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“Atlas do Agronegócio revela a complexa cadeia do setor agroindustrial”, diz coordenadora

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O lançamento da edição brasileira do “Atlas do Agronegócio” nesta terça-feira (04), no Rio de Janeiro, vai levar aos consumidores mais do que dados e informações sobre um dos setores essenciais para a economia do país. O documento revela os bastidores da atuação do lobby agroalimentar e denuncia como a concentração de empresas deste segmento influencia o consumidor até na escolha final do produto.

Maureen Santos, coordenadora da edição brasileira do "Atlas do Agronegócio".
Maureen Santos, coordenadora da edição brasileira do "Atlas do Agronegócio". Foto: Divulgação
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A obra, lançada inicialmente em 2017 na Alemanha, foi adaptada à realidade brasileira sob a coordenação de Maureen Santos, representante da Fundação Heinrich Böll Brasil, e de Verena Glass, da Fundação Rosa Luxemburgo.

“A principal motivação foi de oferecer ao consumidor uma informação sobre o sistema bastante complexo da cadeia produtiva agroindustrial e contribuir para o debate sobre esse setor tão vital para a economia e como isso rebate em relação às escolhas e no direito”, explica Maureen Santos.  

O “Atlas do Agronegócio” revela, por exemplo, que cinquenta fabricantes do setor representam 50% das vendas globais da indústria dos alimentos.

A publicação de 60 páginas, com textos traduzidos e outros originais, foi elaborada a partir de três questões principais que formam o eixo do trabalho.

O primeiro aspecto diz respeito à concentração de toda a cadeia do setor: desde a produção, armazenamento, transporte até à distribuição final ao consumidor, que é altamente concentrada nas mãos de poucas empresas.

“Essa concentração tem um rebatimento bastante importante no segundo elemento que o Atlas traz, que é o distanciamento cada vez mais profundo entre o produtor e o distribuidor”, diz Maureen.

O terceiro aspecto destacado na obra diz respeito à escolha final do consumidor. “A gente mostra no Atlas que esse modelo de concentração faz com que essas empresas sejam dominantes e acabam fazendo as escolhas para o consumidor”.

Brasil: "campeão do agronegócio"

Na entrevista à RFI, a coordenadora também faz referência à poderosa articulação da indústria e dos produtores com o universo político, que no Brasil é traduzido pela composição da chamada Bancada Ruralista, que articula os interesses, e o lobby do setor no Congresso Nacional.

Mas a influência vai além, segundo a especialista. “O Brasil é um estudo de caso perfeito para explicar o lobby dessa Bancada e como sua teia se espalha. Ela não está só dentro do Congresso Nacional, mas também nas esferas do setor financeiro, do Executivo, e tem braços no Judiciário. Ela atravessa e ocupa todos os espaços do Estado brasileiro”, denuncia.

Essa articulação garante muitos benefícios e garantias institucionais e jurídicas para um setor considerado uma das locomotivas do crescimento nacional.

Mas, de acordo com a publicação, por trás do rótulo de país “campeão do Agronegócio”, existem práticas que deveriam ser melhor controladas e respeitadas. É o caso do uso excessivo de agrotóxicos e tecnologias de transformação genéticas de culturas, que fazem o país ser muito competitivo no mercado.  

“Se a gente for discutir os subsídios e incentivos fiscais dados ao setor, o perdão de dívidas, todas as multas ambientais que não são cobradas, uma série de violações e os impactos sócioambientais que essa cadeia deixa, se tudo fosse contabilizado, esse setor não seria tão competitivo como é apresentado”, afirma Maureen.

“Para manter a produtividade, é preciso usar cada vez mais produtos químicos, por isso o aumento cada vez maior do uso de agrotóxicos e fertilizantes”, argumenta, lembrando que tramita no Congresso, já com o aval de uma comissão especial, um Projeto de Lei  - conhecido como “PL do Veneno” -, que visa reduzir a regulação do agrotóxico.

Propaganda enganosa

Além de coordenar a obra, Maureen assina também o texto intitulado “Do fake saudável à gourmetização”. Nele, ela aponta o abuso do uso de açúcar e produtos químicos ou altamente processados em diversos alimentos que são “apresentados” como saudáveis para a dieta dos brasileiros.

O exemplo mais explícito mencionado no Atlas é o da propaganda para sucos e néctares vendidos em caixinha e apresentados como alternativas em relação a refrigerantes. “Já está comprovado que existe uma grande quantidade de açúcar e pouca fruta. Essa propaganda alimenta uma indústria que deveria ser melhor controlada”, garante. Ela ainda ressalta a dificuldade de acesso da população brasileira a alimentos efetivamente mais saudáveis.  

“Não há política de acesso para os mais pobres. Há um nicho para as classes média e rica, que têm mais consciência desse tipo de alimentação. Mas essa ‘indústria da alimentação saudável’, se é que podemos chamar assim, também vem repetindo o mesmo processo de concentração da indústria agroalimentar”, defende.

O Atlas também destaca tópicos  relacionados ao mercado de trabalho e à concentração de terras no território brasileiro.   

Para atingir o maior número possível de leitores e consumidores, o "Atlas do Agronegócio" estará disponível gratuitamente para ser baixado nos sites das Fundações Heinrich Böll Brasil e Rosa Luxemburgo. A obra também poderá ser enviada pelo correio para os interessados.

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