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O Mundo Agora

Só ação militar terrestre pode derrotar grupo Estado Islâmico

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Muito já foi dito e escrito sobre os perigos e inconvenientes das intervenções militares por motivos humanitários. Hoje, já se discute seriamente agregar ao conceito internacional da “responsabilidade DE proteger” a ideia de “responsabilidade AO proteger”. As intervenções no Iraque e na Líbia foram tão catastróficas que Washington e boa parte das potências europeias não querem mais saber de mandar tropas para tentar resolver dramas humanos no exterior. Mas o caso da Síria é também um exemplo dos perigos da não-intervenção. 

Uma intervenção terrestre na Síria se faz cada vez mais necessária.
Uma intervenção terrestre na Síria se faz cada vez mais necessária. REUTERS/Osman Orsal
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É clássica a distinção entre “ética de convicção” e “ética de responsabilidade”. As ONGs humanitárias, as pessoas e instituições com um mínimo sentido de humanidade, não podem ficar de braços cruzados frente aos massacres, torturas, deslocamentos de populações e fome que vêm ocorrendo na Síria. Não agir é profundamente imoral.

Só que dirigentes políticos e especialistas da geopolítica, convocando a ética da responsabilidade, retrucam que uma intervenção militar séria na Síria só poderia agravar a situação e provocar mais mortandade, abrindo o caminho para um regime ainda mais hediondo em Damasco.

Responsabilidade política

É claro que a simples ética de convicção não é suficiente, apesar de que sem ela não haveria ética alguma. Também é evidente que qualquer responsável político deveria se sentir responsável pelas consequências de seus atos. Mas no caso da Síria a escolha americana e europeia de não intervir no conflito já produziu consequências intoleráveis, inclusive do ponto de vista dos realistas da geopolítica.

E o argumento de que uma ingerência nessa guerra vai piorar o sofrimento das populações não faz nenhum sentido diante dos 250.000 mortos, das centenas de milhares de torturados, dos 4 milhões de refugiados que tiveram que abandonar o país e da metade da população síria deslocada. Pior não pode ficar.

Quanto aos resultados políticos, o balanço é catastrófico. Os fanáticos do grupo terrorista auto denominado “Estado Islâmico” (Daech, em árabe) controlam boa parte do Leste e Norte do país, escravizando as populações, massacrando minorias étnicas, destruindo tesouros da humanidade e exportando terror para a Europa, África do Norte, Estados Unidos e até Ásia do Sudeste.

As matanças perpetradas por Daech e pelo regime sírio provocaram uma onda de refugiados que ameaça a estabilidade política da Europa. A ausência de intervenção escancarou um espaço para a transformação de um grupelho terrorista num poderoso quase-Estado, perigoso para o mundo inteiro.

Hoje o consenso é de que só uma ação militar terrestre poderia derrotar o Estado Islâmico, e que só poderia ser feita por forças locais – os curdos sírios e a oposição sunita moderada, laica e islâmica.

Bashar Al-Assad é o problema

O problema é que esses combatentes são o alvo principal dos bombardeios russos e turcos, e que Americanos e Europeus só dão ajuda a conta-gotas. Moscou e muitos responsáveis ocidentais acham que a única solução é contar com o regime de Bashar Al-Assad. Mas Assad é “o” problema. Depois de quatro anos de massacres, o ditador de Damasco não tem mais nenhuma legitimidade fora da sua comunidade alauíta minoritária.

Os sírios sunitas, de longe maioritários, preferem morrer do que voltar ao passado, e o exército do regime praticamente se desmanchou. A atual ofensiva contra Alep está sendo levada por tropas do Hezbolah libanês, do Irã e da Rússia. Resultado: sem ajuda séria, os combatentes da oposição mais moderada estão pouco a pouco se bandeando para os fanáticos do Daech, nem que seja para continuar lutando.

Pensar que tudo vai voltar como dantes e que Assad vai pacificar o país quando ele sempre utilizou o dito “Estado Islâmico” para enfraquecer a oposição, é um sonho de uma noite de verão. Até do ponto de vista geopolítico clássico, a não intervenção é um desastre: ela abriu espaço para a ingerência do Irã, da Turquia, da Arábia Saudita e seus aliados do Golfo e, agora, da Rússia de Putin.

Nem os mais fervorosos adeptos da ética da responsabilidade tem cara para assumir a responsabilidade por resultados tão catastróficos. Nem responsabilidade, nem convicção: pura irresponsabilidade. Daqui a vinte anos, ninguém vai poder justificar a própria covardia argumentando que “não sabia”.

 

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