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Em Annecy, diretor de 'A Era do Gelo' revela desejo de criar séries de animação com parceiros no Brasil

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Ele é um dos maiores nomes do cinema de animação de grande bilheteria, diretor de blockbusters como A Era do Gelo, Rio e O Touro Ferdinando. O brasileiro Carlos Saldanha falou à RFI Brasil em Annecy, durante o Festival Internacional de Animação.

O animador brasileiro Carlos Saldanha participa do Festival de Animação de Annecy.
O animador brasileiro Carlos Saldanha participa do Festival de Animação de Annecy. RFI
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RFI De Marechal Hermes, na zona norte do Rio de Janeiro, para o mundo, você hoje é uma das grandes estrelas internacionais do cinema de animação. O que resta do garoto fluminense que gostava de desenhar e de computação gráfica no artista cujo talento é reconhecido hoje globalmente?

Carlos Saldanha – Esta é a minha essência. A gente cresce, mas guarda essas memórias, de família, de vida, que nunca sai da gente. Juntamos isso com outras experiências, mas a essência de quem nós somos e onde a gente cresceu, eu carrego isso comigo, não tem jeito.

RFIVocê tem sido presença constante aqui no Festival de Annecy. Quando você vê a criação brasileira no mercado de animação, como você avalia sua evolução?

CS – A animação brasileira tem cada vez mais evoluído ao longo dos anos, e agora com mais incentivos para séries de televisão e mais estúdios sendo formados, está cada vez melhor, com mais qualidade, com mais conteúdo. A questão é como continuar esse desenvolvimento, como continuar a investir, a trabalhar em educação. E continuar a buscar conteúdos e trabalhos que deem espaço para esses artistas fazerem projetos que não só funcionem no Brasil, mas também globalmente. É um princípio, ainda estamos engatinhando em alguns aspectos, mas o futuro é promissor.

RFI A animação brasileira tem alguma marca estética própria?

CS – Não, ainda não. As histórias talvez ainda sejam um pouco regionais, algumas coisas muito brasileiras, e a tendência é alcançar uma coisa mais universal. No momento não localizo nenhuma identidade específica, ou talvez eu não conheça o suficiente para dizer que [a animação brasileira] tenha uma identidade própria. Mas com certeza existe um sabor, um jeito de fazer que vai, aos poucos, gerando essa identidade. Quando começarmos a fazer projetos maiores, talvez isso fique mais visível.

RFIO que falta para os jovens talentos brasileiros evoluírem nesse mercado?

CS – Falta perspectiva. Descobrir as oportunidades, criar oportunidades. Educação é importante porque é necessário formar um grupo de jovens interessados em fazer animação, com capacidade para fazê-lo. Então, perspectiva e formação. O que acontece no Brasil é que às vezes os animadores estão formados e trabalhando, mas a perspectiva está fora do Brasil. Eles acabam indo para outros países para fazer animação. Também é necessário diversificar a educação, chegar às outras classes sociais. Não só ao animador filho de classe média, que tem educação boa, que vai conseguir chegar lá. É necessário conseguir alcançar uma faixa da sociedade que é criativa, que tem capacidade de trabalhar com animação. Isso já existe, companhia de animação que criaram núcleos de treinamento para pessoas de baixa renda, identificando talentos, criando oportunidades para quem não tem. As pessoas quando têm uma possibilidade de trabalhar com animação de uma maneira digna, saem da camada ignorada da população. É um movimento multiplicador muito grande. Essa parte educação-trabalho tem que ser feita com muito mais intensidade. (...) Isso gera um movimento emocional, social, que pode mudar a vida das pessoas. Qualquer tipo de arte tem uma capacidade transformadora muito importante na vida das pessoas que fazem e na vida das pessoas que interagem com arte. A primeira coisa que o governo corta é arte, mas o pessoal não vê que a arte é um movimento não só cultural, como social.

RFI Quando você começa a criar dentro de um projeto novo. Como funciona seu processo criativo, o que vem primeiro?

CS – Sempre vem através de uma emoção. Um sentimento conectado com uma história, com uma experiência de vida, com uma coisa que aconteça. Então cria-se uma situação, e um personagem dentro dessa situação e então se descobre qual emoção você quer tirar disso. Por isso a animação acessa tanto as pessoas. Você conta histórias, você envolve as pessoas numa temática importante pra elas, existe uma empatia, uma conexão.

RFIQuais são os conselhos do Carlos Saldanha para os jovens animadores?

CS – Não existe mágica. As coisa não acontecem facilmente, não caem do céu, você tem que correr atrás. Isso é uma coisa que eu sempre fiz. Mesmo se parecer difícil, é preciso correr atrás. Temos que continuar sonhando, eu continuo sonhando. As pessoas têm que ter essa perseverança, essa vontade, porque você muda a sua vida. Meu conselho para os estudantes ou pessoas que querem fazer animação é: vão fazer. Não fiquem esperando que aconteça. E ache formas de fazer, no Brasil ou fora dele. E estude muito! Eu continuo estudando...

RFI A edição 2018 do Festival de Annecy trouxe um conteúdo bastante político, a imprensa especializada vem falando bastante sobre isso. Você também vê isso?

CS – A animação é uma expressão artística e geralmente as expressões artísticas são revolucionárias, são expressões de sentimentos ou de um momento que você deseja refletir, ou quer fazer com que as pessoas reflitam. Você quer passar uma mensagem, transmitir uma opinião, então existe sempre um elemento social político muito presente em filmes de animação. E como os personagens são muitas vezes animais, bonitos, coloridos, as pessoas às vezes se esquecem que você está num mundo que, apesar de virtual, tem uma mensagem real. Esse mundo da animação é um dispositivo muito bom para se transmitir uma mensagem sem agressividade. É mais sutil, mais sofisticado, mas muito eficiente. Quando os filmes começam a ficar mais políticos é porque a comunidade está sentindo essa necessidade. É muito positivo isso.

RFIQuais são seus novos projetos?

CS – No momento estou em transição, terminei o Ferdinando e agora estou buscando novas ideias. Um filme de animação demora em média quatro anos para ser feito, então estou começando agora a fazer desenvolvimento de projetos com a Blue Sky para um novo filme. Mas a história não está pronta, a sementinha ainda está sendo regada. Mas tenho ideias de fazer projetos de Live Action, de filmes de animação com pessoas, estou com esperança de fazer uns projetos no Brasil, mas nada ainda está definido. Tenho vontade de fazer séries para a TV, séries de animação e de Live Action com parceiros brasileiros, mas ainda não existe nenhum projeto que eu possa divulgar.

RFI Como foi a conversa com os estudantes de animação aqui na segunda edição do MIFA Campus, do Festival de Annecy?

CS – Parte do interesse de estar num festival como esse é a interatividade com os estudantes, porque eles são o futuro. São as pessoas que querem fazer, que estavam no seu lugar há 20 anos atrás. Isso é muito gratificante e muito energizante. Eles me inspiram com essa energia positiva a continuar a buscar meus sonhos, é muito legal essa troca. E também é bom para ver o que a galera está fazendo, tem muita coisa legal e interessante sendo feita. Isso gera uma renovação para mim também. Por exemplo, as animações na abertura do festival feitas pelos alunos da escola Gobelins, achei as sacadas para fazer as animações muito sofisticadas, sem ficar estereotipado, e esse tipo de percepção de animação é muito inspiradora.

RFI No ano em que o Brasil é homenageado em Annecy, você aposta em algum prêmio para alguma produção?

CS – Não posso fazer nenhuma aposta, porque ainda não vi os filmes brasileiros. Mas estou torcendo para o Brasil na competição oficial!

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