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Direito ou liberdade? Senado francês aprova inclusão do aborto na Constituição

O Senado francês, com maioria de direita, votou na noite dessa quarta-feira (1°), por 166 votos a 152, para incluir na Constituição a "liberdade da mulher" de recorrer ao aborto, uma formulação que abandona a noção de "direito", cara à esquerda.

O Senado francês é a favor da inclusão na Constituição da "liberdade" de fazer um aborto
O Senado francês é a favor da inclusão na Constituição da "liberdade" de fazer um aborto AP - Aurelien Morissard
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O texto aprovado em primeira leitura pelos senadores, que agora deve retornar à Assembleia Nacional, visa completar o artigo 34 da Constituição com a seguinte fórmula: “A lei determina as condições em que se exerce a liberdade da mulher de interromper a gravidez".

Mesmo que ainda haja um longo caminho a percorrer antes de uma possível aprovação final pelo Parlamento - que também deve ser seguida de um referendo -, o grupo socialista saudou imediatamente um "grande avanço para os direitos das mulheres", enquanto o grupo ecologista falou em "vitória histórica".

"Histórico", também reagiu no Twitter a líder do partido A França Insubmissa (LFI, esquerda radical) na Assembleia Nacional, Mathilde Panot.

Os senadores analisaram o projeto de lei constitucional que o LFI conseguiu aprovar em novembro, em primeira leitura pela Assembleia Nacional francesa, com o apoio da maioria presidencial.

Redação gera divergências

O texto do projeto de lei foi totalmente reescrito, por meio de uma emenda do senador do partido Republicanos (LR, direita) Philippe Bas. A nova proposta não se refere mais ao “direito” ao aborto. A esquerda deplora unanimemente a formulação, mas aprovou o texto dizendo ter agido “responsavelmente” para permitir a continuação de sua tramitação.

Uma rejeição pura e simples do projeto de lei pelo Senado seria o fim da iniciativa de incluir o aborto na Constituição.

Uma proposta de lei constitucional deve ser votada nos mesmos termos pelas duas casas do Parlamento e, depois, submetida a referendo para ser adotada definitivamente. Ao contrário do que acontece com as leis ordinárias, a Assembleia Nacional não pode ter “a última palavra” em caso de desacordo com o Senado.

Em outubro passado, o Senado rejeitou por 139 votos a favor e 172 votos contra um primeiro projeto de lei constitucional sobre o assunto apresentado pela ecologista Mélanie Vogel e co-assinado por senadores de sete das oito correntes da casa, com exceção dos Republicanos.

Como pano de fundo desses projetos que visam incluir o direito ao aborto na Constituição francesa, está a histórica decisão da Suprema Corte dos Estados Unidos, no ano passado, de revogar este direito.

"Supérfluo"

"Alguns de nós querem tanto introduzir uma referência ao aborto na Constituição que estão dispostos a aceitar qualquer redação", criticou o senador centrista Loïc Hervé.

O grupo Republicanos votou por maioria esmagadora contra a emenda de Bas, considerada "supérflua" por seu presidente Bruno Retailleau. “O direito ao aborto não é ameaçado na França por qualquer formação política”, martelou.

"A Constituição não foi feita para enviar mensagens simbólicas para o mundo todo", acrescentou o senador.

O ministro da Justiça, Eric Dupond-Moretti, lembrou em seu discurso introdutório o desejo do governo de apoiar "qualquer iniciativa parlamentar que vise a constitucionalizar o direito ao aborto".

Sobre a contraproposta de Bas, ele contou com a "sabedoria" do Senado, notando "uma vontade de chegar a um compromisso", mas expressando "uma pequena dúvida" sobre sua eficácia.

Em troca, foi criticado por Bas por "ficar à margem" ao não tomar a iniciativa de um texto do governo.

Simone Veil, Ministra da Saúde do governo Giscard-Chirac, durante seu discurso histórico  pelo direito ao aborto na França em 26 de novembro de 1974.
Simone Veil, Ministra da Saúde do governo Giscard-Chirac, durante seu discurso histórico pelo direito ao aborto na França em 26 de novembro de 1974. AFP

Philippe Bas, que era um colaborador próximo de Simone Veil, a ministra da Saúde francesa que virou nome da lei que garante o direito ao aborto na França, aprovada em 1974, defendeu em sua contraproposta o desejo de "garantir o equilíbrio da lei Veil". “Não existe direito absoluto”, sublinhou, explicando que a sua fórmula “permite ao legislador não abdicar dos seus direitos a favor do poder constituinte”.

A sessão foi brevemente suspensa após um incidente na galeria: um grupo de jovens ativistas interrompeu a intervenção do senador Stéphane Ravier (extrema direita) aos gritos de "Protejam o aborto", antes de serem retirados por seguranças.

(Com informações da AFP)

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