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Radar econômico

Desaceleração chinesa pode estimular indústrias no resto do mundo

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O motor chinês perde força, o que gera consequências negativas nas economias que dependem muito das transações com Pequim, como o Brasil. No entanto, o momento também pode significar oportunidades de desenvolvimento industrial em outras partes do mundo, principalmente na África.

Indústria automotiva é um dos motores do crescimento na Turquia.
Indústria automotiva é um dos motores do crescimento na Turquia. Kerem Uzel/Bloomberg via Getty Images
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Nos últimos 15 anos, os investimentos estrangeiros na África quintuplicaram e se espalharam além das tradicionais meninas dos olhos no continente, o Quênia, a Nigéria e a África do Sul. A Etiópia, por exemplo, recebeu uma atenção especial dos chineses e se tornou um polo de produção têxtil além da Ásia, produzindo para marcas famosas europeias.

A estratégia é uma consequência da ascensão da classe média na China, onde a renda dos trabalhadores aumentou no passo da prosperidade econômica. Segundo o Banco Mundial, 85 milhões de empregos de baixa qualificação e salários magros devem sair do país e migrar para zonas industriais mais baratas no exterior, boa parte delas no continente africano.

“Não se pode confundir o fenômeno da desaceleração com o da redefinição dos objetivos de desenvolvimento econômico chinês. Já faz dez anos que eles tentam reorganizar as suas estruturas econômicas em direção ao mercado interno e não mais para o exterior”, explica Thierry Pairault, especialista nas relações entre a China e a África da Escola de Altos Estudos em Ciências Sociais (EHESS).

Pairault ressalta que os investimentos chineses na África ainda são pequenos - representam apenas 2,6% do total colocado no exterior. Mas pouco a pouco, os países africanos começam a diversificar as fontes de receitas e a depender menos das exportações de matérias-primas. Em um continente rico em energia, é o início de uma industrialização promissora, na avaliação de Jean-Louis Guigou, presidente do think tank Ipemed (Instituto de Prospetivas Econômicas do Mundo Mediterrâneo).

“Fabricar tudo que tem preço baixo e pouca tecnologia não interessa mais tanto aos chineses – ao ponto que eles mesmos estão redirecionando a produção para os países Mediterrâneos, movimentos que vão lhes permitir receber cada vez mais investimentos estrangeiros. Já faz 13 anos que a África está decolando”, afirma.

Potencial para países emergentes

Guigou avalia que qualquer país emergente próximo geograficamente de uma economia desenvolvida é um “aproveitador potencial” da desaceleração chinesa, como o México ao lado dos Estados Unidos. Os africanos têm a vantagem de estar perto da União Europeia.

“A população economicamente ativa na Europa está em declínio e a tendência é o capital e as indústrias irem para o sul. No Egito, vai haver fontes de gás enormes em Suez. No Marrocos, na Argélia e na Tunísia, as zonas industriais se desenvolvem. Muitas atividades poderão migrar para essa região, que pode ser o ateliê da Europa em 10 ou 15 anos, ou até antes.

Cautela

Andrea Goldstein, conselheiro do think tank econômico Nomisma, da Itália, é menos otimista. Autor de estudos sobre os investimentos estrangeiros na África para a OCDE (Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico), ele avalia que o desaquecimento chinês ainda é muito mais prejudicial do que positivo para a África, ao resultar na queda das importações de commodities dos africanos. Essa é a mesma razão pela qual o Brasil está sofrendo com o baixo crescimento econômico na China. Além disso, o especialista sublinha que Pequim agora está em pleno redirecionamento dos investimentos no exterior.

“Tem uma mudança nos interesses das empresas chinesas, que estão interessadas em investir mais nos países desenvolvidos, em busca de tecnologia, marcas e acesso aos mercados na Europa e na América do Norte. Esse é outro aspecto que vai gerar implicações negativas para a África”, adverte o italiano.

Para Thierry Pairault, o momento é ideal para os africanos atraírem empresas internacionais. Mas o pesquisador destaca que os governos locais devem se esforçar mais para que as oportunidades se transformem em uma verdadeira estratégia de desenvolvimento industrial.

“Por enquanto, o que vemos são empresários interessados em pequenas operações, que praticamente não incluem transferência de tecnologia e se referem a objetos com um fraco conteúdo tecnológico. Não é isso que vai gerar uma verdadeira industrialização”, constata. “Pode gerar empregos, é verdade, mas o problema é saber se os africanos já conseguem tomar as rédeas do próprio destino.”
 

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