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Ciência e Tecnologia

Pesquisas mostram que pessoas tomam decisões diferentes em outra língua

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As pessoas que falam mais de um idioma assumem outras identidades? Este tema é objeto de estudo de linguistas e psicólogos há muito tempo, mas recentemente uma pesquisa mostrou que o bilinguismo provoca modificações cognitivas surpreendentes. A moral e a ética também mudam quando as decisões são tomadas em uma língua diferente da materna.

Pesquisas mostram que as pessoas mudam quando falam uma língua diferente da materna.
Pesquisas mostram que as pessoas mudam quando falam uma língua diferente da materna. Getty Images/hemis.fr/Marc Dozier
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A revista especializada “Scientific Americain” publicou em setembro um artigo que reúne vários estudos realizados com bilingues, trilingues e poliglotas. De acordo com o texto, na língua materna, as respostas a certos dilemas seriam mais "viscerais", já que o idioma natal em geral exprime as emoções, decodificadas no córtex cerebral. A memória dos conceitos de punição, transgressão, do que é certo ou errado, também se faz em nosso primeiro idioma, indicam os estudos. Em uma outra língua, as decisões tendem a ser mais simples e menos carregadas de emoção.

“Ainda estamos no começo dos estudos cognitivos de uma maneira geral”, diz o presidente da Federação Internacional dos Professores de francês, Jean Marc Defays, especialista em linguística e didática da língua francesa. “Muitas coisas ainda precisam ser descobertas e submetidas a um julgamento científico”, declara. “Independentemente disso, quando falamos várias línguas, a partir de um certo nível, e temos acesso a diferentes culturas, sabemos que não somos exatamente a mesma pessoa. Essa é a grande dificuldade: isolar o fenômeno linguístico de outros fatores contextuais."

Segundo ele, é preciso também levar em conta em quais circunstâncias a outra pessoa utiliza o idioma. “Há mais facilidade para um profissional que trabalha em inglês, por exemplo, falar sobre suas atividades que dos seus próprios sentimentos”, explica. As circunstâncias do aprendizado da língua (casamento, trabalho, estudos) são essenciais na maneira como o indivíduo vai utilizá-la para se expressar na sua vida cotidiana. “A aprendizagem de um idioma necessita de um investimento afetivo, emocional, humano, existencial e cultural muito importante. Passar pelo aprendizado humanista de uma língua transforma uma pessoa.”

O professor vai ainda mais longe para explicar as mudanças de comportamento das pessoas que falam várias línguas. “É evidente que o funcionamento de um idioma tem um impacto no funcionamento cognitivo.” Segundo ele, um idioma “obriga” a decodificar o mundo de uma certa maneira, através de um novo vocabulário. E a sintaxe serve para reorganizar esse novo universo. “ Descrevendo o mundo, nós o interpretamos”, conclui.

“Eu me sinto diferente”

A jornalista alemã Carmen Lünsmann, que trabalha na editoria de Cultura da Rádio França Internacional, mora há mais de 15 anos em Paris. Além de utilizar o idioma em seu cotidiano, ela também trabalha em francês. Mesmo depois de tantos anos, ela diz que se sente “diferente” quando fala o idioma.

“Sim, eu me sinto diferente. Como explicar isso? Eu diria que me sinto mais natural, em alemão. Tenho uma outra entonação, espontaneidade…em francês, fica meio artificial. É como se minha língua ficasse meio “pesada”, principalmente quando eu volto para a França depois de longas férias. Mesmo morando aqui há mais de 15 anos, adorando esse país e a cultura francesa, não me sinto francesa. Eu continuo sendo alemã.”

A jornalista não acredita, entretanto, que suas opiniões ou valores mudem em francês ou alemão. “Pessoalmente não penso que minhas escolhas sejam diferentes em francês ou na minha língua materna. Eu tenho uma cultura bem enraizada em mim, que obviamente adapto em função do país em que vivo”.

“Como se fosse uma atriz”

Lisa Suto Faga trabalha para o Ministério francês da Ecologia e Desenvolvimento Sustentável e, como Carmen, vive e trabalha na França há 14 anos. Originária de Torino, na Itália, ela também vive entre duas culturas. “Não chego a me sentir uma outra pessoa, mas às vezes tenho a impressão de estar atuando, como se fosse uma atriz. É menos espontâneo. É uma outra parte de mim mesma”, diz.

Ela diz que as reações mudam quando fala em italiano ou francês.  “A maneira de administrar as relações pessoais ou sociais são diferentes. Podemos ter uma reação um pouco diferente em um idioma ou outro”. Perguntei a Lisa se era verdade que os italianos falam alto, o que também mudaria sua maneira de se expressar em francês. “É um estereótipo! Pelo contrário: as pessoas costumam me pedir para falar mais alto”, esclarece.
 

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