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O Mundo Agora

Em crise, China quer mostrar poder bélico com parada militar megalômana

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Tentar tapar o sol com peneira não é uma boa ideia. A economia da China não anda bem das pernas e não é só a economia mundial que começa a sentir o tranco. Mais grave são as conseqüências internas. Sem um crescimento econômico forte e permanente, o Partido Comunista não vai segurar a frustração de centenas de milhões de chineses que saíram da miséria nos últimos vinte anos e que não estão a fim de voltar atrás. Acossado, o presidente Xi Jinping inventou uma peneira: uma megalômana parada militar para celebrar a capitulação do Japão na Segunda Guerra Mundial.

Outdoor com a imagem do presidente chinês Xi Jinping é visto durante desfile militar com soldados do Exército de Libertação Popular da China, em comemoração ao 70º aniversário do fim da Segunda Guerra Mundial.22/08/15
Outdoor com a imagem do presidente chinês Xi Jinping é visto durante desfile militar com soldados do Exército de Libertação Popular da China, em comemoração ao 70º aniversário do fim da Segunda Guerra Mundial.22/08/15 REUTERS/Damir Sagolj
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Claro, a China sempre teve paradas militares. Mas só se desfilava para comemorar a tomada de poder pelo Partido Comunista. A celebração da vitória contra o imperialismo japonês foi sempre meio escondida pela simples razão que a China da época era comandada pelos nacionalistas do Kuomintang de Chiang Kai Chek, derrubados pelos comunistas em 1949, depois de três anos de guerra civil.

Mas quando as coisas vão mal, os regimes autoritários sempre apelam para as exaltações nacionalistas. A ideia é fazer uma demonstração de força, nos velhos moldes estalinianos, para convencer os cidadãos de que a situação interna e externa do pais está perfeitamente sob controle e que está na hora de cerrar fileiras em torno do Partido, o demiurgo que está transformando a China em potência global. O sinal de que essa campanha nacionalista virou prioridade absoluta é que Pequim decidiu reconhecer oficialmente a contribuição dos soldados do Kuomintang à derrota japonesa.

O desfile militar da próxima quinta-feira (3) será grandioso com 12.000 soldados na rua, uns 200 aviões de combate, uma batelada de tanques, canhões e mísseis modernos, inclusive nucleares. Xi Jinping mandou parar as fábricas da capital para evitar a poluição, fechar qualquer comércio no caminho do desfile e mobilizou 850.000 cidadãos para policiar todas as ruas e becos da cidade. O Estado-Maior já anunciou os armamentos mais modernos e sofisticados do arsenal chinês, fabricados na própria China. Tudo bem organizadinho para impressionar o país inteiro... e também eventuais futuros compradores de material bélico chinês – hoje a China já se tornou o terceiro maior exportador de armas do mundo.

Na verdade, os especialistas ocidentais não contam com nenhuma grande surpresa. Praticamente todos os novos armamentos chineses são conhecidos. E tanto a indústria de armas quanto o material na ativa e a organização das forças armadas chinesas ainda estão bastante atrasadas com relação aos Estados Unidos e os seus aliados ocidentais.

A parada de Pequim é muito mais para consumo interno do que para o resto do mundo. Só Vladimir Putin e os países extremamente dependentes das relações com os chineses vão mandar delegações de alto nível para assistir ao evento. O resto só enviará os “sub” ou os “sub do sub”. Aliás, as autoridades chinesas já avisaram que o mega-desfile não era para ameaçar ninguém.

O problema é que essas demonstrações marciais ultra-nacionalistas para chinês ver também mandam um recado inquietador para toda a vizinhança – queiram ou não. Claro, o Japão não acha a mínima graça. Não só porque lembra o imperialismo japonês, mas também por causa das tensões entre os dois países que reivindicam as ilhas Senkaku. A Índia e o Vietnam que têm conflitos territoriais com o grande vizinho e que já tiveram de enfrentar o exército e a marinha chineses, também não estão gostando. Sem falar em vários estados do Sudeste Asiático submetidos às provocações e à arrogância chinesas no mar da China meridional.

 Mais uma vez, como sempre com os regimes autoritários, essa tentativa de mostrar os dentes militares e criar histerias nacionalistas internas acaba saindo pela culatra. Para fora, isso vem criar desconfiança em boa parte do planeta e reforça uma frente anti-chinesa na vizinhança. Para dentro, só serve como pretexto para continuar a ofensiva para acabar com as poucas liberdades ainda remanescentes no país e para centralizar ainda mais o poder autoritário do Partido Comunista e do próprio presidente. Não é assim que a China vai conseguir fazer as reformas necessárias para sair do buraco em que se meteu.

 

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