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O Mundo Agora

Racismo é um dos sentimentos mais partilhados do universo

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A onda de execuções de negros por policiais brancos nos Estados Unidos é mais uma manifestação do racismo entranhado na sociedade americana. Pior ainda, é o fato de que os tribunais americanos absolvem sistematicamente os policiais e às vezes nem os processam. Eleger um presidente mulato – que nos Estados Unidos é considerado negro – está longe de ter acabado com as discriminações. O próprio Obama que o diga. 

Refugiados da minoria curda iraquiana yazidi, cristãos perseguidos que fogem do "Estado Islâmico" na  provincia iraquiana de Dohuk.
Refugiados da minoria curda iraquiana yazidi, cristãos perseguidos que fogem do "Estado Islâmico" na provincia iraquiana de Dohuk. REUTERS/Youssef Boudlal
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Só que os americanos não tem o monopólio do racismo. Até no nosso antropofágico e mestiço Pindorama, a grande maioria da população do nosso horroroso sistema penitenciário é negra.

A França está em estado de choque depois da agressão de um casal e o estupro da mulher só porque eram judeus. O antissemitismo tem uma longa tradição que agora está se combinando com o ódio aos judeus de uma parte da juventude de origem árabe que, por sua vez, é vitima de exclusões e violências policiais indiscriminadas. Sem falar no antissemitismo explícito de movimentos que defendem a dignidade negra. É: a cada um seu saco de pancadas. Hoje, na Europa, com a crise econômica, os partidos e movimentos racistas, xenófobos e chauvinistas andam de vento em popa.

Mas os problemas não vêm só dos “branquelas” das ex-potências coloniais. No resto do mundo, a situação é até pior.

Na África, guerras e massacres étnicos são corriqueiros. No Oriente Médio, o ódio comunitário se mistura com a violência religiosa e o fanatismo sangrento numa explosão de crimes contra a humanidade. Na Índia, os fundamentalistas hinduístas só pensam em exterminar os muçulmanos, e as autoridades han chinesas estão esmagando qualquer expressão das populações autóctones no Tibete ou do Xing Kiang. O Japão é incapaz de viver tranquilamente com os imigrantes coreanos e a Rússia de Putin fica atiçando o rancor das minorias pró-russas para desestabilizar os países vizinhos. E por aí vai: o racismo é um dos sentimentos mais partilhados e instrumentalizados no universo.

A questão, portanto, não é condenar essa praga com argumentos morais. Claro, é sempre necessário proclamar e repetir de maneira permanente que o racismo e a xenofobia são absolutamente incompatíveis com a vida civilizada e com todos os valores do ser humano. Mas pelo visto, isso não basta nem nunca bastou. Combater esse flagelo tão bem distribuído pelo mundo e pela sociedade requer instituições fortes, um estado de direito que defenda os cidadãos, e políticos e líderes corajosos decididos a enfrentar de cara a perversidade desses populismos macabros.

É claro que toda sociedade se constrói designando bodes expiatórios. E que, em períodos de crise, sempre tenta jogar a culpa num “outro” visto como responsável por todas as nossas mazelas.

Na América Latina, terra de exponencial violência urbana e de guerras civis sem fim, o culpado é sempre o “imperialismo americano”, cômodo pretexto para tirar o corpo fora de qualquer responsabilidade. Na África é o neo-colonialismo e não as cleptocracias no poder, e na Ásia há sempre um vizinho para odiar e se preparar para a guerra.

Para tentar marginalizar essa cultura do bode expiatório é preciso conclamar que crime é crime, seja ele de origem racista, xenófoba ou simplesmente crapuloso. E contra o crime existem leis que devem ser aplicadas. Argumentar que assassinar, torturar, estuprar por motivos racistas é mais grave do que por puro ódio ou ganância é uma maneira de reduzir a responsabilidade do criminoso comum e do ato criminoso em si.

O crime hediondo “comum” tem que ser julgado e punido com a mesma severidade que o crime hediondo racista. Senão, é o estado de direito que acaba sendo fagocitado pela lógica racista: o policial branco que matou o jovem negro em Ferguson só pode ou ser absolvido, porque a justiça tem um viés racista, ou condenado a uma pena mais dura do que um assassino comum por um júri anti-racista que se determina também por esse motivo. Nada disso reforça a lei e a necessidade de aprimorar ainda mais o funcionamento da Justiça e a sua imparcialidade. Denunciar o racismo e todo tipo de discriminação é absolutamente necessário, mas ter peito e vontade para aplicar seriamente a lei e o estado de direito também.

 

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