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Rendez-vous cultural

Cartunista francês Plantu participa de Festa Internacional de Literatura de Paraty

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Um dos principais cartunistas da França, Jean Plantureux, ou simplesmente “Plantu”, é um dos convidados da Festa Literária Internacional de Paraty, a Flip. Plantu é quem desenha a charge da primeira página do jornal Le Monde e é criador da associação Cartooning for Peace. Às vésperas de viajar para o Brasil, Plantu falou com exclusividade para a Rádio França Internacional sobre o papel da charge e o extremismo religioso.

Charge de Plantu para Le Monde.
Charge de Plantu para Le Monde. www.cartooningforpeace.org
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Cartooning for Peace foi criada logo após a “fatwa”, lei islâmica proclamada contra o desenhista dinamarquês Kurt Westergaard, que ousou desenhar o profeta Maomé com um turbante em forma de bomba. A iniciativa foi lançada em outubro de 2006, na sede da ONU, em Nova York, com uma conferência de dois dias reunindo 12 desenhistas do mundo inteiro para discutir o tema “desaprender a intolerância”. O movimento reúne hoje 125 artistas de mais de 40 nacionalidades. Uma exposição que corre o mundo com desenhos da ONG esta em cartaz em Belém, até 30 de junho.

Plantu fala o seu trabalho desde o ataque sangrento contra o jornal satírico Charlie Hebdo, no começo do ano, quando dois irmãos extremistas fuzilaram 12 pessoas, incluindo vários desenhistas, seus amigos:

“Nada. Nada mudou. Sou chargista político, isto é, quando Malala, a menina paquistanesa, é proibida de ir à escola e é atacada por tal e tal tribo, eu não estou nem aí com o aspecto religioso. É o direito da menina que está sendo violado e aí está o meu trabalho, não sou chargista religioso. Eu faço desenhos sobre violações dos direitos humanos. E quando uma mulher é mutilada sexualmente no Sudão, no Egito – as mulheres coptas do Egito também são mutiladas-, quando uma mulher é lapidada no Irã, não me interessa o aspecto religioso. Para mim não é um problema religioso, mas de direitos humanos. E quando Gaza é bombardeada, não me interessa se é o Estado liderado por esta ou aquela religião. O que me interessa são os direitos humanos violados dos palestinos que sofrem com os bombardeios. Então é o meu dever como desenhista de fazer charges que defendam populações sob bombas, seja na Síria, na Palestina ou no Iraque.”

Plantu observa uma outra relação entre religião e política, entre Igreja e poder na América Latina. Ele vê muito humor e alegria nas charges que criticam o catolicismo:

“Mesmo quando são mais ousadas, são criticas contra um poder estabelecido. Ou seja, a igreja está instalada, ela faz frequentemente parte do poder, ou está muito próxima. E a Igreja, “boazinha”, entre aspas”, aceita ou acompanha essas críticas, por vezes exageradas, com bastante boa vontade. De vez em quando, e isso eu vi no Peru, a Opus Dei é menos tolerante que a igreja católica em geral. De maneira geral, isso se passa bem. É preciso compreender como o desenhista de imprensa, que é a voz do povo, dos povos, questiona o poder vigente - político e também o religioso. Já muitos muçulmanos na Europa vêem isso de outra forma, e por isso a percepção é muito importante quando traduzimos isso num desenho impresso. Muitas vezes o muçulmano se vê parte de uma igreja – no caso, muçulmana – que não faz parte do poder e, além disso, integrante de uma classe tratada de maneira pejorativa e alijada do poder. “

“Deixe o lápis falar”

Quando Bento 16 foi eleito papa, Plantu estava na redação do jornal O Globo, com o amigo Chico Caruso:

“Ele começa a desenhar o papa de maneira extraordinária, manejando o pincel de aquarela. Uma charge belíssima. Eu não seria capaz de fazer uma aquarela tão maravilhosa em tão pouco tempo. E de repente, ele coloca uma braçadeira em Bento 16 e, em seguida, a suástica. E eu: “O que você está fazendo, Chico?”. E ele: “Ué, ele é alemão, não é? Ele fez parte da juventude hitleriana, não?”. “Mas isso quando ele tinha 16 anos, agora ele tem uns 80, você acha que é a mesma pessoa?”, perguntei. “Deixe o lápis falar”, o Chico respondeu. E “deixar o lápis falar”, é praticamente o tema das exposições dos desenhistas de “Cartooning for Peace”, reunindo cartunistas cristãos, muçulmanos, judeus e agnósticos, para tentar falar de tudo sem restrições e ao mesmo tempo, sem ofender ninguém.”

Plantu desenha para o influente jornal Le Monde desde 1972. Desde 1985, ele assina a charge da primeira página. Perguntei a ele como ele se prepara, se ele lê muito, ouve rádio:

“Eu faço tudo o que você diz. É um trabalho quase escolar, sabe. É como ir à escola, com professores, professoras, diretores. No fundo não é muito diferente. A uma certa hora, a prova é recolhida, para mim é 10h15 toda manhã. E antes, eu procuro conversar com o editor, com jornalistas, faço anotações, escuto muita rádio, leio o Monde, faço esboços de idéias. E depois o desenho toma forma, muda um pouco em função da conversa que tive com a jornalista ou jornalista. No final, trata-se de uma opinião, na qual acredito. Às vezes não é a mesma linha editorial do jornal, mas tudo bem, é como na escola, sabe, quando o aluno entrega a prova ao professor, com alguma besteira no final, mas o professor dá uma boa nota se estiver bem argumentada. Por exemplo, a burca [o véu integral muçulmano para mulheres]. Sou a favor da proibição do uso na França, terra da igualdade, fraternidade e liberdade. A burca vai contra os direitos da mulher. Por isso eu faço desenhos contra. O meu jornal seria muito mais comedido, mas me deixa publicar os desenhos contra a burca, mesmo tendo uma opinião diferente."

Veja abaixo alguns desenhos dos integrantes da ONG Cartooning for Peace:

 

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