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Saiba por que o Eurovision, o maior concurso musical do mundo, está mais político do que nunca este ano

Acontece neste sábado (14) a final do Eurovision, evento conhecido como o maior concurso musical do mundo. Famoso por ser assistido simultaneamente por milhões de pessoas, mas também pelo desfile de performances pitorescas, a competição é realizada este ano na Itália, país vencedor em 2021, após uma edição de 2020 anulada por causa da pandemia. Mas desta vez, a guerra na Ucrânia dá ao evento ares de plataforma política, reforçando um lado militante que frequentemente permeia o concurso. 

O grupo ucraniano Kalush Orchestra durante ensaio para a 66ª edição do Eurovision, que acontece em Turin, na Itália.
O grupo ucraniano Kalush Orchestra durante ensaio para a 66ª edição do Eurovision, que acontece em Turin, na Itália. AP - Luca Bruno
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Silvano Mendes, de Paris

Criado em 1956, o Eurovision conta com a participação de praticamente todos os países do velho continente, além de algumas nações convidadas especiais – como a Austrália ou o Marrocos. A grande final é sempre transmitida ao vivo pela televisão em toda a Europa e tem uma audiência de quase 200 milhões de pessoas.  

Considerado démodé por muitos, o Eurovision ficou conhecido por ter revelado verdadeiras instituições da música internacional, como o espanhol Julio Iglesias e o grupo sueco Abba nos anos 70.

A cantora canadense Celine Dion, que representou a Suíça nos anos 80, e a atriz Olivia Newton-John, que defendeu a Inglaterra em 1974, também passaram pelo concurso.

Causa LGBTQIA+

Mas o programa também é famoso pelo espetáculo de figurinos extravagantes, coreografias improváveis, muita ironia e uma boa pitada de engajamento pela causa LGBTQIA+. Em 1988, Israel venceu a competição com a canção “Diva”, interpretada por Dana International, uma mulher trans. Em 2013, Krista Siegfrids, a representante da Finlândia, protagonizou um beijo lésbico no palco, enquanto a Áustria levou o concurso em 2014 com “Rise like a phœnix”, cantada por Conchita Wurst, uma drag que combinava feminilidade exacerbada e uma bela barba.

Mas este ano o Eurovision é marcado pela guerra na Ucrânia e as tensões internacionais fazem parte do programa. Em um gesto de solidariedade ao povo ucraniano, os organizadores simplesmente excluíram a Rússia, país que chegou a ganhar a competição em 2008.   

Em compensação, como já era de se esperar, a Ucrânia aparece como a grande favorita desta 66ª edição, que acontece em Turin. O grupo ucraniano Kalush Orchestra, que interpreta a canção "Stefania", desponta em todos os sites de apostas dedicados ao concurso.

A música, um rap que mistura ritmos do folclore local, foi composta pouco antes da invasão da Ucrânia pela Rússia. Mas a letra, apresentada como uma mensagem enviada a uma mãe, ganhou força com o contexto atual. Com frases como “Eu sempre encontrarei o meu caminho de volta para casa, mesmo se todas as estradas estiverem destruídas”, a canção parece falar aos milhões de ucranianos que tiveram que fugir do país.

Stalin e limpeza étnica já inspiraram canção vencedora

“Estamos aqui para mostrar que a música ucraniana e a cultura ucraniana existem”, declarou o cantor Oleh Psiuk. Ele e os outros cinco membros do  Kalush Orchestra receberam uma autorização especial do governo de Kiev para participar do evento, já que todos os homens em idade de combater não podem deixar o território ucraniano atualmente. Logo após o final do concurso, eles devem voltar para a Ucrânia e continuar contribuindo para os esforços de defesa do país.

Os ucranianos já ganharam o Eurovision duas vezes, em 2004 e 2016. Na última vitória, o país também se beneficiou do contexto político, já que a edição aconteceu dois anos após a anexação da Crimeia por Moscou. Interpretada por Jamala, a canção vencedora, “1944”, falava da deportação dos tártaros da Crimeia, um dos episódios mais sóbrios da história do país, quando Josef Stalin orquestrou um processo de limpeza étnica que resultou na deportação de 200 mil membros dessa comunidade para o Uzbequistão.

Soft Power

Mas o Eurovision não é feito apenas de mensagens políticas. Na edição deste ano, logo atrás da Ucrânia, os favoritos são o britânico Sam Ryder, que canta "SpaceMan", a sueca Cornelia Jakobs, que apresenta "Hold me closer", ou ainda a cantora espanhola de origem cubana Chanel, com "SloMo", músicas nada engajadas. Já os italianos Mahmood & Blanco, que competem com "Brividi", são bem colocados nas apostas e esperam conquistar o público, após a vitória dos compatriotas do grupo de rock Maneskin, em 2021.

No entanto, o fato de tocar em casa não representa uma vantagem no Eurovision, pois os espectadores, que participam pela internet e pelo telefone, podem votar apenas em candidatos de outros países. Ou seja, quem está na Itália pode dar seu voto para todos os concorrentes, exceto para o representante italiano, por exemplo. Aliás, por essa razão cantar em inglês, e não em seu próprio idioma, é uma tática adotada por muitos participantes para alcançar um público mais amplo.

Mesmo assim, o concurso é visto como um elemento de soft power para alguns países. É o caso de Israel, que não faz parte do continente europeu, mas já ganhou a competição quatro vezes. E cada vitória foi uma ocasião para o poder israelense mostrar uma boa imagem do país no ocidente. Principalmente porque o vencedor acolhe a edição seguinte da competição – algo que já preocupa alguns ucranianos, em caso de vitória.  

Outro exemplo é o da França, um dos países fundadores do concurso, que raramente se apresenta com canções em inglês. Este ano, depois de ter ficado com o segundo lugar em 2021 – posição que não alcançava há décadas –, os organizadores decidiram investir no regionalismo. O grupo Alvan & Ahez vai interpretar uma música totalmente em bretão, decisão apresentada como uma homenagem a esse idioma cultivado no oeste do país, mas também à todas as minorias que coabitam na França.

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