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França

Nevasca em Paris vira perrengue para brasileiros e franceses

Há 30 anos Paris não enfrentava uma nevasca tão forte quanto se viu nas últimas 24 horas. Motivo de alegria para crianças, adolescentes e adultos, que correm para fazer bonecos de neve nas calçadas e jardins, além de postar dezenas de fotografias nas redes sociais, a situação complica quando é preciso se locomover na cidade. Moradores da região parisiense contaram à reportagem da RFI os transtornos que enfrentaram nas últimas horas.

Rua de Montmartre, no 1° distrito de Paris, coberta por espessa camada de neve.
Rua de Montmartre, no 1° distrito de Paris, coberta por espessa camada de neve. Foto: Pierre René-Worms
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No final da tarde de terça-feira (6), a brasileira Larissa Andrade Nédélec demorou três horas, duas a mais do que o habitual, para retornar do trabalho (no sétimo distrito) para casa (no décimo-primeiro distrito da capital). Às 18h, as autoridades já tinham dado a ordem de retirar os ônibus de circulação e o metrô estava caótico no bairro de Invalides, nas proximidades do Museu D'Orsay. "Vi alguns acidentes de carro e pessoas caindo nas calçadas", conta Larissa.

Hoje, quando ela pensou que chegaria mais rápido ao trabalho, foi a mesma dificuldade. Nas proximidades da estação de metrô Charonne, perto de sua casa, ela teve a primeira surpresa do dia: viu uma senhora com uma fratura exposta na perna, vítima de uma queda causada pela calçada escorregadia. Em vez dos 20 minutos habituais, a brasileira demorou 1h45 para chegar ao trabalho.

Motoristas se sentem abandonados pelas autoridades

Cerca de 1.500 pessoas passaram a madrugada dormindo em seus carros, bloqueados pela neve em estradas da região parisiense. Um dos eventos mais críticos da noite foi o fechamento da rodovia nacional RN 118, importante artéria na região oeste.

A francesa Charlotte, que passou a noite presa nessa estrada, trancada no carro com o marido, sob uma temperatura de 2°C negativos, sem água, comida ou cobertor, sentiu-se totalmente abandonada. Associações de moradores e prefeitos de cidadezinhas da região abriram ginásios e salas municipais para receber esses "náufragos das estradas", conforme a expressão cunhada pela imprensa local. Mas centenas de motoristas não tinham sequer uma lanterna no carro para enfrentar o gelo até o meio das pernas e a escuridão.

A mediadora educacional Luciana Melo não foi trabalhar nesta quarta-feira (7). Ela depende da RN 118 para chegar até o colégio onde assessora adolescentes no subúrbio de Plessis-Robinson. "Estou completamente ilhada, não posso sair porque a avenida em frente à minha casa está cheia de neve, os carros não passam e eu não posso fazer nada", relata. A sorte de Luciana é que, ao telefonar para o estabelecimento para se desculpar pela ausência, a diretora havia decidido suspender as aulas. A maioria das escolas e universidades não abriu hoje na região parisiense.

Para quinta-feira (8), Luciana arquitetou um plano "b". "Vou pegar um trem, que estava funcionando hoje, e ônibus, que acredito voltarão a circular amanhã. Mas vou acordar mais cedo e vestir meus sapatos de andar na neve, porque devo demorar de uma hora a uma hora e meia para fazer o trajeto de 8 km, que normalmente faço em 15 minutos de carro", diz a brasileira.

Residente na França há 17 anos, Luciana recorda de uma ocasião em que o despreparo das autoridades para antecipar o caos provocado pela queda de neve foi ainda pior. "Há uns cinco anos, eu ainda tinha meus filhos pequenos e nevou muito nos Altos do Sena (Hauts-de-Seine), a região onde moro. Minha cidade, Meudon, fica entre o rio e a floresta. A neve cai e não derrete rápido. Tive de passar dois dias sem sair de casa", afirma.

Falta de eficiência na limpeza das ruas

Questionada sobre a razão que leva a capital do país a se transformar em "cidade morta" quando neva – o que afinal é normal no inverno no hemisfério norte – Luciana estima que "falta vontade" e eficiência da parte das autoridades para evitar os transtornos. "Fazia uma semana que sabíamos que ia nevar, mas os serviços da prefeitura não são eficazes. Não foi feito o necessário para comprar a quantidade adequada de sal e areia para espalhar nas ruas e derreter o gelo. Também neva na Finlândia, na Noruega e em outros países da Europa, e nem por isso esses países param", argumenta a mediadora educacional.

Mayla Digard, estudante de engenharia de alimentos na Universidade Paris VIII, em Saint-Denis, acordou nesta quarta-feira (7) com disposição para enfrentar várias trocas no transporte público, contanto que não perdesse as aulas na faculdade.

Moradora de Chelles, a 27 km a leste de Paris, ela caminhou 15 minutos até a estação de trem de sua cidade – um trajeto que faz normalmente de ônibus –, e depois de trocar várias vezes de linhas, presenciou o mais desagradável. "Tive de ir até a Gare du Nord, mas tinha uma multidão lá dentro. Quando as pessoas iam de uma plataforma para outra, tinha gente que caía no chão, uma loucura. Pessoas mal-intencionadas ainda aproveitaram a confusão para roubar os usuários", conta Mayla.

A estudante aguentou firme e foi até seu ponto final. Quando estava chegando à faculdade, amigos avisaram pelas redes sociais que não haveria aulas. "Fui até o campus para pelo menos tirar uma fotografia com meu celular e ter a prova de que estava tudo fechado. Depois dessa loucura toda, demorei mais uma hora para voltar para casa."

Nessa quinta-feira, Mayla e milhares de outros moradores da região parisiense vão começar tudo de novo. E como as temperaturas permanecerão negativas – a previsão é de -2°C durante a madrugada –, a neve ficará grudada no solo, formando o temido "verglas", a placa de gelo escorregadia para carros e pedestres. É mais um dia de perrengue à vista.

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