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“França está pagando 40 anos de inércia política”, diz autor de livro sobre Maio de 1968

Em mais um fim de semana de protestos dos “coletes amarelos” na França, a mobilização perdeu um pouco de sua força, mas continua viva. Neste sábado (22), segundo dados do governo francês, 38.600 pessoas saíram às ruas em todo o país – na semana passada, eles eram 66.000. Paris contou com 2.000 manifestantes. Em entrevista à RFI, o sociólogo Michel Fize, autor do recente livro “Mai 68 n’a jamais existe” (“Maio de 68 nunca existiu”, em português), afirmou que acredita na longevidade do movimento, que deve continuar de forma indefinida e por tempo indeterminado, em 2019.

"Coletes amarelos" na cidade de Saint-Beauzire, no centro da França, em 15 de dezembro
"Coletes amarelos" na cidade de Saint-Beauzire, no centro da França, em 15 de dezembro Thierry Zoccolan / AFP
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Com informações de Alexis Bedu

Michel Fize acredita que o país está diante de uma “insurreição popular” que reúne todos os setores da sociedade: cidadãos em atividade, aposentados, apolíticos, militantes, pessoas de esquerda e de direita. “Segundo as condições do momento, vemos aparecer um ou outro novo tentáculo”, afirma o especialista, classificando os “coletes amarelos” de “movimento-polvo”.

“É algo que faz parte do cenário social e que pode ficar por bastante tempo, tomando formas que variam de um sábado a outro, com ações que também evoluem com o tempo. Estamos pagando 30, talvez 40 anos de inércia política, em diversas áreas da vida cotidiana, como a saúde, que se deterioraram ao passar dos anos”, afirmou.

“Todas as categorias sociais são afetadas por problemas que atrapalham a vida hoje. Pode ser em relação a programas sociais de reembolsos, que foram cortados, ou de moradia, com alugueis caros, ou aquecimento, cujo custo também aumenta”, aponta o sociólogo, explicando as razões pelas quais a França inteira, dos ricos aos pobres, parece se manifestar.

Ele também ressalta que não é possível afirmar hoje que o movimento se enfraquece. Segundo Michel Fize, não é preciso "protestar junto" o tempo todo para fazer uma reclamação. “Há fontes de descontentamento que podem surgir de qualquer parte, o que produz um movimento contínuo”, disse.

“Se imaginarmos que amanhã, subitamente, não há mais nenhum colete amarelo na rua, os policiais ainda vão se manifestar, assim como enfermeiros, professores e aposentados”, declara. “Esse movimento é radical e, por isso, determinado. Portanto, o número não tem nenhuma importância. É preciso apenas que alguns grupos surjam aqui e ali para que a polícia seja acionada.”

Tempo é o pior inimigo do governo

Apesar do anúncio de medidas do presidente francês, Emmanuel Macron, e da “pausa” para as festas de Natal e Réveillon, Michel Fize se mostrou certo de que as manifestações vão prosseguir com fôlego no ano que vem. “Veremos ainda um ato VII, que será mais uma vez inovador, e acho que a pequena chama vai atravessar as festas de fim de ano”, declara.

“Tem pessoas que estão em processo de sobrevivência, eles não podem ficar esperando por quatro meses até que seus problemas sejam resolvidos”, destaca. “Isso pode resultar em quê? Engajamentos, promessas, tudo isso vai levar tempo e o tempo é o pior inimigo do governo atual. O governo não tem tempo e as pessoas, por suas dificuldades, também não podem esperar.”

Fize aponta que as respostas governamentais não estão à altura do problema, “porque não é uma questão de estar ou não satisfeito”. “Objetivamente, ainda há pessoas para quem um aumento de € 100 ou um ganho de poder aquisitivo de € 25 não vai mudar a vida. Tem um atraso tão grande no tratamento dos problemas que estamos num contexto favorável às manifestações”, conclui o sociólogo.

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