Desde outubro, ao cair da noite de cada segunda-feira, um número cada vez maior de alemães se dirige para o centro da cidade de Dresden para protestar contra o que consideram uma invasão islâmica na Alemanha. A última manifestação, nesta semana, reuniu um recorde de 18 mil pessoas, acendendo um alerta sobre o futuro do movimento, que se repete em outras cidades do país.
A mobilização se intitula “Europeus Patriotas contra a Islamisação do Ocidente”, mas atende pela sigla Pegida. Os organizadores do protesto pertencem a grupos minoritários de extrema-direita, que promovem as manifestações pelas redes sociais.
Mas, ao contrário dos movimentos neonazistas, o Pegida atrai cidadãos comuns, receosos do aumento do número de imigrantes de confissão muçulmana, a maioria turcos. Eu considerei esse movimento preocupante desde o início, porque ele não é neonazista nem fascista, de uma maneira caricata. É um movimento cidadão, que exprime um medo, um pavor de um fenômeno que, comparado com outros países, é bem menor na Alemanha”, afirma Gilbert Casasus, professor de Estudos Europeus da Universidade de Friburgo, na Suíça, e especialista na direita alemã.
Histórico
Casasus lembra que Dresden fica na Saxônia, uma região semi-rural, de classe média e maioria protestante. Nesta parte da Alemanha, mas também na região central, de Hamburgo a Hanover, além do norte da Baviera, o nazismo encontrou mais facilidade em se disseminar nos anos 1930. A herança ajuda a explicar o contexto atual, na opinião do especialista. “Essas regiões são um campo favorável para essas ideias, na medida em que lá existe uma tradição histórica que contribui para a emergência desses movimentos.”
O pesquisador destaca que, com o trauma da Segunda Guerra, até hoje a Alemanha não possui um partido forte de extrema-direita. No ano passado, o partido de direita populista AFD, contrário à União Europeia, conseguiu eleger os primeiros deputados.
Weiner Zettelmeier, pesquisador do Centro de Informação e Pesquisa sobre a Alemanha Contemporânea da Universidade de Cergy-Pontoise, observa que a chamada islamofobia ainda não entrou no discurso político alemão, ao contrário do que ocorre nos vizinhos europeus.
“Dentro deste partido populista, há os que querem ocupar o terreno com esse argumento contra a imigração. Mas não há um verdadeiro partido de extrema-direita bem-estruturado. O mais perto é o NPD, que é mais clássico e não representa um perigo real”, explica. “Por enquanto, esse medo, essa angústia de alguns alemães se exprime através de movimentos espontâneos, nos quais a direita populista tenta ter um papel. Mas ela faz isso sem se mostrar abertamente, afinal ela sabe perfeitamente que, se esse fosse o caso, ela perderia influência no plano nacional.”
Reação
Ao mesmo tempo em que o Pegida cresce, levando a chanceler Angela Merkel a condená-lo, manifestações contrárias ao movimento islamofóbico ganham força em todo o país. Na última segunda-feira, 5 mil alemães foram às ruas de Berlim para reagir à manifestação do Pegida, que reunia 300 pessoas na capital, no mesmo momento.
“É reconfortante ver que, diante desse movimento de extrema-direita populista, também tem ainda mais gente que se levanta e diz que ‘não vamos deixar espaço para eles’. Se por um lado há preocupação, por outro há segurança, porque a democracia está bem defendida”, comenta Zettelmeier.
Livros polêmicos
Enquanto isso, na França, a publicação de duas obras polêmicas sobre o espaço dos muçulmanos na sociedade intensificou o debate sobre o tema. Para Gilbert Casasus, o novo romance de Michel Houellebecq, Soumission (Submissão, em tradução livre), e principalmente Le suicide français (O Suicídio Francês, em tradução livre), do escritor e jornalista Eric Zemmour, acabam servindo de munição para os extremistas.
“O sucesso do livro de Eric Zemmour é problemático e suscita muitas questões, porque vimos muitos excessos ideológicos na obra dele. E nós sabemos muito bem que os excessos ideológicos são apropriados por grupos políticos”, adverte. “Não podemos jamais esquecer, e com isso voltamos à Alemanha, que o nazismo não nasceu do nada. Um movimento intelectual antidemocrático foi criado na República de Weimar e ele forjou, em parte, o nazismo.”
Uma manifestação contra os muçulmanos está marcada para acontecer em Paris no próximo dia 18 de janeiro. O fundador do grupo Riposte Laïque (“resposta laica”), Pierre Cassen, elogia o movimento alemão.
“Nós vemos a preocupação legítima de um povo que percebe que, de alguma maneira, as suas tradições e culturas estão sendo questionadas por uma população que vem de fora. Na França, nós queremos que o nosso protesto seja o início de uma grande mobilização contra a islamização da França; um movimento que aconteça em todas as regiões do país”, argumenta.
A última manifestação desse grupo contrário à imigração de muçulmanos na França ocorreu em março do ano passado e reuniu 1.000 pessoas.
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