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França/eleições

Intrigas e histórias das eleições presidenciais na Quinta República francesa

Em 2017, a França organiza sua décima-primeira eleição presidencial desde o início da Quinta República. Em cerca de 60 anos de vida pública, o pleito foi marcado por surpresas e vitórias apertadas, com resultados inesperados. Veja o resumo dessa novela que ganha um novo capítulo neste ano.

Jacques Chirac em 1979 em Roissy, com sua esposa Bernadette Chirac
Jacques Chirac em 1979 em Roissy, com sua esposa Bernadette Chirac JOEL ROBINE / AFP
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1958 – O nascimento da Quinta República com Charles De Gaulle (78,51% dos votos no primeiro turno)

Em 1958, a Argélia faz parte do território francês mas luta pela sua independência há quatro anos. Em Paris, a Quarta República, parlamentarista, nascida das cinzas da Segunda Guerra Mundial, vive um período de instabilidade. Caberá ao general De Gaulle, chefe da resistência francesa e exilado na Inglaterra durante a guerra, restabelecer a ordem. Ele faz um retorno triunfal.

Durante o verão deste ano, Michel Debré, braço-direito do general, escreve com uma equipe de juristas uma nova Constituição, validada no turbilhão dos acontecimentos pelo Parlamento e o governo. Em 4 de setembro de 1958, a nova Carta Magna é aprovada por 80% da população em um referendo. A Quinta República nasce oficialmente. Através do voto indireto de mais de 80 mil representantes, De Gaulle se torna o primeiro presidente da nova república.

O general Charles de Gaulle
O general Charles de Gaulle @IFC

1965 – O povo nas urnas! – De Gaulle (55,20%)

Uma mudança radical ocorre em relação à última eleição presidencial. A França introduz o voto direto pela primeira vez em um século. Também pela primeira vez na história do país, as mulheres podem participar do pleito. O general De Gaulle se recusa a fazer campanha e, para surpresa geral, acaba indo parar no segundo turno, que disputa contra François Miterrand, 20 anos mais jovem. Mitterrand, que fez propaganda na TV. Na época, só 40% dos lares franceses tinham televisão. Mitterrand abocanha uma boa parte do eleitorado, mas acaba perdendo a eleição quando De Gaulle, no segundo turno, se rende ao poder do novo veículo de comunicação.

1969 –  Rivalidade (Pompidou 58,21%)

De Gaulle perde popularidade após a revolta dos estudantes em maio de 1968 e das greves que se sucedem na França. Ele deixa o poder em 1969, depois de perder um referendo que propunha uma reforma administrativa. De Gaulle é substituído interinamente pelo presidente do Senado, Alain Poher, que se candidata pela ala de direita, dividida entre ele e Georges Pompidou, ex-primeiro-ministro de De Gaulle.

Ambos acabam no segundo turno, deixando a esquerda de fora. Apesar de o partido Comunista ter obtido mais de 20% dos votos, os esquerdistas apresentaram quatro candidatos, criando uma divisão interna com efeito direto nas urnas.Uma história interessante é a de Alain Krivine, jovem da Liga Comunista Revolucionária envolvido nos protestos de 68. Seus camaradas apresentaram sua candidatura sem informá-lo. Krivine descobre que está disputando a presidência durante o serviço militar.

Portrait officiel du président Valéry Giscard d'Estaing.
Portrait officiel du président Valéry Giscard d'Estaing. @ Elysée / Larigue

1974 – Vitória apertada (Giscard d’Estaing, 50,81%)

Georges Pompidou morre antes de completar cinco anos de mandato e doze candidatos se apresentam para as eleições presidenciais. Duas novas tendências políticas surgem no cenário político francês: a extrema-direita, com Jean-Marie Le Pen (que obteve 0,75%) e os ecologistas, representados por René Dumont (1,32%). Jacques Chaban-Delmas, candidato de De Gaulle, é derrotado já no primeiro turno para o ministro da Economia, Valéry Giscard d’Estaing. A direita está dividida, mas a esquerda se une: socialistas e comunistas apoiam François Miterrand. A TV tem um papel essencial nesse pleito.

No segundo turno, Mitterrand e Giscard D’Estaing se enfrentam em um debate, o que acontece pela primeira vez na história. Desse confronto televisivo surge a famosa frase: “Senhor Mitterrand, o senhor não tem o monopólio do coração”. Aos 48 anos, ele acaba levando a eleição por apenas 400 mil votos de diferença, se tornando o mais jovem presidente da Quinta República.

