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Fato em Foco

Fórum Urbano da ONU é "institucional" demais, diz especialista

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Nesta semana, Medellín sedia o 7° Fórum Urbano Mundial, um evento promovido pelo UN Habitat, o escritório de habitação da Organização das Nações Unidas. O encontro técnico reúne especialistas em urbanismo, membros de governos e ONGs, representantes do setor privado e outras organizações da sociedade civil para discutir o desenvolvimento das cidades sob o tema "equidade urbana em desenvolvimento". O tema surgiu a partir de estudos de diversos escritórios da ONU, que constatam que o desenvolvimento sustentável nas cidades não é possível sem que se promova a igualdade de oportunidades para todos que vivem nelas, independentemente de cor, religião, posição política ou camada social.

Moradia precária é um dos temas centrais do 7° Fórum Urbano Mundial
Moradia precária é um dos temas centrais do 7° Fórum Urbano Mundial Flikcr/ par Elisângela Leite
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Um diálogo universal para a criação de um ambiente urbano mais justo? Em tese, sim. Na prática, o urbanista e professor da USP (Universidade de São Paulo) João Sette Whitaker acha o Fórum "institucional" demais. "As pessoas confudem, achando que o fórum é uma espécie de versão urbana do fórum social mundial", afirma Whitaker, que participa de uma mesa promovida pela Agência Francesa para o Desenvolvimento (AFD) em parceria com a ONG Gret - Profissionais do Desenvolvimento Sustentável, também francesa. "Na verdade, a ONU aproveitou um pouco a popularidade e a simpatia que as pessoas tinham pelo Fórum Social Mundial para usar este termo 'fórum', que realmente dá uma cara de um processo muito horizontal, que parte das bases dos movimentos sociais etc".

Falta o povo

Mas, o professor se queixa justamente da ausência dessas "bases". "A gente sente falta daqueles que vivem a cidade pelo seu aspecto mais 'duro'". Em outra palavra, o povo. "A maioria dos eventos e das preocupações está voltada para as questões da pobreza urbana. É claro que a gente sente falta dos pobres. É um pouco (assim): grandes especialistas, engravatados ou não, que giram pelo mundo permanentemente discutindo a pobreza alheia". Não quer dizer que o fórum seja fechado aos movimentos sociais mas, nas palavras de Whitaker, ele serve mais como espaço de "divulgação de políticas" do que qualquer outra coisa.

Apesar de não estar lá para fazer lobby político, o pesquisador leva um dossiê importante para o Fórum: a participação ativa no primeiro ano do governo Fernando Haddad (PT) em São Paulo, que fez da política urbana uma prioridade. Além de participar do Conselho da Cidade criado pelo prefeito, Whitaker é um comentarista frequente do governo em seu blog e um crítico feroz da gestão Kassab que, de acordo com ele, "institucionalizou a ilegalidade". "A herança política deixada pelo Kassab não foi nem uma herança política de um modelo que privilegie o setor privado dentro de uma normalidade institucional e legal. O que está aparecendo e que a mídia está encobrindo de uma maneira escandalosa são realmente esquemas de corrupção endêmicos que foram instalados na cidade".

Máquina corrupta

Ele se refere a escândalos como o propinoduto operado pelo subsecretário da Receita do ex-prefeito na Secretaria de Finanças. Ronilson Bezerra Rodrigues quitava dívidas do Imposto Sobre Serviços (ISS) por valores muito abaixo do devido. Em troca do favor, levava parte da diferença, beneficiando as incorporadoras, que pagavam menos, e também os funcionários, que enchiam os bolsos.

Ou o escândalo Aref, que cresceu na Secretaria de Habitação: Hussain Aref Saab, então diretor do Aprov (escritório responsável pela liberação de construções), só autorizava a construção de obras de médio e grande porte mediante propina. Em pouco mais de sete anos no cargo, Aref comprou 106 imóveis e seu patrimônio ultrapassou os R$ 50 milhões. "Não é à toa que apareceu neste período na cidade um conjunto de empreendimentos imobiliários fora do habitual e altamente impactante. Sobretudo os shopping centers", lembra Whitaker.

Os esquemas vieram à tona graças à Controladoria Geral do Município, instaurada na gestão Haddad. Mas o desbaratamento de uma infra-estrutura de corrupção tão arraigada tomou tempo precioso e atrasou, na opinião de Whitaker, a implementação do projeto de cidade que o prefeito havia imaginado. "Eu acredito que passando a eleição (presidencial), qualquer que seja o resultado, o Haddad vai entrar num momento de uma certa paz astral e midiática e aí acho que as coisas dele vão começar a aparecer".

Participação no Fórum

Nesta quinta-feira, às 14h, João Sette Whitaker participa do debate no Fórum, que traz em seu tema uma pergunta ambiciosa: é possível renovar as áreas de moradia precária sem aumentar a exclusão? É uma questão que, na opinião do especialista, reduz a duas opções um problema mais complexo: renovar o espaço urbano ou retirar as pessoas das áreas precárias.

"Normalmente, a retirada de pessoas se dá em favelas menores que estão dentro das malhas urbanas mais valorizadas e portanto a retirada se dá dentro de uma política de gentrificação. Então, se retira para valorizar as áreas onde elas estavam antes. Quando são assentamentos de muito mais gente, a questão não se coloca porque eu não posso botar um milhão de pessoas que estão nos mananciais em São Paulo num ônibus e levar para algum lugar. Eles estão lá e isso é definitivo". Apesar da pergunta, o debate promete ser interessante.

27:27

Entrevista Whitaker

Para ouvir a entrevista na íntegra, clique no box à esquerda.
 

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