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Fato em Foco

Proibições de Uber refletem desafio de integrar aplicativos à economia tradicional

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Alemanha, Espanha, Holanda, Índia, Tailândia. Aonde chega, o aplicativo Uber provoca polêmica, principalmente a ira das entidades de motoristas profissionais. A batalha reflete a dificuldade de o mercado tradicional absorver a chamada “economia de compartilhamento” - que, segundo especialistas, chegou para ficar.  

Aplicativo coloca passageiros diretamente em contato com motoristas, que não são regulamentados.
Aplicativo coloca passageiros diretamente em contato com motoristas, que não são regulamentados. Joerg Carstensen/dpa/AFP
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O uso de ferramentas digitais para serviços que sempre foram regulamentados, como transporte e hotelaria, está em plena expansão. O Uber permite chamar um motorista com carro de luxo sem taxas, um fenômeno que já conquistou milhões de usuários em 250 cidades do mundo. O aplicativo chegou neste ano ao Brasil, onde as restrições não devem demorar a aparecer, na opinião de Gil Giardelli, professor de Inovação Digital da ESPM de São Paulo.

“Os órgãos governamentais, tanto municipais, estaduais ou federal, estão se posicionando e, na maioria das vezes, são contra. O Uber marca o início do fim da chamada era da escassez, do pensamento industrial. Estamos migrando para a era da abundância, que é o pensamento em rede”, explica. “Em um mundo de 7 bilhões de pessoas, os governos não conseguem atender às demandas, gerando um mal-estar em todos os sentidos. Os chamados ‘precariados’ reclamam do transporte, da saúde, porque os governos não conseguem suprir a inovação e as necessidades dessas pessoas.”

A pesquisadora em economia colaborativa e redes digitais Dora Kaufmann, da USP, destaca que os criadores de aplicativos como o Uber ou o Airbnb, de aluguel de apartamentos, souberam identificar uma demanda latente na sociedade – e é um engano achar que vai ser possível barrar esse processo. No Brasil, um país que tem a socialização como um dos traços culturais mais marcantes, os aplicativos são absorvidos com facilidade por todas as camadas da população.

“Para um aplicativo ter sucesso, ele precisa atender a uma demanda da sociedade, mesmo que seja inconsciente. Se ele atende e for bem estruturado e fácil, ele explode”, comenta. “Todos esses aplicativos de chamar táxi são muito simples de operar. Eles simplificam a vida das pessoas.”

Tendência antiga

Giardelli lembra que o gosto pelo compartilhamento não é de hoje. Primeiro, foram os livros, depois as roupas, e hoje chegam a bancos e moedas “sociais”. Para ele, essa característica vai marcar cada vez mais o DNA dos negócios.

“Hoje em dia, ser jovem não tem nada a ver com idade – tem a ver com como você encara as mudanças. Esses ‘jovens’ estão se reunindo no mundo inteiro e mudando indústrias, mudando a forma de transporte e tantas outras áreas”, afirma.

O impacto das tecnologias está apenas no começo, segundo o professor. Ele cita o exemplo de testes feitos com um caminhão sem motorista, que já dirigiu 15 mil quilômetros em estradas europeias. No Japão, um famoso banco contratou 28 mil robôs para substituir gerentes de contas. “Ou seja, muito em breve, nós teremos um desemprego tecnológico de motoristas de caminhões e bancários. Mas é pergunta é: isso vai acabar com o emprego dessas pessoas? De forma alguma. Vão acabar aqueles empregos enfadonhos de carimbar cheque devolvido. Vão acabar os trabalhos que não despertam o melhor da humanidade, que é o lado intelectual.”

Capacidade de adaptação

Diante da rapidez das mudanças, a maioria das empresas tradicionais ainda tenta encontrar um caminho para melhor se relacionar com os consumidores. A transição para uma nova economia está em plena expansão, conforme Kaufmann.

“De uma forma geral, as empresas ainda estão muito confusas sobre como lidar com esse novo ambiente e esse novo consumidor, usuário de redes. É uma situação fascinante, porque são novos paradigmas que têm que ser construídos, em tão pouco tempo”, sublinha. “Eu acho um privilégio estarmos vivendo este momento.”

A pesquisadora destaca que, assim como a economia tradicional obedece a regras e tributações, impostas a toda a sociedade, a era digital também precisa se adequar, em moldes que ainda estão sendo definidos. “Virou um negócio com gente ganhando dinheiro, portanto é preciso pagar impostos, ser regulado, ter regras. A discussão é como a gente insere todos esses novos modelos de negócios dentro da sociedade, e não tentar eliminá-los, que será uma batalha perdida.”

Novo modelo passa por flexibilidade

Por enquanto, o debate é marcado pela proteção das categorias profissionais contra a expansão desenfreada dos serviços oferecidos pelas redes digitais. O impasse só vai se resolver quando houver mais flexibilidade, ressalta Giardelli.

“Para organizar essa bagunça, tem de ter predisposição de todos os lados: os que defendem uma profissão secular e os que representam outras profissões que estão surgindo. Está faltando mais equilíbrio na hora das discussões”, constata.

No caso do Uber, um dos pontos a serem debatidos é a segurança. Na semana passada, um motorista foi preso em Nova Délhi após estuprar uma passageira, levando à proibição do aplicativo na capital indiana.
 

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