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O Mundo Agora

Opinião: Extremistas não terão peso real no Parlamento Europeu

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A surpresa nas eleições para o Parlamento Europeu foram as boas notícias. As sondagens de opinião – e os comentaristas – vaticinavam triunfos para os partidos de extrema-direita nacionalistas que querem desmanchar a União Europeia. Muitos pensavam que esses movimentos euro-fóbicos poderiam até criar um grupo parlamentar par bloquear o trabalho legislativo. Pois bem, não aconteceu.

Matteo Salvini, vice-primeiro-ministro e líder do partido Liga Norte, durante coletiva de imprensa na sede do partido para avaliar os resultados das eleições para o Parlamento Europeu, em Milão, Itália, em 27 de maio de 2019.
Matteo Salvini, vice-primeiro-ministro e líder do partido Liga Norte, durante coletiva de imprensa na sede do partido para avaliar os resultados das eleições para o Parlamento Europeu, em Milão, Itália, em 27 de maio de 2019. REUTERS/Alessandro Garofalo
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Os extremistas anti-europeus, todos juntos, só conseguiram manter suas posições: pouco mais de 20% das cadeiras. Não terão nenhum peso real no Legislativo europeu. Além do mais, partidos raivosamente soberanistas têm muita dificuldade em cooperar com outros soberanistas.

As divergências são imensas em matéria de programas econômicos, de políticas sociais, ou da relação com a Rússia que financia uma parte desses agrupamentos. Claro, em alguns países como na Itália por exemplo, a extrema-direita ganhou sem sombra de dúvida, e na França, Marine Le Pen, com 23% dos votos, chegou por um triz na frente do movimento progressista do presidente Macron.

Os europeus estão aprendendo a conviver com uma pequena minoria de nacionalistas radicais. Não era assim no final do século XX, mas ainda não é por aí que a Europa vai se desconstruir.

Participação em alta e interesse dos jovens pelo meio ambiente

Mas as boas notícias não são só negativas. A mais espetacular foram os números da participação que ultrapassaram 50%, um verdadeiro recorde nas últimas duas décadas.

Tradicionalmente, os cidadãos dos diversos Estados nacionais não se interessam pelo Parlamento Europeu. A abstenção é massiva e, em geral, vota-se só em função dos problemas políticos domésticos e para mandar um recado de mal humor ao governo de turno.

Dessa vez, não só houve afluência nas urnas, mas os eleitorados também debateram e votaram em função de problemas comuns que só podem ser resolvidos ao nível da Europa inteira.

A juventude europeia foi às ruas para pedir decisões rápidas e eficientes para combater a mudança climática. A guerra comercial entre Estados Unidos e China está impondo uma resposta comum europeia ao desafio de mudar rapidamente o seu próprio modelo de produção e rever seus acordos e regras comerciais.

A acumulação de ameaças de segurança nas fronteiras – a invasão russa da Ucrânia, o contágio terrorista dos conflitos no Oriente Médio, a crise migratória com a África – colocou no primeiro plano a urgência de construir uma força de defesa europeia compartilhada.

Quanto às políticas econômicas e sociais, a defesa do euro ou o combate às fraturas territoriais em cada país, nada será possível na base do cada um por si. Para alguns, a Europa é o problema. Mas para a maioria do eleitorado europeu só a Europa pode ser a solução.

Instituições europeias saem fortalecidas

A última boa notícia é que as instituições europeias não vão continuar funcionando só na base de uma tecnocracia, tradicionalmente avalizada pelos conservadores do PPE e os sociais-democratas do S&D. Esses dois partidos europeus, que agrupam seus membros nacionais, perderam a confortável maioria parlamentar da qual se beneficiavam nas últimas décadas para se manter e alternar no poder Legislativo.

Desta vez, vão ter que negociar com os dois maiores ganhadores nas urnas: os centristas liberais progressistas da ALDE e os Verdes. Não vai haver Parlamento, nem nomeação de uma nova Comissão sem uma pesada negociação entre todas essas forças, divididas ideologicamente mas todas profundamente pró-europeias. Vão ter que sair dos conchavos politiqueiros para concordar com um programa comum de ação para os próximos cinco anos de vida da União Europeia.

Pela primeira vez, os dirigentes de Bruxelas terão que enfrentar o escrutínio permanente das opiniões públicas, e prestar contas. A votação de ontem abriu caminho para que as instituições europeias, depois de seis décadas de vida, estejam finalmente se tornando um verdadeiro espaço político comum, ultrapassando os âmbitos nacionais.

Uma vitória da democracia supranacional. E isso é uma ótima notícia para o futuro do Velho Continente e a melhor maneira de combater o populismo extremista.

Alfredo Valladão, professor de Ciências Políticas do Instituto de Estudos Políticos de Paris, faz uma crônica às segundas-feiras para a RFI

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