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Primeira Guerra completa 100 anos e deixa heranças até hoje

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Há 100 anos, o império austro-húngaro declarava guerra à Sérvia, o ápice de tensão por todos os lados na Europa que resultou na Primeira Guerra Mundial. O mundo lembra hoje do conflito, essencial para compreender o século 20 e que também ajuda a explicar focos de impasses que permanecem, principalmente nos Bálcãs, onde a Grande Guerra se iniciou.

Soldados canadenses nas trincheiras na França, em 1916.
Soldados canadenses nas trincheiras na França, em 1916. Getty Images/Hulton Archive
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O assassinato do herdeiro do trono autro-húngaro Franz Ferdinand em Sarajevo, por um nacionalista sérvio, foi a desculpa para a declaração de guerra, após meses de provocações entre o que hoje são a Alemanha, a Rússia, a França e a Áustria. Um século depois, uma das principais lições que ficam do violento confronto é a evolução da diplomacia – que naquela época foi incapaz de evitar o enfrentamento, como destaca o historiador Joseph Zimet, diretor-geral da Missão do Centenário na França.

“Havia uma rivalidade entre o império Austro-húngaro e a Rússia, protetora da Sérvia, para dividirem os restos do império otomano. A literatura recente mostra o fracasso dos políticos e dos diplomatas para gerenciar uma crise que poderia ter sido local”, observa. “Mas a história também mostra que neste aspecto nós progredimos muito. Graças às nossas instituições regionais e internacionais, nós sabemos gerenciar e avaliar melhor os riscos de conflitos na Europa e nas margens da Europa. Houve aprendizados incontestáveis.”

Duas novas potências

Além de ter sido um dos confrontos que mais causaram vítimas na história, a Primeira Guerra Mundial marcou uma reviravolta na geopolítica do planeta, com o fim dos impérios e a emergência de duas grandes potências, como lembra o historiador Jean-Yves Le Naour, autor de diversas obras sobre o tema.

“Nós podemos considerar a Primeira Guerra Mundial como a matriz do século 20. Vemos o aparecimento da potência americana em 1917, que já era a principal potência industrial em 1914, mas ainda não tinha um peso político”, aponta. “E com a revolução bolchevique, tem o aparecimento do comunismo e da União Soviética, o segundo gigante. Eles apagam a Europa nas décadas seguintes, que começa a se suicidar no final da Primeira Guerra e termina de morrer na Segunda Guerra, deixando o espaço para o enfrentamento russo-americano.”

Crise leva ao nacionalismo – de novo

Le Naour ressalta que, ao final da Primeira Guerra e ao longo da década de 1920, os europeus tentavam se reconstruir após quatro anos de destruição. Até que a crise econômica de 1929 acirrou o clima de desesperança e, na Alemanha, reascendeu os sentimentos nacionalistas.

“No final dos anos 20, as coisas estavam se acalmando e o Partido Nazista tinha 3,5% dos votos na Alemanha, em 1928. E em 1933, ele consegue 11 milhões de votos. O que aconteceu entre essas duas datas? A crise econômica de 29, durante a qual Hitler e os nacionalistas alemães apareceram como as soluções diante das dificuldades das democracias. Como hoje, de certa forma”, afirma. “O nacionalismo não morreu. É muito contraditório”, lamenta, em referência ao aumento do apoio a partidos extremistas na Europa nos últimos anos, após a crise iniciada em 2008.

Tensão constante nos Bálcãs

Nos Bálcãs, onde uma variedade de etnias, religiões e povos tenta conviver em uma paz frágil há muitos séculos, o centenário da Primeira Guerra esquentou as tensões entre bósnios e sérvios.

“Quando você olha o mapa múndi hoje, você ainda vê antagonismos, conflitos, fraturas. Em Sarajevo, é impressionante constatar que as tensões de um século atrás continuam. Na Iugoslávia, ainda vemos a influência da Áustria e da Turquia”, destaca. “São as mesmas forças que atuam ali. As mesmas placas tectônicas das civilizações, das culturas e das religiões se misturam mas também se chocam, algo que talvez hoje seja preciso gerenciar com mais cuidado.”

Nos últimos meses, os ânimos também se acirraram entre a Rússia e a Europa ocidental, com a crise na Ucrânia. Mas o especialista em história comparada Karl Schurster, professor da Universidade Estadual de Pernambuco, avalia que uma nova guerra mundial é muito improvável de acontecer, não só hoje como a longo prazo.

“Eu acho que isso vai ficar sempre no âmbito bilateral, de país para país, e não haveria um conflito que mobilizaria tropas de uma quantidade grande de países, principalmente no caso da Europa, que vive uma questão central de queda populacional e uma dura crise econômica”, sublinha. “O território europeu também ficou extremamente limitado, porque não possui mais colônias, como tinha no passado. Eu acho que por mais que o conflito seja muito evidente, com as intervenções que a Rússia quer fazer na Ucrânia, não seria mais possível um conflito de caráter mundial, ainda mais hoje, com novos tipos de armamentos que trariam muita destruição de ambos os lados.”

A Primeira Guerra Mundial se encerrou em 11 de novembro de 1918, deixando 18,6 milhões de mortos.
 

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