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Emmanuel Macron

Queda de popularidade de Macron sinaliza início da desilusão eleitoral

Desde o primeiro mandato de Jacques Chirac, há 22 anos, um presidente recém-eleito não sofria uma queda de aprovação popular tão retumbante como a de Emmanuel Macron. Depois das promessas e da festa eleitoral, os franceses se dão conta da política de austeridade proposta pelo novo chefe de Estado.

Macron e os eleitores: o fim da lua-de-mel?
Macron e os eleitores: o fim da lua-de-mel? REUTERS/Gonzalo Fuentes/File Photo
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Aos 39 anos, o charmoso Emmanuel Macron se tornou o mais jovem presidente da história da França, ganhando o segundo turno da eleição presidencial com 66% dos votos válidos contra 33% de Marine Le Pen. Percebendo a desilusão dos eleitores face à política tradicional, Macron havia se lançado como o candidato alternativo, de centro, descartando, como desatualizados, os conceitos de direita e esquerda na política. Depois do Brexit e da eleição de Donald Trump nos Estados Unidos, a onda ocidental de descontentamento político chegou, como previsto, à França, premiando a aposta do jovem candidato. Agora, no entanto, o fator “novidade” começa a esvanecer frente à dura realidade da política de cortes orçamentários do novo governo.

De 62% de aprovação popular depois de 30 dias no poder, Macron, no cargo desde 14 de maio, chega ao terceiro mês de mandato com 54%, uma queda de 8 pontos superada apenas por Jacques Chirac, que perdeu 20 pontos percentuais de popularidade no seu primeiro mandato, em 1995. O presidente de direita Nicolas Sarkozy, em comparação, começou o seu mandato, em 2007, com um índice recorde de aprovação popular (65%), que chegou a 66% ao cabo dos três primeiros meses. Mas, Macron não é de direita, nem esquerda. Sua opção, centrista, parece avançar pisando no freio e no acelerador ao mesmo tempo: austeridade orçamentária com promessas de avanços sociais.

Quem são os desiludidos de Macron?

Os trabalhadores

“Na ponta esquerda do panorama político e sociológico, nós temos os eleitores que criticam fortemente Macron por causa da reforma do Código do Trabalho”, explica Jérôme Fourquet, diretor do departamento de opinião e estratégias empresariais do Instituto francês de opinião pública (Ifop), um dos organismos que produz e publica o resultado das pesquisas de popularidade política.

Em 2016 a controversa lei El Khomri, do nome da então ministra do Trabalho, deu início a profundas reformas da legislação trabalhista sob o governo socialista de François Hollande. Agora, o novo governo pretende ir além, flexibilizando ainda mais as relações entre trabalhadores e patrões.

A medida não surpreende ninguém, uma vez que Macron havia feito dela um dos eixos principais da sua campanha eleitoral. O que surpreende, porém, é que o presidente tenha proposto reformar o Código do Trabalho através de “ordonnances”, isto é, através de um mecanismo constitucional, uma espécie de Medida Provisória, com qual o poder Executivo legisla e aplica a nova lei antes que o Parlamento a aprove.

Este “cheque em branco” já foi assinado pela Assembleia Nacional, onde o partido de Macron, a República em Marcha, tem uma confortável maioria. Agora só falta que o Senado aprove o pedido de “ordennance”, o que deve acontecer até o início de agosto, para que o presidente comece a sua reforma, com efeitos imediatos, ainda na primeira metade do seu mandato.

Os funcionários públicos

“Entre os funcionários públicos, o presidente perdeu 18% de aprovação popular!”, indica Jérôme Fourquet. “Uma consequência do congelamento do salário dos servidores, do corte de despesas em vários ministérios e da volta do período de carência para as licenças médicas”.

Macron prometeu, e a União Europeia acreditou: o novo governo não ultrapassará o teto de 3% do PIB no seu déficit fiscal de 2017, um limite imposto para todos os países da União Europeia, não respeitado pela França desde a eclosão da crise financeira de 2008.

