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Radar econômico

Marcas de fast fashion oferecem conserto, reciclagem e revenda de roupas

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Como cultivar uma clientela que adora estar na moda, mas se preocupa cada vez mais com o impacto ambiental do consumo desenfreado de roupas? A equação é complexa: ao mesmo tempo em que não querem vender menos, as marcas são cobradas a provar que não compactuam mais com um modelo de indústria que se tornou a segunda maior poluidora do mundo. Qual a solução? Uma delas passa por oferecer, nas próprias lojas, os serviços de conserto, reciclagem e até revenda de peças usadas – o chamado upcycling.

Ateliês de costura para clientes da Kiabi e da H&M (alto a esq.).
Ateliês de costura para clientes da Kiabi e da H&M (alto a esq.). h&m repair shop e captura de vídeo kiabi
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O cliente traz de casa uma blusa que comprou há dois anos e costura uma parte que rasgou de tanto usar. Ou leva aquela calça jeans que não está mais tão em alta, mas que pode ganhar uma cara nova se for customizada. Ainda pode pegar uma peça velha demais e transformá-la em outra completamente diferente: chega com um casaco e sai com uma bolsa. Tudo isso sem gastar quase nem um tostão.

E se a ideia é não colocar a mão na massa, pode simplesmente consultar o espaço de peças usadas, revendidas por outras clientes no site das próprias marcas, a preços módicos.

Em um primeiro momento, as iniciativas parecem contraditórias com o modelo de negócios da fast fashion – que oferece peças novas a cada semana, a preços irresistíveis. Mas, para Denis Dauchy, especialista em estratégia da indústria, num mundo no qual a preocupação ambiental é uma realidade entre os jovens e futuros consumidores, os principais nomes dessa indústria, como Zara, H&M ou Mango, simplesmente não têm outra alternativa a não ser se adaptar.

“Várias tendências explicam esse movimento, como a da economia do uso.  A sociologia do consumo mostra que os clientes estão cada vez mais conscientes de que o uso de um produto é mais importante do que a posse dele”, constata o consultor. “Eles também estão mais sensíveis ao impacto ecológico e o desenvolvimento sustentável, que nos leva a dar mais sentido ao consumo e a avaliar as consequências de tudo que consumimos.”

Cortar na própria carne

Nesse contexto, trabalhar a imagem não é mais suficiente: as marcas são obrigadas a cortar na própria carne para provar que o discurso green não é só de fachada. Por isso, as iniciativas de upcycling não incluem metas de vendas a serem alcançadas.

“Mais do que aumentar as vendas, o importante é preservar a fidelidade dos clientes, propondo novos serviços, soluções e experiências, além de atender às tendências da demanda de consumo. É um fenômeno global, encontrado em diversos setores, mas que é bastante forte nas roupas e têxteis”, afirma Dauchy.

A francesa Kiabi se lançou no desafio no primeiro semestre e pretende que, em 10 anos, 100% dos seus produtos participem da economia circular, no projeto Ecoconcepção. Na loja de Cormontreuil, na região parisiense, funciona um ateliê experimental de costura, onde as clientes aprendem a prolongar a vida das peças antigas ou a transformá-las completamente.

“Ainda estamos planejando como poderemos reciclar e reutilizar melhor as roupas que chegam ao fim da vida, mas antes disso, propomos uma segunda vida às peças. O ateliê de costura e a loja de artigos de segunda mão nos possibilitam fazer isso desde já”, explica o gerente Amar Saidi.

Programação será mais local? Não é tão simples assim...

O principal desafio dessa mudança de paradigmas repousa na base da indústria fast fashion: baixíssimos custos de produção em países asiáticos e logística altamente poluidora, para levar as peças à Europa. A prática é incompatível com valores sustentáveis, que pregam a produção local para diminuir as emissões de gases poluentes.

“Sabemos perfeitamente que não poderemos mudar o nosso modelo de negócios de um dia para o outro, mas estamos de cabeça num projeto maior, que é cuidar mais do planeta e tornar o nosso modelo econômico mais exemplar”, desconversa Saidi. “Os modos de consumo estão mudando a uma rapidez maluca, em torno da dimensão ecológica e da experiência da compra. Nossos clientes não querem mais adquirir um produto em troca de um determinado valor: eles querem viver e compartilhar experiências nas nossas lojas.”

As contradições também se manifestam do lado dos clientes. Dauchy, que dirige o MBA executivo da Escola de Altos Estudos Comerciais (EDHEC Business School), não tem dúvidas de que cada vez mais os consumidores vão se preocupar com a origem e o destino das roupas que compram. No entanto, a parcela de clientes disposta a mexer no bolso para salvar o planeta permanece marginal.

“Acho que pode chegar a 15% do mercado de roupas. Mas não vai acabar com o consumo clássico porque o consumidor é bastante paradoxal: entre o que ele diz e como ele se comporta, há um fosso”, nota o especialista. “Todo mundo continua querendo comprar uma camiseta por, no máximo, €10 (R$45).”

Na última cúpula do G7, na França, 147 marcas mundiais se comprometeram num “pacto” para se tornarem mais sustentáveis. As metas incluem reduzir o uso de plásticos e recusar materiais oriundos de áreas desmatadas, como o couro.

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