Acessar o conteúdo principal
RFI Convida

“Rever o modo de funcionamento da educação no Brasil é muito preocupante”, diz Carlos Cury

Publicado em:

O corte de verbas de três universidade federais brasileiras (UFF, UFBA e UNB), anunciado nessa terça-feira (30) pelo ministério da Educação (MEC), preocupa a classe acadêmica. De passagem por Paris, onde dá palestra sobre o tema da educação, o filósofo e doutor em Educação Carlos Roberto Jamil Cury chama a atenção para o que considera um recuo no ensino brasileiro.

O professor Carlos Cury nos estúdios da RFI em Paris
O professor Carlos Cury nos estúdios da RFI em Paris RFI
Publicidade

Carlos Cury foi convidado pela Escola de Altos Estudos em Ciências Sociais de Paris para proferir uma palestra intitulada “A educação em marcha-ré no Brasil atual”. Mesmo se a intervenção foi feita antes do anúncio do MEC, as observações do filósofo retratam um cenário sombrio e preocupante para o setor. 

Professor emérito da UFMG e ex-presidente da CAPES, Cury notou que o início do governo Bolsonaro na área de educação é marcado por uma falta total de conhecimento por quem foi nomeado a assumir a pasta.  

“O Ministério da Educação é muito complexo. Tem obrigações de diretrizes e convênios de ordem voluntária. É um grande complexo que atinge os 5.600 municípios e os 27 estados. Se não conhecer minimamente a burocracia do MEC, a estrutura, os programas, as ações, você se perde”, nota.

Segundo Cury, o ex-ministro Ricardo Veléz “não tomou conhecimento de nenhum programa substantivo do ministério” e a troca pelo novo ministro Abraham Weintraub também não traz nenhuma perspectiva positiva. “Ele é economista, muito próximo ao ministro (da Economia) Paulo Guedes e tem determinadas posturas que lembra o antigo ministro, em relação à ideologia de gênero, a ‘Escola sem Partido’ mas com uma grande diferença: ele disse que é preciso rever o modo de financiamento da Educação no Brasil”.

Esse ponto é motivo de muita preocupação, diz Cury, ao lembrar da declaração de Guedes sobre uma possível desvinculação constitucional de recursos advindos de impostos para a educação.

Cury lembra que ainda durante o governo de Michel Temer foi adotada uma emenda que congelou os recursos, inclusive para a educação, mas manteve os percentuais das verbas. “Guedes afirmou que caso a reforma da Previdência não passar, o plano B será a desvinculação completa dos vínculos existentes na Constituição, ou seja, quem vai sofrer primeiro serão saúde e a educação”, prevê.  

Riscos para a pluralidade

O ex-presidente da CAPES afirma que os cortes nas verbas já começaram a afetam pesquisas e bolsistas. “Nas Fundações estaduais de apoio à pesquisa já não estão mais sendo concedidas bolsas para o exterior. Isso é muito ruim ”, lamenta, ao lembrar que o Brasil tem convênios e intercâmbios com mais de 50 países. 

“Nossa gradução e pós-graduação tem o signo da internacionalização, com pessoas de um mesmo departamento formadas em países como Alemanha, Japão, Grã-Bretanha ou França. Isso fazia o departamento se tornar plural”, afirma.

“Nós estamos correndo risco. A Capes ainda pode garantir (bolsas) porque o orçamento provém do ano passado.  Mas temos uma grande dúvida no Cnpq e na Capes do que será 2020”, questiona.

Sobre a iniciativa expressada pelo governo de “combater a ideologia marxista presente nas universidades”, Carlos Cury recorre à Carta Magna e à história recente do país para contestar o que chama de “ficção”.

“É preciso lembrar que nossa Constituição estabelece que a educação deve primar pela pluralidade”, defende. O especialista recorda que nas décadas de 1970 e 1980 houve “um grande aporte das teorias marxistas nas universidades por conta da ditadura”.

“O marxismo foi um dos sustentáculos de combate à ditadura porque era o combate a partir da estratificação social. Outros defenderam o fim do regime pelos direitos políticos. Mas depois da Constituição de 1988 houve uma expansão da pluralidade. Hoje não é preciso mais buscar no marxismo para atacar, mas no liberalismo democrático”, explica.  “Esse marxismo cultural é uma ficção”, completa.  

NewsletterReceba a newsletter diária RFI: noticiários, reportagens, entrevistas, análises, perfis, emissões, programas.

Acompanhe todas as notícias internacionais baixando o aplicativo da RFI

Veja outros episódios
Página não encontrada

O conteúdo ao qual você tenta acessar não existe ou não está mais disponível.