Para alcançar esta difícil meta, descumprida por Nicolas Sarkozy e François Hollande, Macron precisará economizar € 60 bilhões por ano em despesas públicas. Daí, a necessidade dos cortes nos ministérios que tanto desagrada os servidores.

Além disso, se cumprir sua promessa de campanha, Macron deverá subtrair 500 mil postos de trabalho da administração pública, na qual trabalham 5,6 milhões de servidores do Estado.

Os aposentados

E não são somente os trabalhadores ativos que estão decepcionados com Emmanuel Macron, como lembra Jérôme Fourquet: “Nós percebemos que os aposentados, sobretudo de direita, estão desgostosos quanto aos planos de Macron de aumentar a CSG”.

A CSG (Contribuição Social Generalizada) é paga por trabalhadores, aposentados e rentistas na França, com uma taxa fixa de 7,5% do salário para os trabalhadores e uma taxa variável, segundo a renda de cada um, para os aposentados. Visando aumentar a arrecadação do Estado através desse imposto, Macron propõe o aumento de 1,7% da taxa, que passaria a descontar 9,2% da renda dos trabalhadores. Quanto aos aposentados, pelo menos 60% deles, com rendas maiores, passariam a pagar 8,3% de imposto sobre a sua aposentadoria.

Os deslizes morais

Com uma campanha eleitoral que prometia a moralização da política, Macron ganhou a simpatia dos eleitores, conseguindo renovar a Assembleia Nacional com 314 deputados do seu partido, 90% dos quais nunca haviam sido eleitos antes. Logo, porém, a política de moralização começou a mostrar fissuras, com escândalos envolvendo dois políticos do seu próprio governo, o ministro da Coesão Territorial, Richard Ferrand, e o ministro da Justiça, François Bayrou. O novo presidente, que prometia ser implacável contra os deslizes morais políticos, não teve outra saída senão exonerar os dois ministros, tidos como dois dos seus mais importantes aliados. O dano, porém, já estava feito.

Os militares

A mais recente baixa do governo Macron reflete, por outro lado, uma discordância direta entre o presidente e o chefe do Estado Maior das Forças Armadas, o general Pierre de Villiers. Na quarta-feira (19), o militar apresentou seu pedido de demissão por discordar do corte de € 850 milhões previsto no orçamento do ministério da Defesa. A demissão foi aceita por Macron, mas o mal-estar entre os militares ficou evidente com o forte apoio recebido pelo general quando da sua despedida perante as tropas.

Floreando as más notícias

Com Twitter, Facebook e Instagram, a assessoria de comunicação do governo Macron, jovem, charmosa e articulada, tem espelhado o seu presidente. O excesso de notícias, porém, com ares de marketing político, começa a ser percebido com maus olhos pelos eleitores.

“Começamos a ouvir críticas desse excesso de comunicação da presidência da República, uma comunicação muito trabalhada, quase suspeita, que esconderia ou camuflaria certas políticas para que elas se tornem mais digeríveis”, revela Jérôme Fourquet. “O presidente precisa prestar atenção a este excesso de comunicação, à moda norte-americana, que pode acabar trazendo mais danos do que benefícios ao governo, por parecer uma estratégia para escamotear as falhas do governo em termos de ações”.

Tudo é relativo

Comparado a um presidente da república com 10% de aprovação popular, como Michel Temer, Emmanuel Macron ainda surfa na crista da onda popular com 54% de popularidade entre os cidadãos franceses.

A tendência, de certo, é de queda. Mas o governo Macron ainda não teve tempo de implementar nenhuma das suas medidas mais importantes. Cabe aos franceses terem paciência para esperar e disfrutar (ou sofrer?) as consequências desse novo governo, que pretende revigorar a França, abalando os mais sólidos pilares da sociedade francesa, como o Código do Trabalho e o funcionalismo público.

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