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"Sergio Moro deu um golpe político em Bolsonaro", diz cientista político francês

A saída de Sergio Moro do Ministério da Justica e da Segurança Pública anunciada nesta sexta-feira (24), deve provocar um forte impacto na base de apoiadores do presidente Jair Bolsonaro e criar uma nova dinâmica para os pedidos de destituição do chefe de Estado brasileiro, segundo análise de Gaspard Estrada, diretor executivo do Observatório Político da América Latina e do Caribe (OPALC) da Sciences-Po de Paris.

Sergio Moro acusou Bolsonaro de "interferência política" na Polícia Federal
Sergio Moro acusou Bolsonaro de "interferência política" na Polícia Federal REUTERS - UESLEI MARCELINO
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Em longo pronunciamento, Moro explicou as razões de sua saída do cargo, mencionando diversas discordâncias com o presidente Jair Bolsonaro sendo a última delas, a exoneração do diretor da Polícia Federal, Maurício Valeixo, sem seu consentimento. 

O ex-juiz da Operação Lava Jato ainda denunciou a "interferência política" de Bolsonaro na Polícia Federal, algo que ele disse não compactuar e que pode inclusive trazer "consequências imprevisíveis". 

"É um golpe político contra o presidente Bolsonaro. Pela forma, de anunciar em uma conferência de imprensa, apontando fatos potencialmente graves para a governabilidade futura de Bolsonaro, que já tem contra ele mais de 20 pedidos de impeachment, e com uma base social que possivelmente pode rachar", opina Estrada.

Segundo o cientista político, a demissão do ex-juiz federal que simbolizou para muitos brasileiros a luta contra a corrupção à frente da operação Lava Jato, enfraquece um dos temas que ajudou a eleger Bolsonaro. 

"Até hoje Bolsonaro tem conseguido fazer que as pessoas que apoiam a operação Lava Jato sejam defensoras do governo federal. A partir da denúncia (de interferência na PF), não sabemos se essa situação vai se sustentar. Essa é a aposta de Sergio Moro, rachar essa base para construir uma base politica própria", argumenta.

Segundo Gaspard Estrada, os movimentos políticos no Congresso, que tentam aproveitar a queda de popularidade do Bolsonaro para fazer avançar os pedidos de impeachment, podem aproveitar esse novo momento de fragilidade política do chefe de Estado. 

"O quadro atual de pandemia (do coronavírus)  dificulta uma mobilização política. Agora, com esse fato novo apontado pelo ex-ministro da Justiça, vão se multiplicar os pedidos de destituição e permitir que pessoas que eram próximas do governo, passem a defender a hipótese da abertura de um processo de impeachment. Em particular, nessa base, estão os deputados do PSL", diz.

Como a base social do presidente deve reagir ?

O cientista político da OPALC diz que a base de apoiadores de Bolsonaro, estimada em 30%, está misturada entre os que apoiam a pessoa e a que apoiavam a agenda política da candidatura nas eleições de 2018, na qual estava a suposta pauta de luta contra a corrupção e a favor da operação Lava Jato.

"Se uma parte significativa desse bolo de 30% rachar, e se a aprovação do presidente Bolsonaro cair, a probabilidade de que a classe política comece a levar a sério o pedido de impeachment cresce. Essa é a aposta de Moro, rachar o ‘bolsonarismo’ e focar nas instituições para um possivel pedido de impeachment", sustenta.

Apesar das divergências que marcaram a relação de Moro e Bolsonaro desde o início do governo, a troca da direção da Polícia Federal foi apontada pelo ex-Ministro como o fator determinante para sua decisão de sair do executivo. 

Para Estrada, o interesse de Bolsonaro na troca do comando da PF estaria relacionado a investigações envolvendo os familiares do chefe de Estado. "Há investigações e inquéritos, em particular sobre as fake news. Tem outros inquéritos acompanhados pelo próprio STF, onde a Polícia Federal tem papel secundário, mas atua, como na CPI das fake news", lembra.

Futuro político de Moro

Outro fator de desgaste apontado pelo analista político é a mudança desejada por Bolsonaro na sua relação conflituosa com os parlamentares. "Em um sentido, o governo Bolsonaro está mudando. O presidente entendeu que a posição dele de não compor minimamente com o Congresso é insustentável. Ele sabe que se não fazer um acordo com os partidos políticos, ele não se mantém no Planalto até 2022", afirma. "Ele está recompondo sua base política, falando, conversando com os partidos que ele chama de ‘velha politica’ , o Centrão, para prometer cargos em troca de votos no Congresso. Nesse sentido, a presença de Moro no governo dele é um estorvo", afirma Estrada.

"O que estamos assistindo hoje é uma espécie de segundo governo Bolsonaro, onde por um lado tem o grupo dos militares, sendo reforçado e por outro lado, a formação de uma coalizão com os partidos da velha classe política".  

Sobre o futuro político de Sergio Moro, o diretor executivo da OPALC prevê que ele deverá optar por um partido político, provavelmente o Podemos, do senador paranaense Álvaro Dias. "Se Moro conseguir articular seu discurso e aderir ao Podemos, Bolsonaro vai ficar com um problema político muito grave", diz. Para Estrada, Moro já entra no páreo para a eleição presidencial de 2022.

 "Ele deverá se filiar a um partido político, e tenho certeza que ele vai querer construir uma base política utilizando a base social do 'bolsonarismo' e do ‘lavajatismo’, que foi o capital que ele trouxe para o então candidato Bolsonaro e que fez a diferença quando a eieição ainda não estava vencida", conclui.

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