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Saúde em dia

França: pesquisa traz esperança de novo tratamento contra depressão

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Cientistas franceses testam com sucesso nova molécula que modula proteínas cerebrais que agem na regulação do humor.

Depressão: muitos pacientes não reagem aos tratamentos disponíveis
Depressão: muitos pacientes não reagem aos tratamentos disponíveis Pixabay
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A depressão clínica é uma doença que atinge cerca de 300 milhões de pessoas no mundo e pode ser considerada uma verdadeira epidemia mundial. Os medicamentos existentes visam melhorar a qualidade de vida do paciente e impedir, nos casos mais graves, que cometam suicídio.

Cerca 30% dos casos de depressão, entretanto, são resistentes às moléculas disponíveis no mercado. Essa constatação levou uma equipe do Inserm, o Instituto de Pesquisas Médicas da França, a buscar novas alternativas de tratamento, o que levou à criação de uma droga, ainda em fase de testes, que curou camundongos deprimidos. O estudo, divulgado em janeiro, foi coordenado pela neurocientista Sophie Gautron, especialista em neurobiologia e doenças psiquiátricas.

Os cientistas partiram da descoberta recente de que um grupo de proteínas conhecido como OCT, ou transportadores catiônicos orgânicos, atuava na regulação do humor. Existem três tipos e dois deles estão presentes no cérebro, explica a pesquisadora francesa.

"Vários estudos mostraram que eles eram capazes de transportar os neurotransmissores aminérgicos, ou seja, a dopamina, a serotonina e a noradrenalina, importantes para a regulação do humor", detalha.

A partir dessa constatação, os pesquisadores franceses formularam a hipótese de que esses transportadores, presentes também em órgãos como o rim, o fígado ou a placenta, poderiam ter uma função determinante no cérebro. Os especialistas descobriram que os transportadores catiônicos orgânicos atuavam no mecanismo da ansiedade e na resposta ao stress e aos antidepressivos atuais, observando o comportamento de camundongos modificados geneticamente.

“Foi um trabalho de vários anos, com várias publicações, que progressivamente nos levaram a crer que talvez esses transportadores catiônicos orgânicos eram bons alvos para desenvolver novos medicamentos que regulariam o humor, antidepressivos ou ansiolíticos”, explica Sophie Gautron.

Criando um novo medicamento

Para verificar a hipótese, os cientistas fizeram uma parceria com uma equipe do laboratório de Química da Faculdade de Medicina Paris Descartes, especialista no desenvolvimento de novas moléculas. A equipe selecionou um inibidor conhecido desses transportadores, capaz de atingir “o alvo” definido pelos cientistas e o modificou para reduzir os efeitos colaterais – um problema recorrente dos medicamentos.

Este é o caso das moléculas atuais, que atuam no sistema nervoso central inibindo, de forma seletiva, a recaptação da serotonina, um neurotransmissor responsável pela comunicação entre as células nervosas. O remédio mais popular dessa categoria de fármacos é o Prozac, inventado nos anos 80, ou cloridato de fluoxetina. Sua ação aumenta o nível de serotonina no cérebro. Conhecido como a “pílula da felicidade”, ele não é eficaz em todos os pacientes e seus efeitos secundários são múltiplos.

De acordo com a cientista francesa, a equipe utilizou técnicas de bioinformática para modelizar a nova molécula em 3D. O objetivo foi afinar as propriedades da droga e modificá-la para que ela penetrasse no cérebro e atingisse os alvos terapêuticos definidos pela equipe. Dessa maneira, a molécula poderia penetrar corretamente no órgão.

“Em seguida nós a testamos em camundongos, usando modelos de depressão crônica, para examinar sua propriedades antidepressivas.”

Stress, principal fator de risco

Nos testes com camundongos, os cientistas expuseram os animais ao hormônio do stress, a corticosterona. Eles desenvolveram sintomas como a ansiedade, a ausência de prazer nas atividades cotidianas, também chamada de anedonia, ou problemas de memória. Em seguida, os pesquisadores administraram, durante várias semanas, a nova molécula nos camundongos deprimidos.

“A molécula que desenvolvemos conseguiu reverter essas anomalias de maneira eficaz, de maneira ainda mais eficaz que a fluoxetina, o antidepressivo convencional. Ficamos muito animados. O efeito mais imediato foi na retomada do prazer nas atividades cotidianas”, declara.

A molécula também ativava regiões do cérebro, explica Sophie Gautron, importantes para o chamado sistema de recompensa cerebral. “Com certeza existe uma similaridade entre esse modelo crônico e o homem. É claro que certos aspectos da depressão não podem ser modelizados, mas é um modelo válido para pesquisa de novos antidepressivos”, declara.

A corrida por medicamentos que tratem as chamadas depressões resistentes, que não cedem aos tratamentos com inbidores de recaptação da serotonina é urgente, lembra a pesquisadora francesa. “As causas do que chamamos de depressão resistente ainda são desconhecidas. Sabemos que a doença tem, entre outros fatores, um fundo genético”, diz.

Segundo a pesquisadora, estudos mostram que muitos genes estão envolvidos no desenvolvimento da doença, associados a fatores ambientais – principalmente o stress crônico, assim como a capacidade de resistência a esse estímulo, que é individual. Por isso um dos principais objetivos dos cientistas, atualmente, é identificar marcadores biológicos preditivos da resposta a um determinado tipo de molécula.

Uma área que está se expandindo, diz a pesquisadora, é o papel da resposta inflamatória (envolvendo o sistema imunitário), que influenciaria a depressão. A busca, em todo o caso, é por uma Medicina cada vez mais personalizada, concebida em função das particularidades do paciente.

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