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"Pela primeira vez, eu senti a UE interessada em voltar de verdade para a América Latina", diz Lula

Para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a terceira cúpula de países latino-americanos, caribenhos e europeus (Celac-UE) encerrada terça-feira (18), em Bruxelas, foi a mais “exitosa e madura” de todas as reuniões que ele já teve com a União Europeia. Este sucesso, segundo Lula, se deve possivelmente à disputa entre os Estados Unidos e a China, aos investimentos chineses na região e na África e à guerra na Ucrânia.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, durante coletiva em Bruxelas no dia 19 de julho de 2023.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, durante coletiva em Bruxelas no dia 19 de julho de 2023. © Ricardo Stuckert/Divulgação
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Adriana Moysés, enviada especial da RFI a Bruxelas

Antes de deixar a capital belga nesta quarta-feira (19), Lula deu uma entrevista coletiva na qual comentou os resultados de dois dias de discussões entre líderes de 60 países

Lula disse que poucas vezes viu tanto interesse político e econômico dos países europeus pela América Latina, possivelmente pela disputa entre os Estados Unidos e a China, devido aos investimentos da China na África e na região e também a guerra na Ucrânia.

Embora a China tenha largado na frente, desde 2013 com seu projeto Nova Rota da Seda, que consagra bilhões de dólares em investimentos em infraestruturas nos países em desenvolvimento, os europeus se deram conta de que as relações com os países da Celac são essenciais para seus próprios interesses.

"Pela primeira vez, senti a União Europeia interessada em voltar de verdade para a América Latina", afirmou. “Pela questão do clima e pela questão energética, a região do mundo que pode produzir o hidrogênio verde que a Europa precisa é exatamente nossa querida América do Sul”, disse Lula.

Durante o encontro de dois dias, os europeus anunciaram investimentos de € 45 bilhões na América Latina, apesar de parte dos recursos se referirem a projetos já em andamento. O presidente também destacou o compromisso reiterado pelos europeus de desembolsar US$ 100 bilhões por ano para o financiamento climático, necessários para combater o desmatamento na Amazônia, território soberano do Brasil, sublinhou, e outras florestas.

Lula destacou que a Cúpula Amazônica, dias 8 e 9 de agosto, em Belém, vai discutir uma estratégia de preservação da floresta com desenvolvimento, “para que os 50 milhões de seres humanos da região tenham qualidade de vida”.

O Brasil convidou os dois Congos e a Indonésia, países que também têm reservas de florestas tropicais, para participar da reunião, que pretende preparar um documento para levar à COP28, que se realizará no final do ano nos Emirados Árabes Unidos.

“O Brasil não quer transformar a Amazônia num santuário. Nós queremos transformar a Amazônia num centro de desenvolvimento verde, queremos compartilhar a exploração científica com o mundo que queira participar, porque achamos que é possível extrair da grandiosidade do ecossistema da Amazônia, e da riqueza da biodiversidade, coisas importantes para o desenvolvimento de novas indústrias, por exemplo, de fármacos e cosméticos, e outras coisas que a gente possa encontrar porque ainda é um território inexplorado.”

Também em agosto, o governo vai apresentar um plano de investimentos na transição energética e ecológica, apontou o presidente, “para levar o Brasil a entrar na era da bioeconomia verde e ser um exemplo para o resto do mundo”.

 

Mais de 30 jornalistas internacionais acompanharam a coletiva do presidente brasileiro em Bruxelas nesta quarta-feira (19)
Mais de 30 jornalistas internacionais acompanharam a coletiva do presidente brasileiro em Bruxelas nesta quarta-feira (19) © Ricardo Stuckert/Divulgação

 

Acordo Mercosul-UE

Lula insistiu longamente na coletiva sobre a responsabilidade do Brasil na preservação da floresta e nos compromissos ambientais assumidos pelo governo, este que é um dos pontos de atrito com a União Europeia nas negociações do acordo comercial com o Mercosul, que se arrastam há 24 anos.

Havia 35 jornalistas da imprensa internacional presentes, um número considerado expressivo por assessores do Planalto.

Lula afirmou que em duas ou três semanas vai mandar a resposta de Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai à carta (“side letter”), que ele considerou "agressiva" do bloco europeu, com exigências ambientais adicionais para a implementação do tratado.

“Nós não aceitamos a carta adicional da União Europeia. É impossível você imaginar que entre parceiros históricos como nós, alguém faça uma carta com ameaças. Nós fizemos uma carta-resposta e achamos que a União Europeia vai concordar tranquilamente com a nossa resposta”, enfatizou.

Ele voltou a dizer que o Brasil não pretende ceder no capítulo das compras governamentais, consideradas um instrumento de desenvolvimento interno para a indústria nacional e de todo o Mercosul.

“A França é muito ciosa da proteção de seus produtos agrícolas, de seu pequeno e médio agricultor. Da mesma forma que a França tem essa primazia de defender seu patrimônio produtivo, nós temos o direito de defender o nosso”, destacou. “A riqueza de uma negociação é que todos têm de ceder”, argumentou. "Fecharemos o acordo que for possível", insistiu.

Venezuela

A situação da Venezuela, que foi tema de uma reunião à margem da cúpula, foi abordada na entrevista. Lula disse que a situação no país “vai ser resolvida quando os partidos do governo e da oposição chegarem a uma conclusão sobre a data da eleição de 2024 e as regras do processo eleitoral, momento em que as sanções dos Estados Unidos têm de começar a cair”.

Guerra na Ucrânia

Questionado por jornalistas se a guerra na Ucrânia ocupou um espaço maior que o necessário nos debates da cúpula, Lula julgou que a reunião foi “extraordinária”, até na troca de ideias não consensuais sobre o conflito.

A declaração conjunta publicada no final do encontro quase não foi aprovada por oposição da Nicarágua, que se recusa a condenar a invasão russa. Em uma reunião da qual o presidente Lula participou, Cuba e Argentina acabaram convencendo o governo nicaraguense a endossar o documento. 

O Brasil tem mantido conversas com a China, a Indonésia e com um país latino-americano – não identificado pelo presidente – para encontrar uma solução negociada. Lula voltou a defender a construção de um grupo de países capaz de, no momento certo, convencer a Rússia e a Ucrânia de que a paz é o melhor caminho. "Está havendo um cansaço, vai chegar um momento em que vai ter paz", afirmou. 

O presidente da República já está a caminho do Brasil, mas o avião fará uma parada técnica em Cabo Verde para reabastecer. A pedido do governo local, Lula irá se reunir no aeroporto com o presidente cabo-verdiano, Jorge Maria Neves. Será a décima-primeira bilateral de Lula com dirigentes estrangeiros em três dias.

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