1981 – A Quinta República balança para a direita (Miterrand, 51, 76%) O Conselho Constitucional decide, em 1976, que cada candidato deve reunir pelo menos 500 assinaturas para se apresentar às eleições. O Partido Comunista obtém apenas 15% dos votos, perdendo para Jacques Chirac, que se candidata pela primeira vez. Miterrand, que se candidata pelo partido Socialista, sai vencedor, se destacando no debate contre Giscard d’Estaing. A Quinta República vira à esquerda pela primeira vez.

1988 – “Você está com toda a razão, primeiro-ministro” (Miterrand 54,02%)

Edith Cresson com François Mitterrand, em 9 de janeiro de 1979
Edith Cresson com François Mitterrand, em 9 de janeiro de 1979 AFP/Michel Clément

Dois anos antes das eleições, a Assembleia Nacional francesa passa a ser dominada pela direita. Jacques Chirac se torna o primeiro-ministro de um presidente de esquerda – a chamada coabitação. O chefe de governo é encarregado dos assuntos envolvendo a política nacional e Miterrand é responsável pela política internacional e as questões de defesa. Depois de se reeleger e vencer Chirac, o presidente socialista dissolve a Assembleia para obter uma maioria de esquerda. As eleições são marcadas por um forte recuo do partido comunista, que se torna a quinta força política no país, com apenas 5% dos votos, ficando bem atrás da Frente Nacional, do pai de Marine Le Pen, Jean-Marie Le Pen, com 15% dos votos.

1995 – Discurso e vitória (Jacques Chirac, 52,64%)

O mandato de Miterrand termina com uma vitória da direita nas legislativas. Édouard Balladur é designado primeiro-ministro. Enquanto isso, Jacques Chirac prefere preparar sua campanha presidencial. Ambos disputam o primeiro-turno, mas apesar do favoritismo de Balladur, Chirac se impõe. Ele enfrenta o socialista Lionel Jospin no segundo turno, eleito na primeira primária da legenda para designar um candidato à eleição presidencial.

2002 – A surpresa da extrema-direita (Jacques Chirac, 82,21%)

Essas eleições ficaram marcadas na memória de todos os franceses pela ascensão do partido de extrema-direita, Frente Nacional. Dois anos depois de sua eleição, em reação a um profundo movimento social que sacode o país, Jacques Chirac dissolve a Assembleia.

A vitória inesperada da esquerda nas legislativas de 1997 abre as portas para Lionel Jospin, que é alçado ao cargo de primeiro-ministro. Esta será a terceira coabitação da Quinta República. A diluição dos apoios dos representantes de esquerda e o anúncio tardio da candidatura de Jospin acabam favorecendo a extrema-direita. Jospin perde a vaga no segundo turno para Jean-Marie Le Pen. Traumatizado, Jospin decide se retirar da cena política. A surpresa é geral: nenhuma pesquisa indicava a possibilidade de segundo turno com a participação da extrema-direita. A partir deste ano, o mandato de presidente passa a ser de cinco anos, em vez de sete.

2007 – Pela primeira vez, uma mulher no segundo turno (Nicolas Sarkozy, 53,1%)

Pela primeira vez, os dois candidatos eleitos para disputar o segundo turno nunca ocuparam a presidência ou mesmo o cargo de primeiro-ministro. Nicolas Sarkozy e Ségolène Royal, que se torna a primeira mulher a disputar o cargo. Sua campanha, entretanto, é pontuada por gafes, como o uso de palavras inexistentes em francês, como “bravitude”. Ségolène acaba se tornando alvo de chacotas do público. Ela perde legitimidade dentro do partido e um de seus aliados chega ao ponto de se aliar a Sarkozy, que vence as eleições.

2012 – A volta da esquerda

A volta da esquerda ao poder é marcada por uma série de fatos inusitados. A imprensa francesa considera que a eleição de François Hollande é fruto de uma “conjunção astral”. O diretor do FMI, Dominique Strauss-Kahn, é dado como favorito até ser preso em 2011 em Nova York, acusado de estuprar uma camareira no hotel Sofitel. Ele desiste de se candidatar e Hollande entra na disputa, beneficiado pela queda de popularidade de Sarkozy, tido como um presidente intempestivo, bon-vivant, acusado também de financiamento ilegal de sua campanha em 2007. Hollande, o presidente “normal”, acaba ganhando a simpatia da população ao declarar guerra, em 2012, ao mundo das finanças.

(Fontes: “Parties de champagne”, Gérard Courtois (Journaliste do jornal Le Monde)
(Eleições presidenciais 1965 – 2012 : Segredos de campanha, (Revista L’Express, 21/12/2016)

• Tradução de Taíssa Stivanin do texto de Fabien Leboucq, RFI Savoirs

 

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