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O Mundo Agora

Planejamento e dinheiro fazem sucesso do futebol europeu

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A Europa tem o melhor futebol do mundo. Não porque os seus jogadores sejam mais craques. Longe disso. O segredo é que se trata do futebol mais rico, mais competitivo e mais aberto aos talentos vindos do mundo inteiro: África, América Latina, mundo árabe e até alguns da Ásia ou dos Estados Unidos. É uma mistura do modo de ser, da cultura, do jeito particular de cada um, qualquer que seja a sua origem. O que conta é a excelência.  

O Euro 2016 demonstrou que essa história de pequenas equipes fazendo só figuração está acabando.
O Euro 2016 demonstrou que essa história de pequenas equipes fazendo só figuração está acabando. REUTERS/Christian Hartmann Livepic
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A bola na Europa é profundamente meritocrática. Os melhores têm contratos milionários, os bons ganham muito bem a vida e os outros ralam na esperança de chegar lá. Com isso, os campeonatos nacionais, sobretudo nas grandes nações futebolísticas – Espanha, Inglaterra, Alemanha, Itália ou França – são sempre de alta qualidade. Qualquer garoto bom no mundo sonha ser contratado por um clube europeu.

Claro, isto só foi possível graças a uma administração do esporte ultra profissional. A pirâmide de clubes, das divisões mais baixas até a primeira, e os campeonatos e copas continentais são uma verdadeira indústria: gestão milionária dos direitos audiovisuais pan-europeus e transnacionais, patrocínios de grandes marcas e venda de produtos anexos. Nada de improvisações: o negócio é a rentabilidade máxima. Com essa competição feroz, sem tutu não dá para montar um time que empolgue as imensas torcidas. Mas tem que ser dinheiro manejado seriamente. “Cartolas” existem na Europa, mas nenhum tem espaço para fazer o que querem ou meter a mão nos fundos e atrasar salários.

"Técnico virou elemento essencial"

Só que grana e jogadores talentosos não bastam mais para chegar ao topo. O mercado da bola tornou-se tão competitivo que um monte de times tem capacidade de angariar fundos craques. O Euro 2016 demonstrou que essa história de pequenas equipes fazendo só figuração está acabando. Quem jamais pensou que o País de Gales e a Islândia poderiam disputar meias ou quartas de finais? Apesar do passeio na pista francês, todos os timãos europeus tiveram que suar a camisa contra os timinhos. Cristiano Ronaldo, Gareth Bale, Ozil ou Griezmann sempre serão fundamentais numa partida. Mas hoje, não são eles que ganham o jogo.

Era do futebol científico e tecnológico

Entramos na era do futebol científico e tecnológico. O técnico virou o elemento essencial. A capacidade de inventar esquemas de jogo e adaptá-los rapidamente a cada adversário – com a ajuda de análises de cada partida e de cada jogador e treinador adverso – são as condições centrais do sucesso. Sempre haverá o gesto genial de um defensor ou atacante de primeira classe que poderá decidir um resultado. Mas basta olhar para as partidas do Euro para ver que o que conta é a tática do treinador e a disciplina dos jogadores em seguir as instruções.

Aliás, nesse sentido, o velho “futebol” está começando a parecer com o football americano, com seus verdadeiros planos de batalha e sua enxurrada de estatísticas, coletivas e individuais: possessão de bola, passes, número de chutes a gol... Tudo isso analisado por jornalistas e técnicos cada vez mais especializados. Até a vida privada dos jogadores, o moral de cada um e do time, ou as amizades e antipatias no campo viraram variáveis do jogo.

Jogo está se tornando cerebral

O resultado é esse Euro 2016. Jogos superequilibrados com defesas extremamente organizadas deixando pouquíssimas chances ao adversário para marcar. Meio-campo afunilando e destruindo os passes de maneira quase mecânica. Contra-ataques fulgurantes ou então extremamente técnicos feitos de dezenas de passes curtos parecendo até basquete.

O jogo está se tornando cada vez mais cerebral com ar de batalha militar onde o imprevisto sempre ocorre mas, no final, quem ganha é o mais organizado e aquele que vem mais bem preparado, física e mentalmente. É muitas vezes por essa razão que supercraques latino-americanos na Europa não conseguem render nas suas seleções nacionais que ainda não foram capazes de se adaptar a este futebol moderno. Foi-se a era de ouro do jogo bonito brasileiro, com a sua fartura de gênios individuais e improvisos sublimes. Para voltar a brilhar, o escrete verde-amarelo ainda tem uma longa estrada pela frente. E não é só no futebol.

Alfredo Valladão, do Instituto de Estudos Políticos de Paris, faz uma crônica semanal às segundas-feiras na RFI
 

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