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Islândia / Copa de 2018 / Futebol / Fifa

Os segredos do futebol islandês pela primeira vez na Copa

Pela primeira vez, um país com pouco mais de 300 mil habitantes estará representado na Copa do Mundo de Futebol. Mas a presença da Islândia já não é uma surpresa. Em 2016, os jogadores do país, carinhosamente chamados de “nossos garotos” pelos conterrâneos, não só se classificaram para a Eurocopa como conseguiram chegar às quartas de final após vencer a tradicional Inglaterra.           

Islândia festeja a classificação para a Copa do Mundo na Russia após vencer o Kosovo (9 de outubro de 2017)
Islândia festeja a classificação para a Copa do Mundo na Russia após vencer o Kosovo (9 de outubro de 2017) Haraldur Gudjonsson / AFP
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Com informações de Frédéric Faux, enviado especial da RFI em Reykjavík

Muitos se perguntam como um país tão pequeno conseguiu se destacar no cenário do futebol mundial. Para entender, é preciso lembrar que durante muito tempo, jogar futebol por lá era quase impossível. Com dias que só duram 4 horas no inverno, em meio a muito vento e frio, poucas pessoas se aventuravam a praticar esportes do lado de fora. Mas as coisas começaram a mudar no início dos anos 2000, quando grandes estruturas cobertas foram construídas.

Hakon Sverrisson, treinador da categoria de base da cidade de Bredablik diz que muita coisa mudou depois da construção dos novos campos. “Antes, a maioria dos jogadores de futebol tinham que jogar handball ou basquete durante o inverno. Tentávamos jogar bola de vez em quando do lado de fora, mas os campos gelados e cheios de neve complicavam muito”, contou Sverrisson.

O treinador está no clube da cidade desde os 5 anos de idade. Ele foi capitão da equipe sênior durante 7 anos e depois treinador por mais 20. “Temos 1550 inscritos no clube, o que representa uma quantidade enorme de crianças. Todos são da cidade. Na Islândia é assim, você joga para o time do seu bairro, da sua cidade”, afirmou Sverrisson. Na parte da manhã, o uso dos campos é reservado para as escolas. Há também um horário reservado aos mais velhos.

Esportes para todos

A política do “esportes para todos” se torna possível já que todas as estruturas esportivas do país pertencem às prefeituras. Os resultados já são bem visíveis. Em 20 anos, a porcentagem de adolescentes que praticam algum esporte jogando em um clube passou de 40 a 60. A fatia dos que jogam 4 vezes na semana saltou de 17 para 40%. O consumo de álcool, um grave problema nos anos 2000, caiu vertiginosamente. Os resultados escolares melhoraram.

Para a advogada Anna-Ros, que inscreveu a filha no clube de futebol da cidade onde mora, essa mudança passou por uma escolha de sociedade. “Eu pago € 450 por ano, mas é preciso salientar que a prefeitura entrega anualmente um cheque de € 400 que pode ser usado em várias atividades para as crianças. Com isso minha filha faz esqui, futebol e ginástica artística. É muito importante que ela possa praticar futebol de forma Indoor porque no inverno é muito frio para ela do lado de fora”, contou Anna-Ros.

Investimento

A Islândia também passou a investir na carreira dos treinadores, financiando cursos na UEFA. Jonna trabalha com meninas de 6 e 7 anos e já tem um diploma internacional. “Passei por muitos cursos e já obtive o diploma A da UEFA. As crianças são todas treinadas por pessoas qualificadas. Além disso, as meninas têm o mesmo tempo de treino que os meninos”, afirmou Jonna.

Os goleiros mirins de 7 e 8 anos são treinados por Gunnleifur Gunnleifsson, que foi o goleiro da seleção islandesa de 2000 a 2016. Ele é o titular do time principal de Bredablik e está há 24 temporadas no clube. Para ele, é um dever ensinar os mais jovens o mais cedo possível: “Eu fui um bom goleiro, por isso tento ensinar às crianças quais as melhores técnicas. O goleiro é um dos jogadores mais importantes em campo. Sem um bom goleiro, é muito difícil vencer. Por isso é preciso repetir os gestos corretos milhares de vezes, desde pequeno”.

Futebol amador

Essa proximidade entre os atletas e os jovens é uma das marcas de um país que rejeita a profissionalização do esporte. O sociólogo da Universidade da Islândia, Vidar Halldðrsson, afirma que o futebol no país é antes de tudo uma paixão: “Não temos esporte profissional na Islândia, isso é algo único no mundo ocidental. Nos nossos centros esportivos municipais, todos podem jogar. Há os que querem se tornar atletas, Há os que querem somente se divertir. Dos 4 aos 20 anos todos estão juntos. Não há uma seleção e por isso não temos um clube profissional como nos outros países onde se escolhe os melhores jogadores a partir dos 10 anos de idade. Aqui, um bilionário nunca poderia comprar o clube de Bredablik, pois ele pertence a comunidade.”

Amador não significa amadorismo. Para não desperdiçar os talentos desse país tão pequeno, a federação nacional de futebol espalhou “olheiros” pela Islândia. Em quase todas as partidas há algum funcionário da entidade. Thorlakur Arnalsson é o responsável pelas equipes sub-15. “Viajo por todo o país, vou a todas as cidades, pois os melhores jogadores podem estar nas menores vilas. Às vezes, basta um olhar para encontrar a pérola rara, outras vezes é preciso muita reflexão”, afirmou Arnalsson. “O amadorismo não é um freio para o nosso futebol. Treinamos e treinamos como profissionais, mas guardamos nossa alma de amadores. Nunca é preciso pedir a um jogador islandês que ele tenha raça, trabalhe duro, corra mais do que os outros. Às vezes é preciso até pedir para que se acalmem. Somos como os Vikings, não precisamos de motivação”, completou.

Nossos garotos

Dizer que todos são fanáticos pela seleção não é um eufemismo. Poderíamos pensar que o apelido dos jogadores seria “Os Vikings”, mas eles são carinhosamente chamados de “Nossos Garotos”. Recentemente o presidente do país divulgou um vídeo ao lado da esposa, os dois vestidos com a camisa da seleção, jogando futebol no escritório presidencial. “Ganhando ou perdendo, é sempre uma alegria participar de um evento tão grandioso”, declarou o presidente. “Venham festejar conosco, todos estão convidados”, afirmou a primeira dama.

A Islândia está no grupo D e estreia na Copa do Mundo contra a Argentina no dia 16 de junho em Moscou. Na sequência irá enfrentar a Nigéria e a Croácia.

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