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Radar econômico

Brasil não corre risco de “virar uma Argentina”, apesar de confusões de Bolsonaro

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A demora do governo em avançar na reforma da Previdência, assim como as declarações contraditórias dentro do próprio Planalto sobre intervenção em preços e nas estatais, têm levado os mercados financeiros a emitir sinais de desconfiança em relação a Jair Bolsonaro. A aprovação da reforma ainda neste ano, carro-chefe da equipe econômica, é vista como a garantia de que o presidente vai continuar a contar com o apoio do empresariado, bancos e investidores – essencial para que o país não volte a afundar na recessão e não possa ser alvo de uma crise financeira, como ocorreu com a Argentina.

O ministro da Economia do Brasil, Paulo Guedes, discutiu com deputados durante reunião das comissões de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) em Brasília, Brasil, 3 de abril de 2019.
O ministro da Economia do Brasil, Paulo Guedes, discutiu com deputados durante reunião das comissões de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) em Brasília, Brasil, 3 de abril de 2019. REUTERS/Adriano Machado
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Os números não deixam dúvidas de que o país patina para voltar a crescer. O desemprego segue em alta, a mais de 12%, e a expectativa de crescimento em 2019 já passou de ao menos 2,5% para pífios 1,7%.

O economista Carlos Winograd, professor associado da Paris School of Economics (PSE), avalia que, neste contexto, a reforma da Previdência se tornou “a condição necessária para o início de um processo sustentável de crescimento”, ao assegurar a estabilidade fiscal a longo prazo e viabilizar a retomada de investimentos em infraestruturas e outras carências.

“Teve uma subestimação da complexidade política da experiência Bolsonaro. Ainda é muito cedo para julgar, mas era claro que haveria desafios muito complexos”, comenta. “Essa reforma virou o sinal central da capacidade de governo dessa administração. Ela sintetiza todos os elementos para mostrar se a experiência Bolsonaro será capaz de atacar os problemas macroeconômicos do Brasil.”

Reforma desidratada

O próprio governo já admite que o texto mais provável a ser adotado será “desidratado” em relação à proposta inicial do ministro Paulo Guedes, que previa uma economia de mais de R$ 1,1 trilhão com as mudanças nas aposentadorias. O economista Guilherme Mello, da Unicamp, considera que, por mais que os mercados desaprovem o resultado final, não deixarão de apoiar o governo Bolsonaro.

“O mais provável é que se aprove uma reforma do regime de repartição, e não a criação de um regime de capitalização, e a partir daí teríamos uma reação moderada dos mercados. As condições de liquidez se manteriam parecidas, mas têm se mostrado absolutamente insuficientes para puxar o crescimento”, afirma Mello. “A única possibilidade de o mercado pular fora mesmo é se tiver problemas lá fora. O mercado até então tem pensado:  “entregaram a reforma, mesmo que não seja exatamente a que a gente queria”. Mas se tiver alguma turbulência forte externa, pularia fora.”

Reservas protegem de crise cambial

No pior dos cenários – o de não aprovação da reforma ou de uma crise internacional -, o que poderia ocorrer com a economia brasileira? Os dois analistas rejeitam a tese segundo a qual o país seria alvo de uma grave crise cambial causada pela fuga de capitais, que provariam a desvalorização do real.

Atualmente, as incertezas contribuem para que a moeda brasileira se encontre num patamar baixo em relação à americana: de fevereiro para abril, o dólar passou de R$ 3,70 para em torno de R$ 3,90.

“Crise cambial, sim. Se vamos virar uma Argentina? Não. Não tenho a menor dúvida de que o Brasil está muito, muito longe disso”, constata o economista da Unicamp. “Devido à própria recessão, temos um cenário razoavelmente tranquilo em transações correntes, logo não precisamos de tanto financiamento externo assim. E, ao mesmo tempo, temos um cenário bastante cômodo e confortável de reservas internacionais. É uma herança que veio desde o governo Lula”, acrescenta.

"Virar Argentina"

Os R$ 380 bilhões de reservas cambiais brasileiras mantêm o país em segurança diante da possibilidade de um ataque especulativo. Winograd considera que, nesse aspecto, Brasil e Argentina “não têm nada a ver”. Ele destaca a solidez e a força institucional do Banco Central brasileiro:

“As duas economias têm alguns elementos em comum, em termos de problemas de crescimento e fontes de crescimento, problemas regulatórios e microecronômicos. Mas têm uma enorme diferença que é a posição de reservas do Banco Central”, destaca o professor da Paris School of Economics. “Nunca está garantido 100%, mas o Brasil já ganhou uma grande parte da batalha contra a inflação, enquanto a Argentina, de forma enigmática para a história econômica, ainda não conseguiu resolver essa questão. E a estrutura das dívidas e o tamanho dos mercados de capitais dos dois são radicalmente diferentes.”

Winograd ressalta ainda que a dolarização da economia do país vizinho inclui a dívida pública, o que gera uma alta vulnerabilidade da qual o Brasil está protegido. A Argentina, por sua vez, entra no segundo ano de recessão, em parte devido à demora da realização de ajustes fiscais aguardados pelos mercados. Na contracorrente da agenda liberal que o elegeu, o presidente Mauricio Macri acaba de determinar o congelamento de preços para frear a inflação.

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