros – e desconhecidos – “e-mails” de Hillary Clinton é antes de tudo uma bomba midiática.

A diferença entre Donald Trump e Hillary Clinton na corrida pela Casa Branca diminuiu após a reabertura de investigação do FBI sobre o uso de um servidor privado por parte da candidata democrata quando era secretária de Estado.
A diferença entre Donald Trump e Hillary Clinton na corrida pela Casa Branca diminuiu após a reabertura de investigação do FBI sobre o uso de um servidor privado por parte da candidata democrata quando era secretária de Estado. REUTERS/David Becker
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Clinton, por enquanto, não é acusada de nada. Mas o simples fato de anunciar a investigação já foi o bastante para criar uma explosão de comentários e tomada de posições na mídia, e uma enxurrada de sondagens de opinião, interferindo – e muito – na campanha eleitoral. Mas antes disso, os serviços de inteligência russos haviam pirateado as contas internet da campanha de Hillary, provocando uma avalanche de ataques e opiniões contra a candidata democrata.

Modernidade digital perigosa! A vulnerabilidade de Clinton vem da maneira como ela administrou os correios eletrônicos quando era Secretária de Estado. Donald Trump conquistou o partido republicano graças ao manejo intempestivo e permanente de factoides no Twitter e mentiras deslavadas que a imprensa e as redes sociais se achavam na obrigação de cobrir em manchete. Uma propaganda gratuita e permanente para o empresário populista que acabou também sendo vítima das redes quando se espalhou como um vírus uma velha conversa onde ele aparecia como um campeão do assédio sexual às mulheres.

Mas não é só nos Estados Unidos. As grandes mobilizações populares durante o impeachment de Dilma saíram diretamente das redes e não dos partidos políticos. Na Europa, o voto surpresa para tirar a Grã-Bretanha da União Europeia veio da utilização massiva das redes pelos partidários do “sim”. Todos os novos movimentos políticos “antissistema”, o Podemos na Espanha, o Cinco Estrelas na Itália ou os novos partidos da extrema direita xenófoba são filhos diretos das redes sociais.

Até o veto do Parlamento da Valônia ao tratado de livre-comércio Europa-Canada não poderia ter acontecido dessa maneira sem a circulação imediata dos argumentos e da mobilização de militantes graças às tecnologias da comunicação. Hoje, não há político que não tenha medo das redes e da capacidade de diversos grupos de pressão – atuais ou futuros – de manipular e desencadear enormes campanhas midiáticas.

Claro, essas explosões virais não duram muito e são deslocadas por outras, num sem fim de revelações ou ataques que ninguém mais sabe se são verdadeiros ou simples desinformação, mas que deixam os governantes e a opinião pública desnorteados e angustiados.

A mídia tradicional também é responsável por essa tirania da informação “online”. Morrendo de medo de ficar para trás, jornais, rádios, televisões – e até livros – correm atrás do mínimo boato lançado nas redes. E sem tempo para verificar – nem as fontes nem os conteúdos – vão logo publicando, comentando, tirando conclusões e alimentando boatarias que podem destruir instituições, governos e indivíduos que não têm a mínima possibilidade de se explicar ou se opor ao tsunami avassalador do YouTube, Twitter, Facebook e outros.

Redes sociais são instrumento extraordinário

As redes sociais são sem dúvida um instrumento extraordinário para apoderar o simples cidadão e promover maior participação e democracia. Só que hoje, governos, serviços de inteligência, relações públicas de grandes companhias, grupos terroristas, hackers profissionais – em suma, uma cambada de gente não necessariamente “do bem” – utilizam todos os macetes das novas tecnologias para manipular e desinformar os cidadãos.

A eleição americana mostra que nem a maior potência do planeta escapa desse mundo eletrônico sem fé nem lei. Um mundo onde a rede digital pode ser utilizada até para paralisar um país inteiro ou provocar uma guerra, cibernética – ou bem mais concreta. Hoje, ninguém sabe qual será o modelo político apropriado para essa nova era. O desafio é inventar formas modernas de representação e decisão políticas capazes de evitar a ditadura sem limites – e sem sentido – da informação “digital”. Ainda estamos longe disso...

Alfredo Valladão, professor do Instituto de Estudos Políticos de Paris, faz uma crônica de politica internacional às segundas-feiras para a RFI
 

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