Acessar o conteúdo principal
Brasil-Mundo

Nacionalismo dos húngaros leva cineasta brasileiro a produzir filme na Alemanha

Publicado em:

O cineasta, poeta, performer e artista digital carioca Márcio-André Sousa Haz vive há seis anos em Budapeste, mas está de mudança para Berlim, onde irá dirigir seu primeiro longa-metragem: "Transparency of Evil". Em entrevista à RFI, ele conta que o fato de os húngaros serem fechados e nacionalistas passou a limitar sua carreira. “Aqui é bom para começar, mas para continuar como diretor é impossível.”

O cineasta brasileiro Márcio-André Sousa Haz.
O cineasta brasileiro Márcio-André Sousa Haz. Foto: Mania Karimianpour
Publicidade

Enviada especial à Budapeste

O brasileiro de 41 anos venceu no ano passado o prêmio do FEST - Pitching Forum, festival internacional realizado em Portugal que promove o financiamento e a coprodução de projetos cinematográficos. A conquista definiu sua mudança para a Alemanha.

Antes de trocar o Brasil pela Europa, Sousa Haz já tinha uma carreira movimentada na áerea cultural. Ele foi um dos sócios-fundadores da editora Confraria do Vento, no Rio de Janeiro, onde publicou livros de poesia e ensaios. Seu livro "Poemas apócrifos de Paul Valéry" foi indicado para os prêmios Jabuti e Oceanos. O carioca tem textos traduzidos para mais de vinte idiomas, bem como performances realizadas em Londres, Paris, Veneza, Roterdã, Buenos Aires e Nova York, entre outras cidades.

Sousa Haz mudou-se para Budapeste depois de visitar a Hungria em duas ocasiões, a primeira para fazer uma conferência na universidade e depois convidado para uma performance. A essa altura, ele já estava muito envolvido com o cinema, fazendo curta-metragens e videoclipes. Ele teve aulas com grandes nomes do setor, como o americano Roman Coppola, o iraniano Asghar Farhadi, o australiano Stephan Elliott e o britânico Christopher Hampton. Seu curta "A primeira vez que vi Francis Taylor em câmera lenta", de 2016, ganhou 12 prêmios em festivais internacionais.

Com a premiação do projeto de longa-metragem conquistada no ano passado, a mudança para Berlim se tornou uma evidência. “Eu vou deixar a Hungria por questões profissionais. Os húngaros são um pouco fechados, em vários aspectos, para trabalhos com o cinema. Eles estão acostumados a trabalhar com equipes internacionais nas grandes produções, mas no momento de filmar uma produção húngara, vão privilegiar o profissional húngaro", conta. "Para mim é difícil, porque eu não sou húngaro, não falo a língua com fluência, sequer compreendo o que é ser húngaro, eu não me sinto húngaro. Se eu estivesse na Espanha, onde morei, ou em Portugal, acho que seria mais fácil para me adaptar. Mas aqui é impossível. É por isso que eu vou para a Alemanha, que é mais cosmopolita, tem maior abertura para estrangeiros e muitos grandes artistas estão lá” , explica.

O curioso, diz, é que a Hungria tem uma longa história ligada ao cinema.“Eles têm muitos profissionais que foram para Hollywood, como os criadores da Warner, que são húngaros, muitos diretores de fotografia e produtores. Então, existe uma grande influência dos profissionais húngaros no cinema americano. Outra coisa é que a partir dos anos 2000, grandes produções americanas começaram a vir para Budapeste, como “Evita” e “Blade Runner”", cita. "Por ano, seis ou sete superproduções americanas são filmadas em Budapeste por causa da isenção de taxas e pelo fato deles terem profissionais e toda a infraestrutura, depois do trabalho feito pelo Andrew Wajna, que foi um grande produtor húngaro."

Sousa Haz explica, no entanto, que essas produções não são acessíveis aos húngaros criativos, e sim aos técnicos. Produtores assistentes ou coloristas, por exemplo, conseguem fazer trabalhos grandes na Hungria por serem atividades mais técnicas. Já um diretor de arte, um assistente de direção ou os diretores vêm todos de fora, do país de origem do filme.

Protecionismo cultural

O brasileiro conta que o circuito húngaro é ainda mais fechado. “Para o cinema húngaro, eles trabalham entre eles. O financiamento vem do Fundo Húngaro de Cinema. No meu caso é mais complicado porque sou estrangeiro, o que não me permite ter acesso a esses fundos. Como eles são muito nacionalistas, reservam para eles mesmos essas verbas. Para começar é muito bom, para avançar, enquanto diretor, eu tenho as minhas dúvidas.”

Nos últimos anos, diretores húngaros conquistaram importantes prêmios internacionais. O longa “O Filho de Saul”, de Lázló Nemes, venceu o Oscar de melhor filme estrangeiro em 2016. “Corpo e Alma”, da diretora Ildikó Enyedi, conquistou o Urso de Ouro no Festival de Berlim, no ano seguinte. Mas, como observa Sousa Haz, não são histórias políticas.

Aqui não se consegue financiamento para filme político. Eu estou terminando um videoclipe de uma banda húngara que se chama Besh O Drom, que mistura punk-rock com folk húngaro. Nós fizemos um vídeo que é bastante político, porque eles criticam o Parlamento. A gente não sabe como isso vai ser recebido, por ser completamente inusual. Você não vê crítica política em vídeo, em cinema, em nada na Hungria. Se você pensar em filmes americanos, na França e até no Brasil se faz filme político… Mas não existe esse tipo de coisa na Hungria.” O cineasta brasileiro vai deixar a Hungria na hora certa.

NewsletterReceba a newsletter diária RFI: noticiários, reportagens, entrevistas, análises, perfis, emissões, programas.

Acompanhe todas as notícias internacionais baixando o aplicativo da RFI

Veja outros episódios
Página não encontrada

O conteúdo ao qual você tenta acessar não existe ou não está mais disponível.