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Era Bolsonaro ameaça ao Movimento dos Sem Terra

Desde o final da década de 1970, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) tem lutado por uma redistribuição de terras mais justa para os camponeses brasileiros por meio da reforma agrária. Designados como inimigos por Jair Bolsonaro nos últimos anos, o presidente brasileiro qualifica agora esses ativistas como "terroristas".

Os membros dos Trabalhadores Sem-Terra têm tido grandes problemas desde a chegada de Jair Bolsonaro ao poder, que os equipara a "terroristas" (imagem ilustrativa).
Os membros dos Trabalhadores Sem-Terra têm tido grandes problemas desde a chegada de Jair Bolsonaro ao poder, que os equipara a "terroristas" (imagem ilustrativa). AFP Photos/Heuler Andrey
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Sarah Cozzolino, enviada especial a Campinas 

Para entrar no acampamento "Marielle Vive", situado em Valinhos, na periferia de Campinas, deve-se passar por várias barreiras de segurança. Na frente de um portão de madeira colorido, membros do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) controlam as entradas e saídas e verificam a identidade dos habitantes do acampamento.

"Devemos estar sempre atentos, e manter uma certa estratégia de segurança", explica Gerson Oliveira. “Nós não estamos aqui para provocar ou lutar. Mas devemos ser capazes de defender nosso território e as famílias que estão se organizando aqui”.

Gerson Oliveira faz parte da organização do acampamento que começou há pouco mais de um ano, em 14 de abril de 2018, um mês após o assassinato de Marielle Franco. A vereadora do Rio, negra, lésbica e ativista dos direitos humanos, inspirou os ativistas do MST.

Ameaças e armas de fogo

Desde a sua criação, o acampamento, onde vivem cerca de mil famílias, está sob pressão. "Já recebemos ameaças, pessoas que passam e disparam tiros, soltam bombas ou tentar colocar fogo em nosso acampamento. Todos os dias vivemos com esse tipo de situação", diz Gerson, que junto a outro três outros membros do movimento, vive em um velho celeiro.

Na sala mobiliada com objetos de segunda mão, eles dormem, cozinham e se reúnem. "Ainda está chovendo um pouco aqui dentro, então dormimos em barracas para nos proteger do frio e da chuva", diz Kilvin Nicolas. O jovem de 17 anos é gay e lida com questões de minorias sexuais no acampamento.

"Ser LGBT é uma coisa, mas ser LGBT, sem terra, negro e pobre é outra", acrescenta. Temos certeza de que este é o melhor momento para construir nossa união, mas também é um momento de grande violência e incitação ao ódio", analisa.

"Um período de grande medo"

Antes de ser eleito presidente do Brasil em outubro de 2018, Jair Bolsonaro já havia chamado os sem-terra de terroristas e de "criminosos que devem ser mortos". Desde sua eleição, a violência contra esse movimento social se multiplicou.

Membros do MST sofrem as consequências desse discurso de ódio em todo o Brasil e se dizem vítimas de intimidação, agressão e expulsão: "Acho que é um momento de grande medo. É um medo coletivo, não individual”, afirma Kilvin Nicolas. “Antes de 2019, já havíamos registrado algumas mortes, e houve um aumento entre o final do ano passado e este ano", diz.

No resto do acampamento, as moradias são precárias, feitas em madeira e às vezes em concreto, com as poucas ruínas encontradas pelo chão. Era uma antiga fazenda avícola, hoje valorizada por investidores imobiliários.

Uma vida em comunidade

Fernanda de Andrade, ex-empregada doméstica que morava na cidade vizinha, visitou o acampamento há um ano: "Gostei e nunca mais quis sair daqui! Antes, quando assistíamos televisão, pensávamos que era um movimento de vândalos e bandidos. A mídia enviava essa imagem para que as pessoas ficassem contra nós. Mas, na verdade, não tem nada a ver! Aqui todos se ajudam, nós vivemos em comunidade, então tudo isso é mentira!", diz.

Fernanda chegou quando deu à luz a filha, que ela abraça forte em seus braços. Ela estava procurando por uma vida que fizesse sentido. "Apesar das dificuldades, aqui devolvemos o valor à vida, às coisas. Porque quando vivemos na cidade, somos indiferentes: abrimos a torneira, a água sai, lavamos a louça e despejamos. Quando chegamos aqui, mudamos nosso comportamento, começamos a reciclar, para economizar”, descreve a moradora do acampamento. Ao mesmo tempo, o local inclui espaços de formação e educação para crianças, mulheres e pessoas analfabetas.

Uma semana após esta reportagem ter realizado entrevistas no local, um homem de 73 anos, na aula de alfabetização, foi morto em um protesto do MST exigindo água para o acampamento. O motorista de um carro passou por cima da multidão que protestava e o atropelou.

Segundo o presidente do Conselho de Direitos Humanos do Estado de São Paulo, trata-se de outro crime que mostra que o "discurso institucional [de Bolsonaro] autoriza o extermínio de populações em luta por seus direitos" e se reflete na sociedade.

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