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Crise na Igreja Católica brasileira é uma das razões da diminuição de fiéis, explica sociólogo

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A queda do número de católicos no Brasil é um fenômeno recente e está diretamente ligada com uma mudança do comportamento dos fiéis com relação à hierarquia da Igreja. Essa é uma das constatações do sociólogo Flávio Sofiati que estuda há vários anos a principal corrente religiosa do país, que enfrenta o avanço dos evangélicos.

O sociólogo Flávio Sofiati nos estúdios da RFI Brasil.
O sociólogo Flávio Sofiati nos estúdios da RFI Brasil. RFI
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Pesquisador e especialista em Sociologia das Religiões, o professor da Universidade Federal de Goiás proferiu recentemente a palestra intitulada “O catolicismo no Brasil contemporâneo” na Escola de Altos Estudos em Ciências Sociais (EHESS) de Paris, onde realiza pesquisas. No evento, ele detalhou parte dos resultados de sua pesquisa que teve início em 2015 e deve terminar em 2021 sobre a realidade dos católicos no Brasil.

Segundo Sofiati, com os dados do Censo de 2010, o último disponível no país, é possível constatar uma diminuição do número de fiéis da Igreja Católica no país. De acordo com as estatísticas oficiais, o Brasil passou de 125 milhões de católicos em 2000 para 123 milhões em 2010.

“O fenômeno é recente”, avalia. “Até 1970, cerca de 92% dos brasileiros se declaravam católicos. A partir dos anos 2000 há uma redução acentuada. Pela primeira vez, com o Censo de 2010, há dados que revelam não apenas uma diminuição em relação ao percentual, mas do número absoluto de fiéis”, destaca.

Vários motivos explicam essa queda, segundo o especialista em sociologia da religião. Um deles é a multiplicação das ofertas religiosas, um fenômeno acompanhado do que a sociologia define como “desinstitucionalização do religioso”, ou seja, as pessoas não deixam de ter fé, de acreditar em Deus ou em um ser supremo, mas estão abandonando a prática assídua de uma instituição.

“No caso católico, fica muito evidente quando as pesquisas qualitativas demonstram um abandono da prática de ir à missa aos domingos”, exemplifica. 

O fenômeno também é reforçado, segundo Sofiati, pelo momento turbulento da Igreja Católica devido aos inúmeros casos de pedofilia e abusos sexuais praticados pelo clero. “Há cada vez menos fiéis respeitando a hierarquia que a Igreja tenta impor aos fiéis, de padres nas paróquias e dos bispos nas arquidioceses”.

No entanto, Sofiati diz que não é possível creditar somente a esses escândalos que se tornaram mais visíveis nos últimos anos, a desconexão com as lideranças religiosas e seus representantes.

“Há uma crise da própria estrutura das paróquias e da forma de organização das dioceses. No Brasil, o que temos percebido é que o catolicismo que tem dado resposta à essa crise de fiéis, não é o catolicismo oficial, do clero, dos padres, bispos, diáconos, mas sim, um catolicismo mais comunitário, seja ligado aos carismáticos, ou ligado à teoria da libertação, que se relaciona com os movimentos sociais que atuam fora da Igreja Católica”, diz.

Ele cita como principal exemplo o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), que é laico mas com mística, pela influência da teologia da libertação vinculado à luta pela terra no país a partir da Comissão Pastoral de da Terra e do próprio MST.

Católicos e evangélicos

Flávio Sofiati integra uma linha dentro da sociologia que defende a importância do catolicismo na sociedade brasileira. Apesar da redução do número de fiéis, ainda é a Igreja mais importante do país e tem um impacto institucional ainda muito importante na realidade social brasileira.

“Os evangélicos representam o movimento religioso que mais cresce no país, mas a Igreja evangélica mais populoso do Brasil, que é a Assembleia de Deus, tem 12 milhões de seguidores, ou seja, 10% que tem o catolicismo”, compara.

Sofiati aponta uma preocupação com a diminuição das pesquisas no meio acadêmico sobre a igreja Católica, que perde espaço para o interesse manifestado pela expansão dos evangélicos, que estão muito mais visíveis na sociedade.

“O evangelismo está presente na mídia, na televisão e rádios. Além dos próprios meios de comunicação que eles adquirem, compram  espaços em televisões abertas. Mas não é correto dizer que eles são os únicos que influenciam a política brasileira”, destaca.

Em seus estudos, Sofiati observa que chamada “bancada evangélica” divide o protagonismo religioso do Congresso com os representantes do movimento dos carismáticos dos católicos, que têm o mesmo nível de influência. “Eles são tão presentes quando os evangélicos pentecostais e com uma política muito parecida”, afirma.

Os dois grupos convergem nos assuntos de cunho moral como a proibição da legalização do aborto, assuntos ligados à bioética e ao casamento homoafetivo. “Você deixa de ter uma bancada evangélica para ter uma bancada da Bíblia, cristã, que se mobiliza contra pautas feministas e outros direitos das mulheres”, exemplifica.

Bolsonaro e a Igreja Católica

Apesar desses traços comuns, o especialista já observou uma outra disposição do governo com a comunidade católica, desde o início do mandato do presidente Jair Bolsonaro, eleito com muito apoio das diversas correntes evangélicas.

“É a primeira vez que um presidente eleito é muito mais próximo dos evangélicos do que dos católicos. O primeiro resultado dessa nova agenda governamental foi a crítica direta à mobilização dos católicos sobre o Sínodo da Amazônia”, lembra.

O Sínodo, uma iniciativa articulada pelo Vaticano, está previsto para acontecer no mês de outubro com o objetivo de discutir o maior envolvimento dos movimentos religiosos e da sociedade civil para preservar a Amazônia. O governo federal, por meio do ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), general Augusto Heleno, reagiu à iniciativa afirmando que “ninguém deve dar palpite sobre a Amazônia”.

“Essa crítica mostra o distanciamento político do atual governo brasileiro com a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil e até mesmo a política atual do papa Francisco”, afirma.

 

 

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