Efeitos do “Brexit” para economia do Brasil seriam indiretos
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O resultado do referendo sobre a saída do Reino Unido da União Europeia é esperado com apreensão no mundo inteiro, pelas repercussões que a decisão terá na economia internacional. Por mais que as relações comerciais entre a Grã-Bretanha e o Brasil sejam pouco expressivas, um eventual fim da parceria dos britânicos com o bloco europeu pode impactar o país, que está em uma situação fragilizada para enfrentar uma grande instabilidade externa.
O Reino Unido é o 15º destino das exportações brasileiras, o que representa apenas 1,53% das vendas do país para o exterior. Ou seja, o comércio bilateral em si é pouco representativo, mas o Brasil ficaria à mercê das turbulências internacionais que são esperadas no caso de vitória do Brexit, como é chamada a saída dos britânicos do bloco. O mais preocupante é que ninguém sabe dizer exatamente como aconteceria a retirada dos britânicos, um clima de incertezas que não ajuda o Brasil, na avaliação de Wilber Colmerauër, presidente da Emerging Markets Funding, em Londres, uma consultoria de investimentos em países emergentes.
“O maior efeito no Brasil é de os outros mercados ficarem nervosos. Como estamos nessa situação complicada de transição, qualquer distúrbio externo prejudica, influencia de uma forma negativa. Tem ainda os impactos com a China, que vive um processo de desaceleração. Se tiver uma mexida forte na Europa, pode afetar nos negócios com a China, que é uma grande parceira comercial. E se houver problemas com a China, aí, sim, nós seremos afetados diretamente”, explica. “Em resumo: não seria a saída do Reino Unido em si o maior problema, mas sim o que essa saída pode vir a acarretar.”
O vice-presidente da Câmara Britânica de Comércio e Indústria no Brasil, Francisco Itzaina, ressalta que as previsões de crescimento econômico dos britânicos despencariam de 1,9% para 1,3% neste ano, em caso de saída da UE. No ano que vem, a situação seria ainda pior, com aumento de apenas 0,4% do PIB, em vez dos cerca de 2% projetados. "Confirmando essa situação, qualquer negócio entre os dois países será afetado. E como a saída também afetaria a União Europeia, os negócios entre os europeus e o Brasil também serão atingidos", adverte.
Benefícios para a agricultura são duvidosos
A maior parte das exportações brasileiras para os britânicos é de commodities. Como o setor de agricultura é dos mais protegidos pelos europeus, que bloqueiam a liberação de produtos brasileiros, uma saída dos britânicos da comunidade europeia até poderia sinalizar uma abertura para melhorar o comércio bilateral.
Itzaina não vê, porém, possibilidades de mudanças significativas. “Até poderia, mas o Reino Unido não vai deixar de depender da Uniao Europeia, que está bem mais perto. Os produtos que o Brasil mais exporta são brutos, como a soja, que é um perfil agropecuário diferente da necessidade britânica”, pondera. “Além disso, os setores em que havia maior envolvimento, como o óleo e gás, estão muito afetados no Brasil. O óleo e gás brasileiros atraíam muito capital estrangeiro e inglês, e ainda atrai, mas foi atingido por todos os problemas que a Petrobras atravessa”, indica Itzaina.
O setor de carnes, o que concentra as resistências na União Europeia, teria uma chance de maior penetração no mercado britânico. Por outro lado, as negociações de livre comércio com o bloco europeu perderiam um aliado importante, já que a Grã-Bretanha tem uma postura econômica mais liberal do que outras potências, como a França.
“Se a gente levar em consideração que José Serra, o novo ministro das Relações Exteriores, está optando por uma linha de comércio exterior bilateral, a saída da Inglaterra seria benéfica ao Brasil, ao permitir que o governo brasileiro fizesse acordos bilaterais com a Inglaterra”, observa Antônio Carlos Alves dos Santos, professor de economia da PUC-SP e especialista em comércio internacional. “No entanto, na negociação com a União Europeia não ajudaria, porque o Reino Unido não é um país com o qual o Brasil tem grandes problemas, por não haver concorrência em relação aos produtos que o Brasil exporta”, frisa.
Colmerauër ressalta que, no comércio de matérias-primas, o Reino Unido dá preferência aos países membros do Commonwealth, de ex-colônias britânicas. A aproximação com o Caribe também segue a todo o vapor. Por isso, a suposta vantagem na agricultura não é tão certa assim.
“A comunidade europeia é uma potência econômica que age em bloco e, por causa disso, ela facilita uma série de operações comerciais com outras grandes economias. O Brasil tem uma relação comercial importante com os europeus: o maior parceiro econômico do Brasil é a China, depois a União Europeia, seguida dos Estados Unidos”, lembra o consultor. “A saída do Reino Unido da UE poderia desestabilizar esse relacionamento – não porque a Inglaterra faça tanta diferença assim, mas por causa das repercussões e por outros países europeus eventualmente apresentarem suas demandas.”
Londres é quem mais perderia
Além da agricultura, o especialista não visualiza outros setores promissores para o Brasil se beneficiar no comércio bilateral com os britânicos. Já Alves dos Santos observa que os ingleses poderiam ter mais liberdade para participar dos investimentos em infraestrutura no Brasil e das possibilidades de privatizações. Ele vê “um certo exagero” na desestabilização mundial prevista para o caso da vitória do Brexit.
“O grande perdedor seria Londres, que deixaria de ser atrativa por não ser mais a porta de entrada para o mercado financeiro europeu”, resume o professor da PUC-SP. “Com a saída de Londres, teremos o fortalecimento do outro grande centro financeiro europeu em potencial, que é Frankfurt. Haveria uma transição, mas não seria das mais complicadas.”
As instituições econômicas e financeiras em peso defendem a permanência dos britânicos na União Europeia. Uma pesquisa publicada no fim de semana mostrou que 88% dos economistas britânicos acham que a retirada do país do bloco seria prejudicial para Londres.
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