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Saúde em dia

Colesterol: inimigo interno ou mina de ouro da indústria farmacêutica?

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As estatinas são as drogas mais receitadas da história da medicina e, para alguns cardiologistas, revolucionaram o tratamento das doenças do coração. Para a indústria farmacêutica, nenhum outro tipo de remédio foi mais lucrativo do que as estatinas. Só em 2009, elas somaram 35 bilhões de dólares em vendas, sob a promessa de reduzir as taxas de mau colesterol, ao mesmo tempo em que aumenta o bom colesterol. Mas e se o medicamento estiver baseado numa premissa errada? Se o colesterol não for o vilão que pensamos ser?

Êmbolos de colesterol em uma artéria média do fígado
Êmbolos de colesterol em uma artéria média do fígado wikipédia
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Para o médico e pesquisador dinamarquês Uffe Ravnskov, autor do livro "Cholesterol Myth" (Mito do colesterol, em tradução livre) e diretor da Rede Internacional de Céticos do Colesterol (Thincs, na sigla em inglês), a luta pela redução do colesterol é baseada numa mentira: "Acho que começou com o estudo de Framingham. Eles acompanharam alguns milhares de pessoas durante seis ou sete anos e viram que aqueles que tiveram doenças coronárias tinham o colesterol um pouco mais alto do que os outros. Assim, eles concluíram que a doença coronária era causada pelo colesterol alto. Não é possível chegar a essa conclusão", conta o professor.

Ravnskov observa, no entanto, que esse estudo continuou acompanhando os indivíduos por 25 ou 30 anos: "Eles descobriram que aqueles cujas taxas de colesterol recuaram nestes anos morreram mais do coração do que os outros, cujas taxas se mantiveram estáveis ou mesmo aumentaram. Esse estudo é ignorado pela maioria dos especialistas. Eles não o mencionam. E quando o fazem - ele foi citado em um artigo da Associação Americana do Coração -, eles mentem. Eles dizem que quem teve doenças do coração tinham maior colesterol que os outros. E era o contrário".

Para o Dr. Raul Dias, diretor da Unidade Clínica de Lípides do Incor, o Instituto do Coração em São Paulo, o risco do colesterol não pode ser menosprezado: "Desde os anos 50, já se suspeitava que o excesso de colesterol poderia levar aos problemas cardiovasculares", afirma, acrescentando que "pelo menos 17 prêmios Nobel de medicina foram atribuídos aos estudos do colesterol".

De acordo com ele, mais de 900 mil pessoas foram analisadas em pesquisas que buscavam associações entre infartos do miocárdio e taxas de colesterol: "Foram estudos prospectivos, que seguiram esses pacientes durante muitos anos, o número de desfechos foram mais de 60 mil mortes por doença isquêmica do coração, que mostram que, à medida em que o colesterol sobe, aumenta o risco de morte por um infarto do miocárdio".

Dias admite que níveis baixos de colesterol podem estar associados ao aparecimento de câncer. Mas ele garante que a relação não é causal: "Reduzir o colesterol não aumenta o câncer. Isso é provado em estudos experimentais em animais e em estudos com humanos". Para ele, a mais provável explicação para esse fato é que, reduzido o risco de infarto, que é a principal causa de mortes, as pessoas acabam morrendo da segunda maior causa, o câncer.

Ravnskov defende exatamente o contrário, que essa relação é causal, já que o colesterol é um mecanismo de defesa: "Lipoproteínas e o LDL, chamado de mau colesterol, podem se anexar a todo tipo de bactérias e vírus, neutralizando-os. No longo prazo, se você reduz excessivamente o colesterol por meio do tratamento com estatinas, há um grande risco de desenvolver câncer, doenças infecciosas, problemas musculares, cegueira, diabetes, distúrbios mentais... Esses efeitos colaterais são minimizados pelas companhias farmacêuticas. Por exemplo, em um dos primeiros experimentos com estatinas, houve aumento de câncer de pele estatisticamente significativo. Depois destes testes terem sido publicados, todos os diretores de testes passaram a evitar mencionar as ocorrências de câncer de pele".

Lobby farmacêutico

O phD dinamarquês acredita que o combustível dessa corrida pela redução do colesterol são os interesses de grandes corporações: "Quase todos os pesquisadores nesta área, a maioria dos professores de cardiologia, são pagos pela indústria farmacêutica, que também dá muito dinheiro às publicações médicas. A maioria destas publicações é economicamente dependente da indústria farmacêutica. E os fabricantes de margarina e óleo vegetal ganham muito dinheiro porque aprendemos que a gordura saturada é perigosa. Não há nenhum estudo que comprove isso. Pelo contrário, a gordura poliinsaturada, como a que chamamos Omega 6, presente em diversos tipos de óleos vegetais, é que é cancerígena".

Para Raul Dias, a ideia de complô entre pesquisadores e indústria farmacêutica é "teoria da conspiração". Ele defende que a grande razão pela qual os estudos são patrocinados pela indústria é o fato de que "nenhum governo do mundo teria dinheiro suficiente para bancar os estudos clínicos que são realizados na medicina atualmente". Dias confia no sistema de fiscalização destes estudos, que envolve as agências reguladoras governamentais, especialistas da comunidade acadêmica e os conselhos das revistas científicas.

Não se pode ignorar, no entanto, o fato de que a indústria farmacêutica é a que mais investe em atividades de lobby - entre 1998 e 2014, foram US$ 2,9 bilhões, só nos Estados Unidos - e está entre as recordistas de doações de campanha. De acordo com a ONG DrugWatch, foram US$ 15 milhões entre 2013 e 2014. Quem investe quer retorno.

 

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