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Linha Direta

Ocidente vê com receio encontro entre Putin e Erdogan na Rússia

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Vladimir Putin e Recep Erdogan se encontram nesta terça-feira (9), em São Petersburgo, na Rússia. É a primeira vez que os dois líderes se reúnem desde que as forças aéreas turcas abateram um caça russo em novembro do ano passado, matando dois pilotos russos, e estremecendo a relação entre os dois países. Essa é também a primeira viagem do presidente turco ao estrangeiro desde a tentativa de golpe de Estado na Turquia do dia 15 de julho. O Ocidente vê com bastante receio o encontro entre Putin e Erdogan.

Vladimir Poutin et Recep Tayyip Erdogan durante encontro em Ancara, em 1° de dezembro de 2014.
Vladimir Poutin et Recep Tayyip Erdogan durante encontro em Ancara, em 1° de dezembro de 2014. REUTERS/Mikhail Klimentyev/RIA Novosti/Kremlin
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Sandro Fernandes, correspondente da RFI na Rússia

O Ocidente assiste desconfiado a este encontro entre Putin e Erdogan, a Rússia exibe cautela na reaproximação entre os dois países, mas a Turquia tem feito um esforço pró-ativo pra retomar a boa relação com Moscou.

O Kremlin declarou que os assuntos prioritários do encontro são o conflito sírio e a luta contra o terrorismo. A Turquia tem interesse em restabelecer as relações comercias com a Rússia, já que Ancara é o quinto parceiro comercial de Moscou e o país era o principal destino dos turistas russos. Segundo estatísticas russas, os intercâmbios comerciais bilaterais caíram 43% entre janeiro e maio deste ano. E o número de turistas russos na Turquia caiu 93% comparando junho de 2015 com o último mês de junho.

Depois do incidente da derrubada do avião russo pelas forças aérea turca, a Rússia anulou a isenção de vistos com a Turquia e desaconselhou viagens ao território turco. Moscou também proibiu a importação de alimentos turcos e suspendeu a construção de um gasoduto no Mar Negro e de uma usina nuclear no país.

Reconciliação mais rápida do que o esperado

A crise diplomática entre a Rússia e a Turquia foi bastante intensa, mas a reconciliação começou de repente e está sendo mais rápida do que os especialistas esperavam. Foi a Rússia quem ditou as regras dessa reaproximação. A principal exigência de Moscou era que Erdogan se desculpasse pela derrubada do caça russo em novembro do ano passado.

O líder turco enviou uma carta a Putin, em junho, lamentando o incidente e pedindo desculpas às famílias das vítimas. Erdogan declarou que "o homem que causou a morte do piloto russo está preso e o processo judicial continua". E Ancara parece pronta para discutir o pagamento de indenizações. Esse primeiro passo agradou o Kremlin.

Recentemente, Erdogan citou a viagem à Rússia como “uma visita histórica, um novo começo”. Ele disse que as conversas “com o amigo Vladimir (Putin)” serão importantes para abrir uma nova página nas relações bilaterais entre a Turquia e a Rússia.

Pra retribuir a retórica amigável, Putin também deu um importante passo na reconciliação. O presidente russo foi um dos primeiros chefes de Estado a telefonar para Erdogan e condenar a tentativa de golpe na Turquia. Os líderes ocidentais apoiaram o presidente turco, mas condenaram a repressão que foi e está sendo feita nas semanas pós-tentativa de golpe, contra as dezenas de milhares de pessoas acusadas de apoio ao golpe. A Rússia se limitou a apoiar Erdogan e não criticou a repressão de Ancara contra a oposição.

Desinteresse da Turquia pelo Ocidente?

A aproximação com a Rússia não é um sinal de desinteresse da Turquia pelo Ocidente, mas com certeza é um sinal de descontentamento do governo turco com Bruxelas e Washington.

Em uma matéria recém publicada no jornal francês Le Monde, Erdogan expressou um certo ressentimento com relação ao Ocidente. O presidente turco comparou a solidariedade ocidental com a França depois do massacre de Charlie Hebdo com a solidariedade (ou a falta dela) depois da tentativa de golpe na Turquia. Na entrevista, ele disse que esperava que os líderes ocidentais tivessem reagido com o governo turco da mesma maneira que com o governo francês.

Erdogan também ameaçou cancelar o acordo com a União Europeia a respeito dos refugiados devido à demora da Europa em abolir o regime de visto para os cidadãos turcos. O líder turco disse que “a União Europeia não está se comportando de uma maneira sincera com a Turquia”.

Além disso, Ancara não está em seu melhor momento com os Estados Unidos desde o incidente da tentativa de golpe, já que Erdogan acusa o clérigo turco radicado nos Estados Unidos, Fethullah Gulen, de ter organizado o levante. E se Washington e Bruxelas parecem dar as costas à Turquia, Moscou reaparece de braços abertos.

Turquia pode aderir à Organização para a Cooperação de Xangai

Houve inclusive conversas recentes sobre uma possível adesão turca à Organização para a Cooperação de Xangai e à União Euroasiática, instituições catalisadas pela Rússia. Mas como o agravamento da crise entre os dois países foi muito rápido e forte, representando mudanças muito grandes nos contatos comerciais e diplomáticos, a reaproximação completa ainda vai demorar, mesmo que haja interesse dos dois lados.

É bom a gente lembrar que a Síria continua sendo um nó difícil de desatar na relação entre os dois países. A Turquia defende a saída do presidente Bashar al-Assad, enquanto a Rússia defende o regime sírio, inclusive militarmente. Mas boa vontade há, principalmente do lado turco.

Ancara, por exemplo, desbloqueou há poucos dias o site da agência estatal russa Sputnik. Desde a derrubada do avião russo, a imprensa oficial de Moscou vem publicando diariamente matérias que apontam todos os problemas do governo turco, tendo chegado até mesmo a dizer que o governo de Erdogan é conivente com o autointitulado Estado Islâmico e se beneficia do petróleo barato roubado pela organização terrorista. Apesar da agressiva retórica, a Turquia voltou a permitir que a imprensa estatal russa seja vista e lida no país.

Rússia é mais cautelosa

Do lado russo, há mais cautela. O assessor de política externa de Putin, Yuri Ushakov, disse que “é importante ter uma discussão completa na reunião desta terça-feira e ver as possibilidades de uma maior cooperação”.

Mas Ushakov também disse que o fato de Erdogan ter feito este esforço de vir até São Petersburgo para uma viagem de um dia, apesar da atual situação interna em seu país, mostra que os turcos estão falando sério quando dizem que querem a retomada das boas relações bilaterais.

O Ocidente, por sua vez, vê o encontro entre os dois líderes com receio e preocupação. Em vez de se reunir primeiro com a Otan, organização militar da qual faz parte, Erdogan preferiu ir à Rússia fazer as pazes com Putin.

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