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Seminário em Paris promove debate sobre as línguas indígenas da América do Sul

O Museu da Língua Portuguesa, a Universidade de São Paulo (USP) e o Laboratório de Antropologia Social (LAS) do Collège de France promoveram nesta sexta-feira (15), em Paris, uma conferência internacional dedicada às línguas indígenas da América do Sul. O evento, realizado em parceria com a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), é uma ação que integra a exposição Nhe’ẽ Porã: Memória e Transformação, que é apresentada na sede da Unesco, na capital francesa, até o dia 26 de março.

A curadora da exposição Nhe’ẽ Porã: Memória e Transformação, Daiara Tukano, durante o encontro no Collège de France
A curadora da exposição Nhe’ẽ Porã: Memória e Transformação, Daiara Tukano, durante o encontro no Collège de France © RFI
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O encontro Línguas Indígenas da América do Sul: Memória e Transformação, reuniu pesquisadores franceses e brasileiros, e outros interessados na temática ao longo de toda a sexta-feira, em painéis e mesas redondas que abordaram as línguas indígenas e suas relações com o território, bem como a transmissão dos saberes originários, entre outros assuntos.

“A língua é um território. Cada língua concentra outras em seu interior. O Tupi Guarani, por exemplo, uma das mais importantes do Brasil, reúne outras 40 famílias linguísticas e dialetos. Essas línguas representam uma riqueza tamanha que é como um continente a ser descoberto”, destacou a diretora do LAS, do Collège de France, Andrea-Luz Gutierrez-Choquevilca, durante a abertura da conferência. 

Uma participante na conferência internacional dedicada às línguas indígenas da América do Sul, em Paris, 15/03/24
Uma participante na conferência internacional dedicada às línguas indígenas da América do Sul, em Paris, 15/03/24 © RFI

Daiara Tukano, curadora da exposição Nhe’ẽ Porã: Memória e Transformação, iniciou sua fala com um ritual dos povos tukano e destacou a relevância do debate para não deixar que essas línguas desapareçam. Já o presidente da FAPESP, Marco Antonio Zago, destacou que o encontro vai muito além de uma discussão sobre línguas, mas de se compreender essas línguas como uma expressão cultural. Ele destacou um levantamento que mostra que só no Brasil há 274 línguas indígenas.

“Estamos tratando de um enorme quebra-cabeças de culturas, as mais diversas possíveis. Quando falamos do estudo das línguas, falamos da diversidade cultural dos indígenas da América. E isso tem representações nas histórias deles e na arte. Ou seja, não é um tema que trate exclusivamente das línguas, embora essa também seja uma questão importante do ponto de vista das ciências, nos aspectos da estrutura das línguas e suas diferenças com relação a todas as outras do mundo, porque elas evoluíram isoladamente durante, pelo menos, 20 mil anos. Então elas criaram estruturas fonéticas, sintáticas e de representação do mundo que é muito diferente de todas as outras”, explicou.

Línguas indígenas na França

A diretora do Museu da Língua Portuguesa, Renata Motta, falou sobre a importância de se debater o tema das línguas indígenas na Europa. A internacionalização desta temática é também imprescindível por conta dos desafios brasileiros que, para ela, são sempre imensos. Segundo Motta, a discussão é primordial “no contexto de um posicionamento e da visibilização das línguas indígenas em risco no Brasil. Essa é uma articulação no âmbito de muitos países e é a primeira vez no Collège de France que pesquisadores e especialistas indígenas participam de um evento com pesquisadores não indígenas”, disse ao lembrar a relevância do local para o Brasil por conta do trabalho realizado pelo célebre antropólogo belga Claude Lévi-Strauss, que foi professor na instituição, com as populações indígenas no Brasil. 

Entre 1935 e 1939, Lévi-Strauss fez expedições etnográficas pelo Paraná, Mato Grosso e na Amazônia, em que estudou e fotografou diversas tribos indígenas, trabalho extremamente relevante pela contribuição à antropologia contemporânea. 

Passo positivo e civilizatório

Além de integrar a exposição Nhe’ẽ Porã, o seminário também faz parte de uma série de ações iniciadas no Brasil a partir de linhas temáticas que formam o português do país e que estão sendo trabalhadas pelo Museu da Museu da Língua Portuguesa, como explica a diretora Renata Motta. 

“Tivemos um ano dedicado às línguas de imigração, um segundo ano dedicado às línguas indígenas e este ano de 2024 vamos tratar das línguas africanas. É um ciclo importante porque pensamos sempre a língua portuguesa numa perspectiva cultural em constante transformação”. 

Renata Motta, diretora do Museu da Língua Portuguesa
Renata Motta, diretora do Museu da Língua Portuguesa © RFI

Questionado se o cenário brasileiro atual se mostra mais favorável à discussão e à preservação da memória indígena, o presidente da FAPESP, Marco Antonio Zago, diz que sim e que este é um passo positivo e civilizatório do país. 

“O ambiente hoje é muito mais favorável a olhar a questão dos indígenas não só como um problema para o país, mas como parte da nossa riqueza, da nossa diversidade. A criação do Ministério dos Povos Indígenas é uma manifestação clara de que o país reconhece esses povos como parte da sua diversidade. Não vou fazer referência direta ao governo passado, mas a sensação é a de que antes estávamos aguardando que eles desaparecessem. Fazia parte do processo natural, porque estamos no século XXI, na cultura do digital e, portanto, isso seria uma coisa do passado. E essa visão desapareceu”, destacou ele, lembrando também da importância da preservação, já que muitas línguas estão em fase de extinção. 

“Nesse grande universo de falantes de línguas indígenas, algumas dessas línguas têm menos de 100, menos de 50 falantes. Em alguns casos há línguas que têm cinco, sete ou oito falantes. E quando elas desaparecem nós perdemos uma parte do patrimônio da humanidade” disse. 

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