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Linha Direta

Ameaça terrorista obriga Japão a repensar no papel de “país pacifista”

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O assassinato de dois japoneses nas duas últimas semanas por membros do grupo extremista Estado Islâmico forçou o Japão a encarar uma nova realidade. Desde o fim da Segunda Guerra Mundial, o país teve uma atuação internacional limitada a ajudas humanitárias. Mas agora, o primeiro-ministro Shinzo Abe quer acabar com os princípios pacifistas e usar a força militar, se necessário, para garantir a segurança dos japoneses.

Nas ruas de Tóquio pode-se ver o rosto do japonês Kenji Goto, executado pelo Grupo EI.  1°de fevereiro de 2015.
Nas ruas de Tóquio pode-se ver o rosto do japonês Kenji Goto, executado pelo Grupo EI. 1°de fevereiro de 2015. REUTERS/Yuya Shino
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Ewerthon Tobace, correspondente da RFI Brasil em Tóquio

A crise com reféns na Síria serviu de plataforma para o primeiro-ministro Shinzo Abe pressionar o Parlamento a aprovar as mudanças na Constituição pacifista do país, assinada em 1947.

A autodefesa coletiva estava limitada até agora pelo artigo 9 da Constituição japonesa, que impede ao país o uso da força para resolver conflitos internacionais. Mas agora, depois de o Estado Islâmico ter anunciado a execução de Haruna Yukawa e do jornalista Kenji Goto, o primeiro-ministro japonês defendeu a realização de operações militares no exterior para resgatar cidadãos japoneses. Shinzo Abe disse que “não se deveriam aplicar considerações geográficas” no exercício da chamada autodefesa coletiva, que consiste por enquanto apenas em apoiar as tropas aliadas no caso de serem atacadas. Esta seria a principal alteração na reinterpretação da Constituição pacifista do Japão e que deverá, muito provavelmente, ser aprovada pelo Parlamento este ano.

Abe e reação furiosa

Promessas de vingança são comuns no Ocidente. Mas esta é a primeira vez, desde o fim da Segunda Guerra Mundial, que um líder japonês expressa tão fortes palavras. O ex-ministro da Defesa, Akihisa Nagashima, postou no Twitter que “o Japão nunca viu antes esse tipo de reação na sua diplomacia” e questiona se Abe realmente quer levar adiante o que prometeu publicamente. A posição extremamente forte de Abe, que prometeu trabalhar com outros países para fazer os terroristas pagarem por seus crimes, surpreendeu até os especialistas em Oriente Médio. Só para entendermos os fatos, esta crise com reféns começou depois que o primeiro-ministro anunciou, no mês passado, uma ajuda humanitária de 200 milhões de dólares para os países que lutam contra o Estado Islâmico. Até então, o Japão não estava diretamente envolvido nos esforços para combater o grupo terrorista. Esse valor, considerado quase que uma esmola pelos críticos do governo, foi o suficiente para desencadear todo o problema e jogar o país na linha de frente dos alvos terroristas. O mundo vê o Japão agora com outros olhos e o país não pode mais ser considerado um lugar tranquilo e imune aos atos de violência terrorista experimentados pelos Estados Unidos e seus aliados.

Medidas de segurança

O primeiro-ministro já anunciou o reforço das medidas de segurança interna e também no exterior, para garantir a proteção aos cidadãos japoneses. Os aeroportos, estações de trem, pontos turísticos e principais prédios e instalações no país já ganharam reforço na segurança.

População em estado de choque

No começo, quando os terroristas negociavam a troca dos reféns, a população estava dividida. Além da corrente pela libertação dos compatriotas, houve também vozes, inclusive na mídia, que culpavam os dois japoneses presos pelo Estado Islâmico de terem se aventurado por conta própria em um território sabido perigoso e, em consequência disto, terem colocado a vida de outros japoneses em perigo.

Ainda em choque com o destino cruel sofrido pelos dois reféns, os japoneses mostram agora uma tendência a querer se isolar mais do resto do mundo, segundo têm mostrado as pesquisas de opinião pública. Isso, com certeza, vai dificultar um pouco os sonhos de Abe de acabar com a Constituição pacifista e de tirar o Japão do banco de trás, fazendo o país desempenhar um papel mais importante no mundo.

O que se percebe, no entanto, é que a maioria da população parece não se importar tanto em ficar com o gosto amargo da derrota e prefere que as ameaças de violência desapareçam tão rapidamente como chegaram.
 

 

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