Mulheres buscam reconciliação com o passado em "road movie" amazônico
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A diretora paraense Jorane Castro apresenta nesta quinta (22) e sexta-feira (23) no Festival de Cinema Brasileiro de Paris seu filme “Para Ter Onde Ir”, traduzido para o francês como “Pour Avoir Où Aller”, que chega às salas do Brasil em setembro.
A produção, que estreou no Festival do Rio e levou quatro prêmios no Festival Guarnicê (São Luís), é um "road movie" amazônico. Três amigas partem em uma viagem de carro de Belém ao balneário de Salinas, na costa atlântica paraense, em busca de reconciliação com o passado.
“É um filme de estrada em uma região que foi muito pouco filmada. Nunca vi um filme realizado em Salinas, nessa região da Amazônia atlântica, com suas praias de mar, que é uma outra geografia, que a gente não costuma ver quando se retrata a região”, diz Jorane.
A cineasta afirma que, “dentro desse universo visual, o filme trata do feminino". “São três mulheres, cada uma com uma visão bem diferente sobre o que é o amor, a vida. E elas vão se confrontando, e essa confrontação é muito interessante.”
O filme tem enquadramentos de grande beleza, que parecem verdadeiras pinturas, muitas vezes usando a exuberante vegetação amazônica como moldura.
“Foi uma intenção. A gente pesquisou muito. Por exemplo, nós escolhemos filmar no inverno por causa da luz. No verão, ela é vibrante, calorosa, colorida. Já no inverno ela é difusa, branca, sem contraste. A ideia era, com a imagem, mostrar outros lugares, mais do imaginário, mais cinematográficos. São lugares não-convencionais da região.”
As três atrizes principais, Lorena Lobato, Keila Gentil e Ane Oliveira, têm uma interpretação naturalista. “Das três, a única que tem mais experiência é a Lorena, que já trabalhou com Tata Amaral, Suzana Amaral, Heitor Dhalia. É uma atriz experiente, que já fez muito teatro”, explica Jorane.
E completa: "A Keila tem experiência cênica, porque é cantora do grupo Gangue do Eletro. É uma mulher e uma artista maravilhosas, então ela trouxe toda a experiência dela de palco. A Ane nunca tinha trabalhado como atriz, mas a gente fez um teste com ela e deu super certo. Ela tinha essa beleza e esse naturalismo. Eu queria isso, essa informalidade da interpretação, que fosse mais roubada dos momentos cotidianos, como se estivéssemos lá juntos com elas.”
Amazônia, uma infinidade de histórias
A cineasta, que ficou conhecida com seu curta-metragem “Mulheres Choradeiras”, de 2001, que foi premiado no Brasil e no exterior, tem prazer em filmar na Amazônia.
“Acho que a gente tem muita coisa para mostrar, muitas histórias que ainda precisam ser contadas. A gente mora lá, produz lá, pensa o cinema na Amazônia. Isso é muito importante”, explica. “Ainda não filmei na ilha do Marajó, em Alter do Chão. Precisaria ser cineasta por três séculos para contar todas as histórias da região.”
Sobre a produção cinematográfica do Pará, ela afirma que “ela está se estabelecendo”. “Existem novas políticas públicas federais, que estão favorecendo as regiões Norte, Nordeste, Centro-Oeste e Sul. Então estamos começando a ter regularidade para filmar, ou seja, a gente começa a ter equipes e profissionais competentes e pessoas que só trabalham com cinema. Isso graças a editais de séries de TV, de documentários, da TV Cultura do Pará. Acho que são os primeiros passos para dar uma guinada para o alto, para ser cada dia melhores.”
“Para Ter Onde Ir” participou recentemente do Festival Guarnicê, em São Luís (MA), onde recebeu quatro prêmios: direção, atriz coadjuvante (Keila Gentil), trilha sonora (Gangue do Eletro) e desenho de som. Depois de Paris, o filme segue para os Festival de Durban, em julho na África do Sul, e para o Festival de Cinema Latino-Americano de São Paulo, entre 26 de julho e 2 de agosto na capital paulista e em Campinas.
Atualmente Jorane está filmando um documentário sobre o Mestre Cupijó, seu tio, um dos ícones da música tradicional paraense, que morreu em 2012. O projeto tem recursos do programa Petrobras Cultural.
A cineasta é formada em cinema pela Universidade Paris 8 e fez mestrado na Universidade Paris 7, com ênfase na sociologia aplicada ao cinema. Ela desenvolve pesquisas na área da linguagem audiovisual, privilegiando a região amazônica.
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