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Votos brancos e nulos permitiram eleição de Congresso mais conservador

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O alto índice de votos brancos e nulos e as abstenções possibilitaram a eleição de um Congresso mais conservador no Brasil. Para especialistas, o desinteresse pela política e a desinformação do eleitorado sobre as propostas dos candidatos explicam o reforço do número de parlamentares identificados com a direita.

Os candidatos Marco Feliciano, do PSC, e Jair Bolsonaro, do PP, foram reeleitos deputados federais.
Os candidatos Marco Feliciano, do PSC, e Jair Bolsonaro, do PP, foram reeleitos deputados federais. Lucio Bernardo Jr.-Câmara dos Deputados / Divulgação
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Segundo levantamento do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), cerca de 60 deputados de partidos de esquerda e centro-esquerda cederam espaço para eleitos de centro-direita e direita, um grupo que também teve um perfil conservador acentuado.

O PT perdeu 18 cadeiras. A chamada bancada evangélica passou de 71 para 82 deputados, enquanto a policial, também apelidada de “bancada da bala”, pode ter mais de 50 representantes. Os ruralistas completam o cenário e agora serão 70, em vez dos atuais 60 congressistas. No total, são 513 parlamentares.

O diretor de documentação da Diap, Antônio Augusto Queiroz, avalia que os eleitores se deixam convencer facilmente por promessas vagas dos candidatos. “As pessoas estão inconformadas com tudo o que está aí, querem mudanças, e identificam como os capazes de fazer essas mudanças os candidatos com um perfil messiânico e populista, que fazem um discurso moralista contra a corrupção ou a violência”, afirma. “Com base nisso, o eleitor acha que esse candidato é um cidadão moderno, que vai defender mais saúde e educação. Mas, na verdade, em geral é exatamente o contrário.”

A cientista política Sônia Fleury, da Fundação Getúlio Vargas (FGV), lembra que o número de pessoas que não participaram da votação ou invalidaram o voto chegou a 38,7 milhões, superior à votação do segundo colocado no pleito, Aécio Neves, que teve 34,8 milhões de votos. “Eu acho que houve um repúdio muito grande da população em relação ao sistema eleitoral e partidário. O resultado é esse: você vai para a rua, reclama e depois não vai votar ou não participa da política eleitoral, sem perceber que, desta forma, está elegendo o Congresso mais conservador da nossa democracia.”

Decepção

Para a especialista, o resultado das eleições para o Congresso não reflete a sociedade brasileira – e sim um momento de profunda desilusão da população com a política. “No Rio de Janeiro, os dois candidatos mais votados vêm de campos opostos. Um vem da chamada ‘bancada da bala’, o Jair Bolsonaro, que defende que bandido bom é bandido morto. O outro é o Marcelo Freixo, de esquerda, que luta contra qualquer tipo de arbitrariedade”, destaca. “É uma polarização muito grande da sociedade. O conservadorismo tem crescido, mas acho que esse resultado é um reflexo de todas as pessoas que estão desiludidas com o sistema.”

Diante do novo perfil da Câmara e do Senado, as pautas mais progressistas devem ser prejudicadas. “Há uma lista enorme de temas que são prioritários para área de direitos humanos e que essas novas bancadas vão fazer um enfrentamento para evitar que avancem. A união homoafetiva é um tema que eles contestam de uma forma muito contundente”, ressalta Queiroz. “A questão do aborto, da descriminalização da maconha, o uso de células-tronco, a redução da maioridade penal, o estatuto do desarmamento são outros exemplos.”

Julian Ribeiro, membro do Conselho Consultivo da Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis e Transexuais, está preocupado com o futuro. Ele observa que a bancada conservadora agora está fragmentada em vários partidos.

“Foram eleitos muitos apresentadores de TV daqueles programas policiais, que fazem apologia da violência, cantores, militares e ex-militares, pastores. Houve um tsunami conservador – tanto que o Aécio Neves aumentou a sua votação e o PT foi mal em vários Estados”, constata. “É um quadro preocupante para os direitos humanos, inclusive porque deputados e deputadas ligados a essas causas foram derrotados na votação.”

Retrocessos

As organizações de defesa de direitos humanos temem não apenas o bloqueio nos avanços nas questões morais e comportamentais, como o retrocesso em alguns projetos. É o caso do projeto de assistência a mulheres estupradas, que poderia ser derrubado, segundo Sônia Coelho, da Semprevida Organização Feminista.

“É apenas um atendimento humanitário: se você foi estuprada, você recebe atendimento médico e psicológico, toma contraceptivo para não engravidar do estuprador, toma um coquetel anti-aids, e tem um encaminhamento adequado caso o crime resulte em uma gravidez indesejada”, explica. “Esse é o projeto de atendimento sancionado pela presidente Dilma e que esses retrógrados conservadores querem reverter.”

Sônia lembra que a bancada evangélica também deseja transformar o aborto em crime hediondo, passível de prisão.

 

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