As urnas falaram. O segundo turno das eleições presidenciais francesas será Emmanuel Macron contra Marine Le Pen. O jovem social-liberal pró-europeu, contra a representante da extrema-direita xenófoba, anti-européia e anti-globalização. A abertura contra o fechamento.
Duas posições bem definidas, sem rodeios, que poderão agora ser claramente debatidas pelo país inteiro até o voto final. As últimas sondagens de opinião estão anunciando a vitória de Macron com 62% dos sufrágios, contra 38% para Le Pen. E apesar dos comentaristas, das Bolsas e dos políticos que não confiam mais nas medidas da opinião pública, até hoje, as sondagens na França acertaram na mosca.
Claro, a principal característica de uma democracia que funciona é a incerteza dos resultados eleitorais. Muita coisa ainda pode acontecer durante a campanha. O atentado que matou um policial na avenida dos Champs Elysées, dois dias antes do pleito, é mais um sinal que tem muita gente, dentro e fora da França, tentando manipular as eleições. Mas é verdade também que esse assassinato a sangue frio teve um impacto mínimo no voto, mostrando que o eleitorado francês é bem mais maduro e calmo do que muita gente pensa.
França está dividida politicamente
Mas de qualquer maneira não dá para esconder o fato de que a França está dividida politicamente. E mais do que isso: fragmentada. Os quatro primeiros colocados estão separados por apenas seis pontos percentuais. São quatro personalidades, quatro programas, quatro propostas bem distintas e incompatíveis. Dois sobraram, mas os outros continuam existindo na sociedade francesa. Hoje, já não se fala só na campanha presidencial, mas também na eleição legislativa marcada para o mês de junho.
Será que o presidente eleito vai conseguir uma maioria parlamentar para governar o país? Ou, desde o início, o governo ficará paralisado tendo que enfrentar uma pulverização partidária na Assembleia Nacional? Na verdade, este segundo turno Macron-Le Pen é um terremoto político. Os dois grandes partidos de governo – a direita conservadora “republicana” e a esquerda socialista e socialdemocrata – implodiram. Sobraram só duas formações extremistas da esquerda e da direita radicais e o movimento centrista de Macron que se define como sendo de direita e de esquerda ao mesmo tempo.
Categorias políticas obsoletas
As velhas categorias políticas que governaram a França desde os tempos do general de Gaulle, a partir do final dos anos 1950, tornaram-se obsoletas. Hoje o enfrentamento é outro. Uma França otimista, disposta a fazer as grandes e necessárias reformas internas e a conquistar um lugar preeminente na Europa e no mundo globalizado, contra uma França friorenta, com medo do mundo e dos outros, que sonha em levantar fronteiras intransponíveis contra o comércio e o sistema financeiro internacional, e contra os fluxos de imigrantes e até a própria liberdade de circulação.
Por um lado, uma França que aceita competir com o resto do mundo e modernizar suas relações sociais e de trabalho. Por outro lado, uma França que ainda acredita nas ilusões populistas, numa volta a um país fechado onde um Estado protetor pode se endividar o quanto quiser para criar empregos, riquezas e manter tudo como está. A política se transformou num embate entre futuro e passado.
Vitória de Le Pen é tragédia para economia e sociedade
Mais grave ainda: os votos que foram para a extrema-direita e a extrema-esquerda nostálgicas de uma mítica “idade de ouro” francesa representam quase 50% do total. A boa notícia é que estão divididos. Uma vitória de Marine Le Pen seria não só uma tragédia para a economia e a sociedade francesas mas também para a Europa. Um saída da França da União Europeia – um “Frexit” – simplesmente acabaria com meio século de integração, o período de paz mais longo da história do Velho Continente.
Uma vitória de Macron, o único candidato claramente favorável a uma integração europeia mais profunda e moderna, seria a salvação da lavoura, para a França e para a Europa. Não há dúvida: a campanha do segundo turno vai ser dura, pesada e decisiva para a paz e o futuro econômico do continente europeu.
*Alfredo Valladão, do Instituto de Estudos Políticos de Paris, faz uma crônica de política internacional às segundas-feiras para a RFI
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