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Dois machos podem gerar um filho? Cientista japonês mostra que sim, com ajuda da genética

Um famoso biólogo japonês, Katsuhiko Hayashi, anunciou na quarta-feira (8) um grande avanço científico: sua equipe conseguiu usar as células de dois ratos machos para criar um embrião e dar à luz bebês ratos saudáveis. A experiência, no entanto, ainda está longe de anunciar a possibilidade de casais formados por homens terem filhos sozinhos.

Rato de laboratório
Rato de laboratório DR
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De Sébastian Seibt, da France24.

O anúncio da reprodução de dois ratos machos, sem um rato fêmea, foi feito por Katsuhiko Hayashi, durante um encontro internacional de pesquisadores do Genoma Humano em Londres. 

O trabalho de sua equipe ainda não foi publicado, mas o pesquisador afirma que a descrição do caso já foi enviada à revista Nature, uma das mais importantes na área. Se o feito por confirmado pela revista, está será uma "pequena revolução", afirma Nitzan Gonen, diretor do Laboratório de Determinação do Sexo da Universidade Bar-Ilan de Israel.

As tentativas de criar bebês a partir de indivíduos do mesmo sexo estimulam o mundo dos geneticistas há mais de uma década. O objetivo não é apenas demonstrar a possibilidade de casais do mesmo sexo terem filhos sem a intervenção de alguém do outro sexo, mas também abrir portas terapêuticas para indivíduos inférteis ou famílias monoparentais.

Por enquanto, o trabalho de Katsuhiko Hayashi se limita ao reino animal. Ele conseguiu reprogramar células de camundongos machos para perderem seu cromossomo Y - um marcador sexual masculino - e adquirirem um segundo cromossomo X, que só está presente nas fêmeas.

"Algumas células-tronco perdem naturalmente seu cromossomo Y, enquanto outras, devido a malformações ou erros que os cientistas procuraram estimular adicionando uma determinada molécula, podem adquirir um cromossomo X", observa Nitzan Gonen. O trabalho dos cientistas japoneses é, portanto, baseado em uma mistura sutil de seleção natural e manipulação humana.

Como é feita a gestação?

O oócito recém-criado - uma célula sexual feminina - foi então fertilizado pelos pesquisadores com esperma de camundongo. O óvulo foi então implantado em uma fêmea de camundongo para se desenvolver.

Portanto, ainda há uma 'mulher' envolvida no processo, mas 'somente porque ainda não desenvolvemos um útero artificial para assegurar o desenvolvimento adequado do embrião no laboratório', observa Robin Lovell-Badge, biólogo e geneticista do Crick Institute, em Londres.

Esta fêmea portadora não transmite nenhuma bagagem genética ao futuro rato, que deve tudo a seus dois pais.

Um método ineficiente

"Este é um trabalho cientificamente muito interessante e promissor, mas também devemos estar conscientes das limitações atuais e do trabalho ainda a ser feito", adverte Robin Lovell-Badge.

Primeiramente, como admite o próprio Katsuhiko Hayashi, este ainda não é um método muito eficaz. Dos 630 embriões implantados em fêmeas portadoras, apenas sete ratos nasceram. A boa notícia é que todos esses bebês cresceram bem e se tornaram férteis, aponta a revista Nature.

"A produção de gametas [células reprodutivas masculinas ou femininas] é um processo muito complexo e demorado. Não sabemos como reproduzi-lo perfeitamente in vitro", diz Nitzan Gonen. Além disso, "os ovos produzidos no laboratório utilizando este método são de qualidade inferior aos formados naturalmente", acrescenta Robin Lovell-Badge. Como resultado, o número de embriões viáveis será menor.

"Claramente, a eficácia deste método terá que ser melhorada antes que possamos pensar em testá-lo em humanos", diz Nitzan Gonen. E o caminho para uma possível aplicação desta descoberta em humanos pode ser longo e cheio de obstáculos.

Antes de mais nada, existem problemas puramente científicos. "A tecnologia usada aqui para transformar uma célula-tronco de rato macho em um oócito ainda não foi dominada para humanos", enfatiza Robin Lovell-Badge.

O processo também levaria muito mais tempo. "Seria um desafio técnico de uma magnitude completamente diferente, pois a integridade das amostras teria que ser mantida no laboratório por um período de tempo muito maior, o que aumenta o risco de acidentes", explica Robin Lovell-Badge.

Questões éticas

E isso sem contar os obstáculos éticos. "Temos que garantir que a sociedade esteja pronta para aceitar a possibilidade de casais de homens terem filhos", diz Nitzan Gonen.

"Haverá provavelmente uma proporção significativa da população que não se oporá a esta possibilidade, mas outros vão se opor por motivos religiosos ou por outras razões. Levará tempo para debatermos com os argumentos a favor desta tecnologia", observa Robin Lovell-Badge, que já esteve envolvido em debates nacionais no Reino Unido sobre a ética da pesquisa com células-tronco.

O lugar das mulheres neste processo também precisará ser considerado. As mesmas questões que têm alimentado e continuam alimentando debates em alguns países sobre o papel das barrigas de aluguel devem voltar à mesa.

A técnica utilizada por Katsuhiko Hayashi ainda não funciona para duas mães. "Enquanto sabemos mais ou menos como criar um oócito a partir de uma célula-tronco masculina, ninguém ainda conseguiu fazer um espermatozoide a partir de uma célula-tronco feminina", explica Nitzan Gonen, cujo laboratório está trabalhando neste problema de pesquisa.

Com tudo isso, essa tecnologia não parece ser algo viável para humanos nas próximas duas décadas, mas abre as portas para a solução de casos de infertilidade.

"Por exemplo, há crianças que superaram a leucemia graças à quimioterapia ou à radioterapia. Mas estes tratamentos podem afetar sua fertilidade. Esta técnica de criar oócitos a partir de células poderia ajudá-los", exemplifica Robin Lovell-Badge. O mesmo se aplica aos casais que decidem ter filhos em idade relativamente avançada "quando a qualidade de suas células reprodutivas se deteriorou", acrescenta Nitzan Gonen.

Por enquanto, este parece ser um pequeno passo para os ratos que, talvez um dia, possa se tornar um grande passo para a humanidade.

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