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A Semana na Imprensa

França prepara lei para acabar com "cultura do estupro"

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O escândalo sexual envolvendo o produtor americano Harvey Weinstein continua tendo repercussões na França. Nesta sexta-feira (20), a psiquiatra Muriel Salmona, especialista em violência sexual e estresse pós-traumático, entregou à secretária de Estado Marlène Schiappa, encarregada da igualdade entre mulheres e homens, oito propostas para "acabar com a cultura do estupro" no país.

Capa e artigo da revista semanal francesa L'OBS: "Romper o silêncio e acabar com a cultura do estupro".
Capa e artigo da revista semanal francesa L'OBS: "Romper o silêncio e acabar com a cultura do estupro". Fotomontagem RFI
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Em entrevista à revista L'Obs, a psiquiatra explica que essa "cultura" repousa sobre três elementos: a negação dos fatos, a responsabilização da vítima e a ideia que, sendo a sexualidade algo violento por natureza, "no fundo as mulheres gostam de ser forçadas e por isso sentem vergonha". De acordo com a especialista, essa formulação do pensamento sempre protegeu os homens e deu a eles o privilégio de ter acesso ao corpo das mulheres, inclusive de forma agressiva. A violência sexual funciona como um instrumento de dominação, enfatiza Salmona.

A psiquiatra francesa lembra que a violência sexual, assim como a tortura, provoca um trauma extremamente grave. "Por isso, ela é usada como arma de guerra", recorda. "As vítimas vão experimentar uma sensação de perigo permanente, ter crises de pânico e variados distúrbios de ansiedade. O pior é que essas reações, mesmo sendo provas de uma grave agressão, são interpretadas como um sinal de fragilidade psicológica", afirma a especialista. "Estudos mostram que os homens, quando são vítimas de abuso sexual, desenvolvem os mesmos problemas, o que prova que a mulher não é uma coisa menor."

Autora de vários livros sobre o assunto e presidente da associação "Memória Traumática e Victimologia", além de membro da Comissão da Infância do Unicef, Salmona diz que as crianças precisam ser sensibilizadas desde muito cedo à questão da não violência e do consentimento.

Falta de preparo dos profissionais

Segundo ela, 82% dos estudantes de Medicina não são formados na França para tratar do problema, o que faz com que as vítimas levem 13 anos em média até encontrar um profissional especializado. Médicos, profissionais de saúde, policiais e agentes judiciários precisam ser treinados para detectar a violência sexual e ajudar a vítima a verbalizá-la, recomenda a psiquiatra. Ela também propõe a criação de centros de crise abertos 24h para que as vítimas possam buscar proteção em caso de agressão. Sugere a criação de jurisdições especializadas no tratamento desse tipo de crime e a revogação dos artigos de lei existentes que permitem a qualificação do estupro como um delito.

No plano legal, Salmona defende ainda uma maior clareza na legislação francesa a respeito da idade mínima para o consentimento de uma relação sexual. Na avaliação da psiquiatra, abaixo de 15 anos não é possível falar em consentimento.

Ao contrário do Brasil e da maioria dos países europeus, a legislação francesa não prevê uma idade mínima de consentimento para relações sexuais entre menores e adultos.

Motorista ficou depressivo depois de trabalhar para Weinstein

A revista L'Obs também publica o testemunho do francês Mickael Chemloul, que foi motorista de Harvey Weinstein durante seis anos em Cannes, durante as temporadas do festival de cinema francês.

Chemloul conta ter visto mulheres saírem aos prantos dos hotéis após encontros com Weinstein. Também revela que teve seus óculos quebrados e um dedo fraturado pelo americano, por não ter encontrado duas garotas de programa que deveria ter levado ao hotel do produtor. O motorista prestou queixa na polícia, mas o processo foi arquivado. Segundo Chemloul, de 56 anos, ele sofreu uma depressão depois de trabalhar para Weinstein.

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